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Crítica


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Sinopse

Moses e Kitch são jovens negros que vivem assustados com a polícia local, graças ao alto índice de homicídios existente entre pessoas com seu tom de pele. Amigos de longa data, eles trocam brincadeiras entre si o tempo todo e sonham com o que levariam para a terra prometida. A vida deles muda por completo quando, repentinamente, surge no local um homem branco, com uma cesta repleta de comida, procurando a casa em que sua mãe mora.

Crítica

Lançado no mesmo 2018 em que Infiltrado na Klan foi exibido no Festival de Cannes, Pass Over esteve longe de receber igual atenção por parte de seu realizador, Spike Lee. Basta assisti-lo para rapidamente entender o porquê, assim como o interesse do diretor em realizá-lo.

No fim das contas, este não é um filme de Spike Lee. A bem da verdade, até mesmo o conceito de filme é aqui questionável, vide que Pass Over é uma mescla de teatro filmado com algumas técnicas cinematográficas. A verdadeira dona deste projeto é Danya Taymor, codiretora deste longa-metragem, que é também a responsável pela montagem da peça teatral homônima, baseada em texto de Antoinette Nwandu. Além de produzi-lo através de sua 40 Acres & a Mule Filmworks, Lee emprestou seu nome para que o projeto ganhasse visibilidade. Conseguiu, apesar deste ser um dos raríssimos casos de filmes originais da Amazon Prime Video que não foram exibidos nos cinemas - antes da pandemia de COVID-19, é claro.

Compreender tal conjuntura é necessário devido às características bem particulares deste projeto. Com apenas 1h15 de duração, Pass Over é quase inteiramente a encenação para as câmeras, e com público, da peça citada. Há duas grandes, e relevantes, influências do cinema: a adoção de variadas câmeras retratando os atores, por vezes bem intimistas, aliada a uma edição que insere dinamismo na constante troca de diálogos; e a abertura e desfecho do longa, que retratam a movimentação do público presente, buscando também sua reação diante do exibido, mesmo que sem palavras. De resto, trata-se de teatro puro.

É no conteúdo de tal texto que se compreende com exatidão o porquê do interesse de Spike Lee neste projeto. Se a abordagem da fraturada e complexa relação social entre brancos e negros em solo americano é até mesmo óbvia, há também a contundência que o diretor tanto aprecia, no sentido de não apenas expor problemas mas também cobrar soluções, sem medo de causar mal-estar. A peça de Nwandu é habilidosa neste sentido, ao lidar as desconfianças de lado a lado sem abandonar um certo tom informal, especialmente através das gírias onipresentes nas conversas entre os dois amigos, que protagonizam esta história. Por outro lado, o texto também possui problemas  ao se aproximar do desfecho, pela busca por momentos de impacto ao invés de melhor desenvolver tais questões na narrativa. Até funciona, pela reação proporcionada e o imediato paralelo com o cotidiano, mas revela também uma certa fragilidade.

Em relação ao elenco, os holofotes vão todos para o carismático Jon Michael Hill, intérprete de Moses. Mas este não é propriamente um trabalho de elenco, e sim de texto. Por mais que os quatro que sobem ao palco estejam coesos, é graças ao material escrito por Nwandu que tudo se sustenta, de forma a manter o interesse do espectador.

No fim das contas, Pass Over é um híbrido mais interessado na mensagem a ser transmitida do que propriamente na forma como a transmite, tanto pelo lado narrativo quanto estético, por mais que haja aqui uma clara busca em tornar o teatro filmado mais atraente a quem o assiste diante de uma TV - ou celular, laptop, enfim... Como experiência até é válida, como cinema nem tanto.

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Jornalista e crítico de cinema. Fundador e editor-chefe do AdoroCinema por 19 anos, integrante da Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema) e ACCRJ (Associação de Críticos de Cinema do Rio de Janeiro), autor de textos nos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros", "Documentário Brasileiro - 100 Filmes Essenciais", "Animação Brasileira - 100 Filmes Essenciais" e "Curta Brasileiro - 100 Filmes Essenciais". Situado em Lisboa, é editor em Portugal do Papo de Cinema.
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