Crítica
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Sinopse
Serge Tanneu decide abandonar a carreira de ator quando está no auge. Ele se torna um ermitão morando numa casa caindo aos pedaços. É então que um novato propõe que ele o retorno à atuação, em O Misantropo, de Molière.
Crítica
Fabrice Luchini interpreta em Pedalando com Molière uma perfeita versão do protagonista de O Misantropo, um dos grandes trabalhos do dramaturgo francês. O que torna tudo mais interessante para os cinéfilos de plantão é que o ator já havia mergulhado na obra daquele artista no ótimo As Aventuras de Molière, lançado em 2007, com direção de Laurent Tirard. E ajudou o diretor Phillipe Le Guay, do delicioso As Mulheres do 6º Andar (2010), na ideia original para esta comédia. Isso e o fato desta “adaptação” ter um ar metalinguístico deixam tudo mais rico.
Luchini interpreta Serge Tanneur, um ator aposentado que recebe a oportunidade de encenar sua peça favorita após anos de ostracismo. Sua vontade, lógico, é viver Alceste, o tal misantropo do título da obra. Quem melhor que ele, afinal? Alguém que carrega em si várias das características que faziam de Alceste quem era só poderia ficar com o papel. No entanto, quem lhe oferece o retorno aos palcos, o famoso ator de tevê Gauthier Valence (Lambert Wilson, de Homens e Deuses, 2010), tem outros planos. Este quer para si o papel do protagonista, oferecendo ao antigo amigo um personagem secundário – mas também interessante. Depois de algumas discussões, Tanneur promete pensar no assunto caso Valence concorde em ensaiar com ele a peça, durante alguns dias. O que parecia uma oferta irrecusável passa a ser uma guerra de egos que poderá colocar não só o espetáculo em risco, como a amizade daquelas duas figuras. Ainda que Pedalando com Molière não seja um título dos piores, o original francês tem muito mais significado: Alceste à Bicyclette (Alceste de Bicicleta). A ideia de ter o protagonista de Molière pedalando por uma pacata cidade francesa além de um tanto poética, mostra-se divertida neste longa-metragem de Le Guay. O título em sua língua materna deixa ainda mais claro que estamos vendo um personagem com diversas características emprestadas do misantropo Alceste.
Quando o filme se concentra nos diálogos entre os dois amigos e na batalha de egos que acontece – certas vezes de forma velada, outras vezes nem tanto – entre Tanneur e Valence, Pedalando com Molière é só acertos. Ambos atores são excelentes, construindo personagens que vão muito além do superficial. Enquanto Valence é um astro televisivo, mas sem muita certeza do seu real talento, seu amigo recluso é a soberba em pessoa, mas retirou-se da vida pública sem dar muitas explicações. Lucchini vai desvelando a personalidade forte de seu personagem a cada nova cena, não devendo nada a seu colega de tela, Lambert Wilson, sempre corretíssimo, passeando muito bem na tela como a estrela incompreendida. O que prejudica Pedalando com Molière são as histórias paralelas, que pouco contribuem para o todo. Ainda que o interesse amoroso de Tanneur, a bela italiana Maya Sansa (de A Bela que Dorme, 2011), tenha importância na trama, o desenrolar de sua história acaba sendo bem menos singular do que as cenas divididas entre Lambert Wilson e Fabrice Lucchini. Isso sem contar em uma personagem descartável, pretendente a atriz pornô, que surge na tela apenas para embelezar o filme. Sempre que o longa de Le Guay foge do foco principal, perde muito em brilho.
Isso, no entanto, não prejudica totalmente este belo trabalho de Phillippe Le Guay. Pode ser um tanto irregular em alguns momentos, mas preserva em tantos outros o brilhantismo de Molière em uma trama que brinca com o texto do dramaturgo sem nunca perder o respeito com a obra. O desfecho, irônico, fecha com chave de ouro esta produção estrelada por dois grandes atores franceses defendendo um texto cheio de humor e amargura. Uma mistura que, aqui, dá muito mais certo que errado.
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