Crítica
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Sinopse
Os únicos dois sobreviventes do povo indígena Piripkura estão vivendo em uma área protegida no Mato Grosso. Cercados por fazendas, eles vivem com um machado velho e uma pequena tocha acesa pela última vez em 1998. Para que a área continue sob proteção, a cada dois anos uma expedição da FUNAI vai ao local assegurar que os dois estão vivos.
Crítica
Antes de analisar os méritos puramente cinematográficos de Piripkura, é necessário ressaltar a sua importância como documento do descaso das autoridades com a população indígena no Brasil, uma conjuntura infelizmente comum e antiga. A busca do indigenista Jair Condor é imprescindível à manutenção da interdição federal de um trecho da floresta Amazônica. Ele parte com um pequeno grupo numa investigação mata adentro para localizar os dois únicos remanescentes do povo que dá nome ao filme. Sem provar a (r)existência deles, a FUNAI, a Fundação Nacional do índio, perde argumentos para manter as terras bloqueadas à sanha dos madeireiros e garimpeiros da região. Os diretores Mariana Oliva, Renata Terra e Bruno Jorge seguem essa missão vital, observando atentamente a transformação da paisagem pela influência gananciosa do homem branco, evidenciando sua ação danosa sempre que possível.
A interlocução com Rita, também piripkura, mas que mora numa área onde os costumes do colonizador foram plenamente assimilados – vide o hábito de usar roupas e o próprio idioma – serve para acessar um pouco a história desse povo cuja extinção é apenas uma questão de tempo. Ela chega a acompanhar Jair na primeira das expedições pela vastidão natural a fim de encontrar seus consanguíneos, mas se restringe, in loco, a comentários esparsos que ajudam a nos contextualizar, quando muito. Piripkura vai gradativamente centralizando a figura de Jair, ensaiando lhe entregar o protagonismo, haja vista a atenção direcionada às suas histórias de décadas lutando pela causa indígena. Antes disso, porém, nos idos dos anos 60, ele era um dos homens que, acreditando no discurso tacanho vigente, viam os nativos como empecilhos ao progresso da nação. Seu relato das emboscadas que vitimaram covardemente eles é forte.
Piripkura possui belos planos, fruto de uma concepção imagética obviamente empenhada em ressaltar o contraste entre a beleza da natureza e a feiura da intervenção humana. O filme é marcado por travelings como os que escrutinam a paisagem recém-incendiada numa clareira, o testemunho do tráfego de caminhões apinhados de madeiras, num esforço evidente de expandir o olhar para além da procura aos piripkura remanescentes. Mariana Oliva, Renata Terra e Bruno Jorge denunciam, às vezes por meio de uma tomada sintomática, noutras através da fala de alguém indignado com a situação, as mazelas amazônicas decorrentes da violência extrativista. Todavia, há uma morosidade contraproducente no progresso narrativo, por certo, tentativa de transmitir as dificuldades. Também sobressai a indecisão quanto ao cerne da abordagem, se a devastação, os nativos restantes ou o indigenista incansável.
O encontro com Pakyî e Tamandua, após uma segunda jornada embrenhada na selva, propicia um viés mais marcadamente etnográfico, vide o interesse da câmera no registro da reaproximação de Jair e sua equipe de ambos. Recorrendo pouco a falas e outros excertos verbais, os diretores se contentam em filmar as ações e reações desses índios que sobrevivem a toda sorte de obstáculos, como os madeireiros, os garimpeiros e demais interessados em sua extinção para a ocupação predatória de um território ainda mantido sob a jurisdição do Estado. Outro indício da claudicância conceitual é a cena em que se pode ouvir um noticiário televisivo falando acerca do procedo de impeachment da agora ex-presidenta Dilma Rousseff. O documentário recorrentemente faz isso, ou seja, acessa uma instância de extrema relevância, como a influência política ao futuro indígena, mas não a desenvolve como poderia. Uma pena, pois seu ímpeto é bastante louvável.
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