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Sinopse

Petra é uma mulher que não conhece o pai e decide procurá-lo após a morte da mãe. A busca a leva a Jaume, um artista famoso e homem poderoso. Mas Lucas e Marisa, filho e esposa de Jaume, também acabam cruzando seu caminho. É a partir desse momento que uma série de segredos de família vêm à tona e atitudes violentas levam todos ao limite.

Crítica

Uma tendência do ser humano é complicar as coisas. Certas narrativas são simples, mas na tentativa de reproduzi-las através de um formato que possua algum apelo aos espectadores mais incautos, enfeita-se os elementos originais através dos mais diversos recursos, como alterar a ordem dos acontecimentos, inserir mistérios e surpresas de última hora aqui e ali, dissimular a verdadeira personalidade dos envolvidos e oferecer segredos e mentiras à revelia dos interesses primários. Exatamente tudo o que acontece em Petra, longa escrito e dirigido pelo catalão Jaime Rosales, cuja estreia se deu na Quinzena dos Realizadores do Festival de Cannes 2018. Um palco acima deste filme cujos méritos estão quase que inteiramente restritos apenas ao que suscita, e menos ao que parcamente entrega.

Petra (Bárbara Lennie, de Uma Espécie de Família, 2017) é uma jovem que acabou de ganhar uma bolsa de residência artística com o renomado escultor Jaume Navarro (Joan Botey). Com a sua chegada, somos apresentados à esta história. No entanto, este não é o começo. Afinal, uma vez que é dividido em capítulos, desperta a curiosidade perceber que este já é o segundo – e que o primeiro, aquele que deveria ter servido de abertura, só encontrará espaço mais adiante. O por quê disso? Reservar uma importante revelação para o momento mais adequado. Ainda que não seja exatamente isso que a audiência irá verificar. É perceptível, desde sua chegada, que a presença de Petra naquele lugar não é gratuita – ela possui uma agenda própria, e esta vai além de um mero interesse profissional.

Entre a esposa do artista, Marisa (a almodovariana Marisa Paredes), que parece viver em um estado de constante irrelevância ou perplexa apatia, e o filho deles, Lucas (Alex Brendemühl, de Um Instante de Amor, 2016), um fotógrafo que não conseguiu se afastar da sombra paterna, a recém-chegada passa a estabelecer laços com cada um deles. Mas o principal, aquele pelo qual mais anseia, é com o próprio Jaume, o homem que acredita ser o pai que nunca conheceu. A missão de ir atrás dele só se deu após a morte da própria mãe, que sempre guardou sua identidade para si. Portanto, tudo o que a garota possui são suspeitas, informações incompletas de uma tia ou de velhos amigos, peças que não chegam a formar um quebra-cabeça completo, mas parecem ser suficientes para apontar para uma direção. O elemento da dúvida, portanto, existe, ainda que ela insista em desconsiderá-lo.

O cenário está armado: Petra e Lucas não podem ficar juntos, pois são irmãos. Surpreende a reação de Marisa, no entanto, que não se espanta com a novidade: “você, de fato, aprontou muitas nos seus melhores anos. Eu também, é claro”. Mas Jaume não se dá por vencido. Ele é um homem que está sempre no controle da situação. Após transar com a empregada – para poder atender a um pedido de ajuda dela – deixa claro considerá-la menos por isso, que tal ato teve pouco significado para ele e, portanto, esforço algum fará para manter o segredo, levando-a ao suicídio. Quanto ao filho, o trata com irremediável desprezo, simplesmente por não o considerar à sua altura. Não será, portanto, uma desconhecida que irá desafiá-lo: “não, você não é minha filha”, explica ele, apontando um desencontro de datas. Mas Rosales não se contenta com isso.

É quando percebemos o descaso do realizador com suas revelações. Ao abrir cada capítulo com um letreiro que anuncia o que irá acontecer a seguir, diminui a importância dos fatos. A ordem misturada dos eventos, também, acaba por ter poucas consequências: se o filme fosse narrado em um sentido cronológico, é possível que os efeitos fossem exatamente os mesmos. Agora, o pior, é não saber os limites possíveis para cada reviravolta. A impressão que se tem é estar diante de uma daquelas bonecas russas, em que sempre é possível abri-las e encontrar outra dentro. Ou, pior, de uma popular novela latina, nas quais os desenlaces familiares nunca são o que parecem ser. Petra, até pelo próprio nome, pode direcionar o espectador à mitologia grega. Porém, a despeito de suas boas atuações, de clássico esse conto de encontros trágicos e desencontros pífios pouco possui. Pois sofre pelas mãos de um condutor que não reconhece até onde pode ir sem prejudicar a experiência oferecida pelo conjunto que reuniu. Como saldo, há muito o que se apontar. Porém, o espanto maior é perceber que a soma destes fatores se revela aquém dos seus potenciais, principalmente por menosprezar o poder de dedução e entendimento do seu público.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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