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Sinopse

Para convencer o patriarca a embarcar numa viagem dos sonhos, uma família de patos vai fazer de tudo.

Crítica

Apesar do título recebido no Brasil, o batismo original – Migration, em inglês – termina por fazer mais sentido ao longa dirigido por Benjamin Renner – indicado ao Oscar e premiado em Cannes por Ernest & Celestine (2012) – e pelo estreante Guylo Homsy. Afinal, ainda que uma família de patos seja, de fato, a protagonista da maior parte dos acontecimentos vistos em cena, ela não é a única a ganhar destaque durante a trama. Há também garças, pombos, araras (e até pinguins!) e ainda seus citados nêmesis, como águias, falcões e gaviões. Pois a história desenvolvida por Renner em parceria com Mike White (vencedor do Emmy pela série The White Lotus, 2021-2022) aborda os dramas, as inseguranças e as peripécias cometidas por aves que precisam mudar de um lado a outro junto com o passar das estações. Patos!, portanto, é não apenas reducionista, mas genérico, colocando tal produção na mesma prateleira de tantas outras similares, como Os Pinguins de Madagascar (2014), Angry Birds: O Filme (2016) e outros ainda mais próximos, como Cegonhas (2016) ou Rio (2011). Uma percepção que, se falha no sentido de promover o recém-chegado como algo original, ao menos é precisa na sua descartabilidade: são todos absurdamente iguais, alternando apenas quais espécies de animais estarão (ou não) no centro das atenções, sem muitas variáveis entre umas e outras.

Porém, em Patos! há um problema de interpretação, num subtexto de entendimento, que o torna mais pernicioso que os seus colegas. Como dito acima, o foco dos eventos está em acompanhar quatro patos – pai, mãe e filhos – em sua jornada do Canadá até a Jamaica, onde esperam passar pelos meses de verão num clima mais ameno. Essa viagem, no entanto, não faz parte da tradição familiar: pelo contrário, será a primeira vez deles. E isso porque o patriarca, Mack, prefere mantê-los no mesmo laguinho de sempre, pois ali não apenas conhece o ambiente, como sabe ser longe de predadores – em resumo, é um lugar seguro. Basta, porém, surgir um convite para irem além que a situação toda se inverte, e não apenas o filhote adolescente e a garota ainda criança, como até a esposa e mãe dos pequenos irão se colocar contra ele, exigindo uma partida rumo a novos horizontes. A determinação paterna, porém, também será alterada da noite para o dia: ao perceber que seu destino, caso insista nessa posição isolada, acabará sendo a solidão, decide já no amanhecer seguinte que devem, sim, alçar voo.

Veja bem, portanto: Mack é tratado o tempo todo por aqueles ao seu redor como um tipo covarde, que teme qualquer alteração de cenário e morre de medo de qualquer tipo de ameaça, ciente de que não teria como enfrentá-las a ponto de garantir não apenas sua sobrevivência, mas também as dos seus. Confunde-se, como se percebe, covardia com precaução e experiência. O fato de ser o mais velho – e, portanto, o mais vivido – é pouco levado em consideração. Seu receio volta e meia é lembrado como motivo de chacota ou decepção, obrigando-o a se contradizer e provar não que ele está certo, mas de que os demais é que estão errados. Dessa forma, a maior parte dos movimentos por eles liderados tem como propulsor a birra do filho mais velho, típico representante de uma geração que não aceita receber ordens e muito menos ser contrariada. Como se a vivência do adulto – e as consequências que tanto teme – não devessem ser levadas em consideração. No fim das contas, quem acaba adotando um comportamento infantilizado e sem pesar os prós e contras são justamente os pais – vide a visita a uma cozinha em plena atividade, quando o risco de virarem o prato principal era imenso.

Feito esse apontamento, há de se observar ainda que Patos! é um filme desprovido de conflito: não há um clímax a ser vivido, uma dificuldade a ser superada, um aprendizado a ser enfrentado. O que existe é uma viagem e os tantos episódios pelos quais atravessam pelo caminho. É um roteiro formado por rápidos esquetes – felizmente, o longa inteiro tem menos de 90 minutos – mas não diversos o suficiente para não repetirem fórmulas (como a garça e a pomba, ambas assustadoras na apresentação, mas logo se revelando como novas amizades) ou interessados o bastante para desenvolverem os tipos que introduzem, como os patos que os estimulam a migrarem (ou seja, já acostumados a esse tipo de vida) ou mesmo seus personagens principais (qual seria o trauma de Mack que o teria levado a se tornar tão cauteloso?). O que se tem é uma aventura pensada quase que exclusivamente a um público muito pequeno e pouco exigente, acostumado a respostas rápidas e a apenas responder aos estímulos, sem maiores reflexões.

Chama atenção, ainda, ser essa uma produção da Illumination, a mesma de franquias consolidadas, como Meu Malvado Favorito e Pets: A Vida Secreta dos Bichos (2016). Responsável pela animação de maior sucesso financeiro de 2023 – Super Mario Bros: O Filme – esta é, provavelmente, a grande concorrente no momento da Disney/Pixar, superando, inclusive, a DreamWorks. Seria natural esperar, portanto, uma maior exigência narrativa, e não apenas figuras coloridas sempre em movimento, envoltas por um tipo de humor violento e selvagem, ao nível de Tom & Jerry ou Pernalonga, fenômenos de décadas atrás, mas que hoje parecem soar um tanto deslocados. A sorte, enfim, é que sendo curto e de rasa profundidade, é também de fácil esquecimento. Pato Donald e Patolino que fiquem descansados: seus postos de mais populares representantes da raça na cultura popular estão mais do que preservados, pois não há nada em Patos! que possa gerar neles qualquer tipo de preocupação.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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