Crítica
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Sinopse
Viúva e habitante de uma chácara catarinense praticamente isolada, Bertha tem dificuldades para manter a propriedade e resiste à proposta de morar com o filho na capital Florianópolis. Ao tomar conhecimento da chegada de um grupo de haitianos ao estado, Bertha decide acolher Bastide, estrangeiro que pode a ajudar a continuar ali.
Crítica
Em princípio, há dois personagens centrais no filme Porto Príncipe. O primeiro deles é Bastide (Diderot Senat), jovem haitiano obrigado a migrar para o Brasil depois que o terremoto de 2010 transformou parte de seu país natal em escombros. A segunda é Bertha (Selma Egrei), idosa brasileira que vive sozinha numa propriedade campestre no estado de Santa Catarina. Portanto, eles representam mundos completamente diferentes marcados por diversas oposições (idade, classe social, marcadores raciais, perspectiva de vida, enraizamento, etc.), então cruzados por uma conjunção de fatores. Apesar dos inúmeros empecilhos, os dois criam um vínculo de mútua cooperação. No momento em que vivemos, com o aumento das distâncias entre grupos que pensam estritamente dentro de bolhas, as mensagens gregárias são bem-vindas. No entanto, a diretora Maria Emília de Azevedo se vale de uma abordagem anacrônica para desenhar esse vínculo bonito, vide o romantismo excessivo das conciliações que superam adversidades como num passe de mágica e a manutenção da perspectiva branca, residente e financeiramente bem-sucedida como a principal do longa-metragem. Os dois personagens são importantes à trama, mas tudo gira em torno de Bertha, de como a presença do estrangeiro muda as coisas para ela. No fim das contas, a experiência dolorosa de Bastide serve para Bertha se empoderar e ser feliz.
Maria Emília de Azevedo foge do modelo Conduzindo Miss Daisy (1989), pois não mostra a mulher branca relutando em dialogar com o carismático homem negro que a conquista gradativamente – como se magicamente arrancasse as ervas daninhas de seu racismo. Bertha fica sabendo pela televisão da crise humanitária que se abate sobre o Haiti e decide fazer algo, neste caso ir ao abrigo dos refugiados e oferecer trabalho a um deles. Ela mora sozinha, é “alertada” pelo filho quanto à crescente falta de autonomia que a velhice lhe imporá, e pretende encontrar mão de obra na turma recém-chegada. É dessa forma que Bastide vai morar com ela. No entanto, tudo o que se pode esperar a partir de construção desse panorama acontece, sem muitos desvios dos lugares-comuns: o filho implica com o refugiado, a neta aparece com uma cabeça mais aberta àquela presença que escancara o racismo no estado catarinense, há uma crise na relação entre a senhora e o jovem, Bastide em algum instante é agredido fisicamente e no encerramento vem a promessa romântica de dias melhores. Porto Príncipe segue à risca a cartilha desse tipo de produção centrada em pessoas de universos distintos que convergem para mostrar o preconceito em carne viva no tecido social. Portanto, as intenções são bem-vindas, pena que os procedimentos sejam simplistas e haja a manutenção do olhar branco como o guia.
Por um lado, Bastide é um homem enigmático de poucas palavras, inclusive na companhia dos compatriotas. O filme não demonstra interesse pelas nuances do seu comportamento, sequer dando um espaço adequado à investigação dessa personalidade constantemente afrontada pela maldade alheia. Sabemos de Bastide o mínimo possível, ou seja, que teve a vida anterior destruída pelo desastre natural e está desterrado. Por outro lado, Bertha é quem sempre está com a palavra, aquela que tem o futuro definido pela presença inesperada do rapaz estrangeiro hostilizado por sua família e parte da comunidade. Se temos poucas informações sobre a vida dele, a dela é longamente explorada nesses diálogos com sintomas de monólogo. Bertha é filha de imigrantes alemães, mulher culta que lê Thomas Mann no original e está habituada aos tons da ópera embalando os seus solitários dias. Desse modo, a trama do filme vencedor do Festival de Recife de 2023 se aproveita de uma velha fórmula a fim de encarar forasteiros e vítimas de crises humanitárias, pois mantém o protagonismo no elo confortável dessa conexão ecumênica. A história é contada a partir da perspectiva da mulher acolhedora, não do homem desenraizado que enxerga poucas alternativas de futuro. Quer dizer, nem temos acesso à sua compreensão do que está acontecendo, pois Bastide é reduzido aos silêncios, às gentilezas e a um rompante.
Além dessa abordagem anacrônica, o compromisso de Maria Emília de Azevedo com a ideia de “contar uma boa história” não inclui o estabelecimento da fluidez na interação do elenco. Por mais que tenhamos em cena uma experiente atriz como Selma Egrei e um novato como Diderot Senat, nem o repertório dela ou a forte presença cênica dele são valorizados pela direção. Em vários momentos de Porto Príncipe sobressai a sensação de engessamento, quase como se conseguíssemos enxergar as marcações de cena que não foram diluídas no processo. Além disso, o roteiro assinado por Marcelo Esteves se contenta com a superficialidade das situações e dos elementos colocados em pauta, o que permite, por exemplo, a instauração do maniqueísmo. E ele depõe contra qualquer possível aprofundamento do enredo. Senão vejamos. O filho de Bertha é somente um obstáculo desprovido de camadas, assim como a anfitriã poucas vezes é encarada enquanto fruto inexorável do meio onde nasceu e aprendeu a viver – sua simetria entre refugiados haitianos e imigrantes alemães serve apenas ao único rompante enfático de Bastide. Este modo de pensar é encarado como deslize que, uma vez corrigido, a levará a ser uma pessoa melhor. Então, em vez de ler a crise humanitária haitiana a partir da perspectiva de uma das vítimas, o filme utiliza a dor e o sofrimento de Bastide para oferecer um futuro a Bertha.
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Grade crítica
Crítico | Nota |
---|---|
Marcelo Müller | 3 |
Miguel Barbieri | 6 |
MÉDIA | 4.5 |
Filme com roteiro fraco. é iluminação idem. A direção por X parece que se esquece do roteiro e denota um desmembramento casual das cenas. Até a atriz, se parece deslocada fo roteiro. A atuação do ator , parece mais forte , porém tenta manter a forma dos clichês.
não encontro trailer...