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Sinopse

O grande poeta italiano e cineasta Pier Paolo Pasolini é assassinado nos anos 1970. Antes de ser morto em circunstâncias nebulosas, ele passa as últimas horas de sua vida com a amada mãe e, mais tarde, com os amigos mais próximos e queridos.

Crítica

Intelectual que utilizou o cinema, as palavras e os atos para contestar o que considerava errado na sociedade italiana, Pier Paolo Pasolini tem seus últimos dias contemplados neste filme de Abel Ferrara. Por detrás dos óculos escuros, ele responde algumas perguntas sobre aquele que seria seu testamento cinematográfico, o emblemático Saló ou Os 120 Dias de Sodoma (1975). Em Pasolini importam menos as motivações e a conjuntura político-social. Ferrara busca captar a essência desse iconoclasta nato que morreu de maneira brutal, em circunstâncias até hoje controversas, para isso se valendo não apenas da interação dele com familiares, amigos, colaboradores e amantes, mas também do romance e do longa-metragem que seriam suas subsequentes contribuições ao mundo. Willem Dafoe interpreta o protagonista, esforçando-se para transparecer a complexidade que fez dele uma figura singular.

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O discurso inflamado que Pasolini proferia nos filmes e nos escritos, sempre conflitando a democracia cristã, é contraposto pelo carinho dirigido à mãe. Abel Ferrara, ele próprio um artista contundente que não se furta a demolir convenções por meio do cinema, demonstra afinidade com Pasolini, todavia num espectro nada óbvio. Ao invés de afinar-se com o posicionamento do personagem principal, ressaltando sua veia militante, a luta diária de alguém que se sentava à máquina de escrever para bradar contra os poderes instituídos, o diretor norte-americano dá relevo à tragédia do pensador. Há poesia em Pasolini, e ela advém, sobretudo, da encenação de fragmentos do derradeiro romance do italiano. Vemos um homem fazendo sexo oral em vários outros e depois se esgueirando no seio da burguesia, espreitando conversas de bastidores, negociatas financeiras e jogos partidários escusos. Para Pasolini, o sexo era um ato político, assim como tudo que fazemos.

A concisão de Pasolini - o filme não possui mais de 80 minutos - aliada à bifurcação que nos leva, ora a testemunhar a rotina dos dias que restavam ao cineasta, ora a entrar em contato direto com os frutos de sua criatividade, leva a certa dispersão, como se ao filme faltasse um foco definido ou ao menos mais objetividade. Isso se explica, em parte, pela inclinação de Ferrara ao lirismo, mas não justifica, por exemplo, a pouca atenção à construção do ambiente efervescente que a Itália vivia na época, essencial à contextualização da importância de alguém como Pasolini e da dimensão do incômodo que seus ataques frontais causavam. Homossexual assumido, adorado por alguns e odiado por outros tantos, ele tinha consciência de ser uma rachadura no sistema. Abel Ferrara prefere amenizar essa violência que mediava a relação do italiano como o status quo, priorizando suas dimensões criativa e pessoal, não menos relevantes, é claro.

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Para um casal de amigos, Pasolini conta a respeito do filme que rodará após o lançamento de Saló ou Os 120 Dias de Sodoma, uma parábola em que dois homens seguem a Estrela de Belém, sinal do nascimento do Messias. No caminho, os personagens testemunham uma orgia “de gays e lésbicas”, como o narrador define, festejo de fertilidade que visa reprodução. Aspirantes ao paraíso, eles, contudo, não o acham, vislumbrando a Terra da escada que pretensamente os levaria ao reino dos céus. “O fim não existe. Vamos esperar, algo vai acontecer”, diz um deles, com ar esperançoso. Espelhando as ideias de seu criador, o fragmento é utilizado por Ferrara para exemplificar o diálogo fecundo e recorrente na obra de Pasolini entre o sagrado e o profano, no qual os ideais de um encontram ecos insuspeitos no outro. Pasolini padece da falta de uma virulência que faça jus à figura homenageada, ao homem que era insultado nas ruas em virtude de seus pensamentos e atitudes libertários, ao grande poeta, escritor e cineasta que pagou com a vida a ignorância do povo que ele queria ver melhor assistido.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

Grade crítica

CríticoNota
Marcelo Müller
6
Alysson Oliveira
7
MÉDIA
6.5

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