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Crítica


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Sinopse

Castro é um apresentador de TV que se reúne com velhos amigos, incluindo sua ex-esposa, em uma grande festa nos arredores de Paris. No decorrer do encontro, torna-se óbvio que o sucesso o mudou, pois antes costumava compartilhar as visões políticas idealistas de sua antiga companheira, mas agora tem uma perspectiva mais realista, senão cínica, da vida.

Crítica

Há um substrato político intermitente e considerável em Praça Pública. É evidente que a cineasta Agnès Jaoui tem um interesse bastante específico por questões relacionadas às classes sociais, às dinâmicas que garantem poder a alguns e subalternidade a outros tantos. Tais manifestações estão presentes integralmente no desenrolar da trama. Porém, nem sempre há força suficiente para fazer das observações dessa natureza além de breves comentários que, assim, não garantem a contundência da mirada, demarcando uma posição frágil entre a ideologia e o cinismo. Castro (Jean-Pierre Bacri) é um apresentador de televisão obsoleto que, à revelia de seu conhecimento, está prestes a perder o emprego que assegura notoriedade. A festa na nova casa da empresária, parceira de bastidores há diversos anos, também sua ex-cunhada, é recheada de pessoas mais ou menos notórias, uma fauna ruidosa e sintomática dessas conjunturas aqui diminuídas pelo comezinho.

Praça Pública ocasionalmente desloca o protagonismo para Hèlene (vivida pela cineasta Agnès Jaoui), idealista, ex-esposa de Castro, portanto irmã da anfitriã, numa cruzada para angariar assinaturas em prol de uma imigrante afegã que vive ilegalmente na França. Seu senso de justiça é confrontado pela filha, escritora que denuncia no seu mais recente livro, em chave caricatural, a negligência doméstica da mulher que se esforça para corrigir os problemas do mundo. Todavia, o enfrentamento da hipocrisia se dá apenas nesse instante específico, não ganhando tintas e/ou sendo ampliado para adiante da visão filial que pode perfeitamente ser contaminada pela proximidade. É recorrente no longa, aliás, o acesso a determinadas instâncias ligadas ao propósito principal, mas não estudadas ou aprofundadas devidamente. Em virtude disso, elas perdem relevância em meio a discussões simplórias sobre adultérios, dissimulações e falta de empatia.

Exemplo do desperdício, o tempo concedido para Castro demonstrar ciúmes de Vanessa (Héléna Noguerra), cujo trajeto demorado à festa vira o estopim de uma perseguição com ares de paranoia. Rimando com essa desconfiança, há o marido de Hèlene imaginando que ela mantém caso extraconjugal com um dos convidados e o posterior estardalhaço quando descoberto o relacionamento entre o sujeito conhecido e uma mulher bem mais jovem. A dimensão política, assim, perde espaço para essas conversas de alcova que, certamente, se encarregam de deflagrar a intimidade dos personagens, não sem penhorar a consistência do discurso basilar. A garçonete indiscreta que constantemente utiliza o celular para registrar a presença dos notórios, com isso deixando a desejar no quesito profissional, e o motorista, primeiro, escanteado, e, segundo, responsabilizado por um deslize não cometido são peças em torno das quais gravitam um par de considerações sintomáticas.

A produção também mostra a falência dos mitos não resistentes aos novos tempos, a degradação de figuras que habitam um olimpo privilegiado. Castro é rabugento, usa peruca para manter aparências, recorre à cocaína para suportar reuniões como aquela. Seu negativo (passado?) é o jovem que faz sucesso nas redes sociais, cercado de pares histriônicos que carimbam sua celebridade. Esse choque, a bem da verdade, provoca somente um momento fértil, a briga que leva às vias de fato a frustração latente do mais velho. Todavia, não há sustentação para esses apontamentos, que perdem potência tão logo surgem, efeito responsável por minar o conjunto. A insatisfação do vizinho com o barulho da festa gera um clímax catártico, de potencial igualmente debilitado pela forma como é apresentado. Os parisienses não se fazem de rogados, quebram o sossego do lugar com luzes e caixas de som, demonstrando desdém diante dos locais. O resultado é a ação bruta, pura e simples, isso num filme resignado a apontar causas e efeitos vagamente, sem um real esquadrinhamento.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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