Crítica
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Sinopse
Qual é o verdadeiro papel dos figurantes? Para conjecturar sobre isso, três regimes de imagem são utilizados: documentário institucional, games e maquetes eletrônicas.
Crítica
Performatividades do Segundo Plano, videoinstalação composta de dois curtas com cerca de oito minutos cada, aborda os figurantes, aqueles personagens alijados do plano principal e/ou que não têm espaço suficiente para sobressair em cena. Na primeira parte, prevalece a explicação, a análise com tintas didáticas de um cinejornal que mostra retirantes nordestinos chegando a São Paulo. O filmete é exibido, não deixando grandes impressões, para além do movimento histórico daquela população flagelada. Nada aparentemente é muito sublinhado/ressaltado. Os cineastas Frederico Benevides e Yuri Firmeza, então, voltam a ele a partir de investigações pontuais cuja capacidade de questionamento e significação é muito fértil. Eles começam a destacar a presença constante de uma menina, a reincidência dela nos planos, evocando uma (a)tensão oculta, que não parecia possível num instante inicial. É uma recondução de olhar a essa essência (?) sublimada.
Nesse sentido, a dupla de realizadores segue recortando figuras numa lógica narrativa que parecia escondê-los. Frederico Benevides e Yuri Firmeza falam de um homem vestido de xadrez que pode ser alguém responsável pelo recrutamento dos migrantes, grifam com semelhante escrutínio a possível conexão com o policial, tipo igualmente dono de uma postura distinta das demais pessoas. Porém, sem esquecer-se da menina de cabelos longos nesse processo minucioso de análise. O resultado mais evidente é atingir a possibilidade de entendimento aprofundado daquilo tudo ou, ao menos, a conjectura do que a narração suprime, a denúncia involuntária carregada nos gestos e pela movimentação dentro dos quadros. Não seriam todos ali também estrangeiros? Homens, mulheres e crianças não parecem tão felizes, ao contrário do que o texto quer consolidar. É instigante esse desmembramento acurado que expõe engrenagens e elementos insuspeitos.
Na tela seguinte do todo denominado Performatividades do Segundo Plano – videoinstalação que contempla, ainda, oito fotografias lenticulares –, Frederico Benevides e Yuri Firmeza passam do espectro diretamente analítico e se instauram num questionamento próximo ao filosófico. O texto dito coloca em xeque um software capaz de criar rostos, imagens a serem vendidas a toda sorte de compradores que não desejam pagar direitos por autorais aos viventes. Se trata de um segmento cujas potencialidades se esgotam rapidamente, mas que evidentemente apresentam questões complementares à fração antecessora. Com outras ferramentas, continua a discussão sobre identidades, a respeito da potência dos rostos, das histórias e personalidades por trás de uma simples representação, mas, dessa vez, via uma elucubração que parte das inexistências e dos artifícios.
Frederico Benevides e Yuri Firmeza estabelecem diálogo entre as partes, mas elas podem ser vistas separadamente e assim compreendidas. Na tela dois de Performatividades do Segundo Plano, a repetição deliberada provavelmente visa gerar uma exasperação, tirar-nos da inércia de acreditar que determinadas ferramentas da contemporaneidade (acrescidas de poder e autonomia no futuro?) são intocáveis por força da aptidão para caracterizar o irrefreável progresso. Vemos alguém selecionando rostos desenhados algoritmicamente com dados randômicos. O resultado não é muito diferente de uma fotografia, mas será que pode ser chamado, em tantos sentidos, de reprodução? O potência do experimento reside na ampliação da reflexão permitida pelo audiovisual e pela tecnologia que o deixa existir, como qualquer filho do industrial.
Filme assistido online no 14º Cine Esquema Novo, em abril de 2021.
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