Crítica
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Sinopse
Num lugar ermo, pobre e aparentemente esquecido por Deus, a vida brota pelas frestas do improvável. Aparecida, mulher forte e com uma grande sede de saber, cultiva seus sonhos de modo comovente.
Crítica
Filme de abertura da 20ª edição do Cine PE, em Recife, Por Trás do Céu não poderia fazer sua estreia em cenário mais adequado. Inspirado pela cultura e tradição tipicamente nordestinos, o longa-metragem de Caio Sóh reverbera em seu enredo e estética uma narrativa que fala sobre os sonhos de uma mulher que deseja conhecer o que há além das nuvens e dos limites de sua remota vida no meio do sertão paraibano.
Filmado na zona rural de Cabaceiras, que oferece toda a magnitude de uma aridez cinematográfica da Paraíba, Por Trás do Céu acompanha a sofrida existência de Aparecida (Nathalia Dill), que cresceu entre a dualidade de sonhos que a impulsionam para longe e a realidade difícil que a cerca. Num casebre improvisado no topo de um rochedo, ela constrói objetos lúdicos a partir das sucatas com que é presenteada pelo seu marido, Edivaldo (Emílio Orciollo Netto). Aos poucos, é revelado o porquê do isolamento do casal, que tem o pacato cotidiano interrompido pela visita de um antigo amigo, Micuim (Renato Góes) e pela prostituta errante Verônica (Paula Burlamaqui).
O drama de Sóh flerta com o cômico vez ou outra, seja improvisando um duelo do repente nordestino ou nas imprecisões com que seus personagens se referem a itens ordinários por eles desconhecidos, como uma revista e uma barra de chocolate. Ainda que se ambiente em território onírico, o filme carrega no drama a representação de párias infelizmente comuns na sociedade brasileira e seus dilemas bem reais, como a miséria, a violência contra a mulher e sua objetificação, a necessidade do êxodo na busca por melhores condições de ser, e não apenas existir.
A direção de arte, assinada por Ana Isaura e Kennedy Mariano, é de uma delicadeza singular, que remete ao recente Mad Max: Estrada da Fúria (2015) em suas composições artesanais em locações desérticas. A casinha repleta de enfeites, a entrada improvisada com a porta de um carro e tantos outros componentes de cena amplificam o realismo fantástico na qual o roteiro de Soh investe, que faz lembrar uma peça de cordel levada às telas. As transições entre poesia e realidade são um pouco duras, e impedem uma maior fruição narrativa ao filme, porém é na fotografia de Azul Serra que este justifica suas aspirações mágicas.
O elenco global não parece a melhor escolha para traduzir essa história, formado por cariocas e paulistas que arriscam um sotaque nordestino artificial. Quem sai por cima são os coadjuvantes Paula Burlamaqui e Renato Góes, este recifense legítimo. Adaptado da peça teatral homônima também concebida por Caio Sóh, Por Trás do Céu termina com esperança e alguma melancolia, e deixa as notas de uma agridoce sessão ao espectador que aceitar participar da jornada que ele propõe.
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