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Crítica


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Sinopse

Ainda bancada pelos pais, Pepi vive num conjunto habitacional de Madrid quando é estuprada por um policial que encontra maconha em sua casa. Ao lado de sua melhor amiga, líder de um grupo punk, ela resolve se vingar.

Crítica

Libertário, sexual, ousado e, por vezes, engraçado. Pepi, Luci, Bom e Outras Garotas de Montão foi o filme de estreia do diretor espanhol Pedro Almodóvar nos cinemas. Depois de ter assinado diversos curtas-metragens, o cineasta resolveu assinar seu primeiro longa e com a ajuda da atriz Carmen Maura (que viria a ser sua musa por boa parte da carreira), conseguiu o financiamento necessário para conceber sua obra. Na época, o trabalho do diretor foi bastante criticado pelo teor frívolo de algumas passagens, pelo amadorismo da captação de imagens e pelo senso de humor chulo, para dizer o mínimo. Visto em perspectiva, diversas dessas críticas continuam valendo, mas não deixa de ser interessante assistir a um grande diretor em sua primeira incursão em temáticas que tanto trabalharia em sua carreira.

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Como nos acostumaríamos com o passar do tempo, as mulheres são o foco do filme de Pedro Almodóvar. E neste longa-metragem, temos três protagonistas com características bastante diversas, mas que constroem uma forte amizade. Pepi (Maura) é uma mulher moderna, que cultiva haxixe em seu apartamento e que utiliza de sua criatividade para se dar bem na vida. Um dia, um policial abusivo (Félix Rotaeta) invade a casa daquela mulher com o pretexto de prendê-la pela plantação ilegal. Em vez de levá-la em custódia, ele a estupra. Furiosa, Pepi bola um plano para se vingar daquele homem. Primeiramente, planeja uma surra. Depois, se aproxima da esposa dele, Luci (Eva Siva), e a influencia a deixar a casa daquele sujeito. Luci é uma dona de casa submissa e que tem verdadeira tara em ser espancada. Seu lado masoquista logo é percebido por Pepi, que a apresenta à sua amiga Bom (Alaska), uma cantora de punk rock lésbica que se afeiçoa de pronto por aquela figura curiosa. Agora, as três viverão situações das mais variadas em busca do seu caminho.

Almodóvar não tem pudor algum em Pepi, Luci, Bom e Outras Garotas de Montão. As temáticas são espinhosas e, nem por isso, o cineasta se mostra preocupado com as repercussões que sua obra poderia causar. O estupro inicial é filmado com insuspeito senso de humor. O uso de drogas é aberto – e não fica só no haxixe. E práticas sexuais longe do comum são inclusas, com destaque para uma das cenas mais famosas do filme, quando Bom urina em Luci no primeiro encontro entre as duas. Essas são só algumas das sequências ousadas, que ainda incluem medição de pênis em um evento intitulado “Ereções Gerais” e as hilárias propagandas das calcinhas Ponte, que servem para um tudo. Antes de qualquer coisa, o diretor parece querer se divertir e espera que o espectador se divirta junto com seu senso de humor.

Quem embarcar com Almodóvar tem tudo para curtir as personagens fortes criadas pelo cineasta. Vivemos um momento em que o feminismo é um conceito cada vez mais em voga e é interessante notar como o diretor já o incluía em seus primeiros trabalhos. Pepi e Bom são do tipo de mulher que não leva desaforo para casa. Elas são independentes, livres, sem freios. Elas têm um contraste grande com Luci, que é fraca e completamente maleável, embora tenha tentado criar asas para seguir suas novas amigas. Sua trajetória é interessante, mas acaba sendo circular demais, o que demonstra o pouco foco dado por Almodóvar àquela personagem. Por falar em foco, o diretor parece querer abraçar um mundo muito maior do que consegue, criando diversos tipos que nunca vão a lugar algum. É notório que o primeiro corte de Pepi, Luci, Bom e Outras Garotas de Montão tinha apenas 50 minutos e outros 25 tiveram de ser filmados para que a obra tivesse chance de ser exibida nos cinemas. Essa barriga pode explicar o porquê de tantos personagens surgirem e não terem função alguma na trama.

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Um bom exercício inicial, embora falho e com pegada amadora, a estreia de Pedro Almodóvar na direção já mostrava as temáticas pelas quais o cineasta ficaria mundialmente famoso, só lhe faltando o conhecimento técnico para um resultado superior. Para os fãs do espanhol, é um programa essencial, até para testemunhar esse debut que fez possível outros excelentes filmes virem à tona.

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é crítico de cinema, membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Jornalista, produz e apresenta o programa de cinema Moviola, transmitido pela Rádio Unisinos FM 103.3. É também editor do blog Paradoxo.
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