Sinopse
A ex-militar Lynsey volta do Afeganistão depois de sofrer um trauma intenso por conta da explosão de uma bomba.
Crítica
Há quase cinco anos sem aparecer como protagonista (o último longa que “carregou” sozinha foi Operação Red Sparrow, 2018), Jennifer Lawrence está de volta às telas – e, provavelmente, ambicionando por um lugar também na temporada de premiações – com o drama Passagem, no qual retorna também a um tipo que lhe é confortável: a mulher capaz de atos heroicos que, contrariando expectativas, irá se colocar frente aos desafios impostos pelo sistema. Porém, ao invés de ter que lidar com sociedades distópicas ou seres mutantes, agora se vê tendo que aprender a vencer os próprios traumas, experiências marcantes vividas em ambiente de guerra. Sim, Lynsey, sua personagem, é uma ex-militar sobrevivente a um atentado que é mandada de volta para casa em busca de recuperação, ao mesmo tempo em que que almeja voltar ao campo de combate. Num primeiro momento, soa quase como uma contradição, mas um olhar apurado irá identificar território seguro para a atriz expor as características pelas quais se tornou conhecida, ao mesmo tempo em que faz deste um esforço que pouco acrescenta ao seu currículo.
Lynsey está retornando à sua cidade natal. Antes disso, terá que passar por um momento de ajuste e adaptação, proporcionado pelo exército e governo, que a permita se recuperar por completo (ou quase isso) até se considerar mais uma vez com condições para encarar a vida normal. Sharon (Jayne Houdyshell, de Only Murders in the Building, 2021-2022) é a senhora que ficará responsável por esse período de transição. Quando a protagonista se apresenta pela primeira vez ao público, nem caminhar sozinha é capaz. Atividades básicas, como ir ao banheiro ou se alimentar, precisam de uma motivação extra e de uma coordenação que, ao menos por enquanto, lhe falta. Mas, como dito, está atravessando uma fase de resgate – de quem foi, de quem poderá vir a ser – que, obviamente, não deverá durar para sempre. Assim que conseguir vestir a própria roupa e se manter em pé sem apoios, é chegada a vez de seguir em frente.
Passagem, como o próprio título adianta, narra um estágio transitório desta mulher. Aos poucos, mas também sem muito mistério, descobre-se de onde veio, o que viveu e as dores que carrega consigo. Para onde vai, no entanto, parece ser o maior ponto de dúvida. Assim que volta a morar com a mãe (Linda Emond, de A Idade Dourada, 2022), um atrito que se percebe ser de longa data rapidamente se estabelece. Há carinho entre elas, mas esse está soterrado por anos de distanciamento, um cotidiano exaustivo e uma absoluta falta de perspectiva de melhora. Essa mais velha, há anos vivendo sozinha, faz visível esforço para encaixar o retorno da filha no seu cronograma diário, mas uma intimidade como a que ambas talvez almejem não se constrói do dia para a noite. E no final das contas, Lynsey tem outras preocupações em mente. Questões mais urgentes. Naquele cenário esteve por anos, tempo suficiente para saber que, além de se perguntar para qual destino seguir, há a certeza de onde não se quer ficar.
Tanto é que, mesmo qualificada e com histórico militar, busca um trabalho basicamente operacional, que dela pouco exige, mais para ocupar seus dias do que para compor qualquer tipo de ambição. Será limpando piscinas de famílias abastadas que passará a ocupar suas manhãs e tardes. Em uma reflexão que acidentalmente aproxima o filme do nacional Que Horas Ela Volta? (2016), Lynsey e a mãe terão um raro instante de proximidade em uma piscina plástica improvisada no quintal dos fundos, em uma noite particularmente quente, em contraste com a rotina diária da jovem. Ver as duas juntas, alegremente espremidas por refresco e afeto, oferece um calor à narrativa que vai além da sensação térmica. É de se lamentar, no entanto, sua brevidade, indicando o alcance limitado da cineasta a respeito do conjunto que ela mesma chega a orquestrar.
A responsável pela cena é a diretora Lila Neugebauer, que após ter comandado episódios de séries badaladas, como Maid (2021) e The Sex Lives of College Girls (2021), tem aqui sua primeira oportunidade em um longa-metragem. E o que desenvolve é um estudo de personagem, focado quase que integralmente nessa jovem em busca de uma razão, seja para partir ou ficar. No entanto, sua história só passa a ganhar algum brilho a partir do encontro com o mecânico vivido por Brian Tyree Henry. James vende uma imagem de satisfação pelo lugar que ocupa na ordem das coisas, mas basta que uma possibilidade de contato se estabeleça para que suas rachaduras também se tornem visíveis. Ele convence tanto na indiferença quanto na ânsia por mudança, e os dois se tornam mais interessantes – e convincentes em suas angústias e sentimentos – quando juntos do que separados em existências modorrentas e desprovidas de motivações. É por ele – e pelos dois, consequentemente – que Passagem, enfim, chega a dizer a que veio. Tivesse a proposta apostado na dupla desde o começo, certamente o resultado teria uma força que agora, do jeito que se apresenta, até vislumbra, mas mais como uma promessa do que uma realização.
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Grade crítica
Crítico | Nota |
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Robledo Milani | 6 |
Ailton Monteiro | 7 |
Francisco Carbone | 5 |
Daniel Oliveira | 4 |
MÉDIA | 5.5 |
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