Crítica
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Sinopse
A mulher é invisível no samba? Invisível, porém imprescindível. O que mantem uma estrutura de pé quase sempre é invisível. É preciso dar à luz o samba que nos desfiles de carnaval foi preterido em detrimento da plástica, da estética de um produto oferecido ao mundo que não necessariamente espelha a realidade. Aqui, na origem, a mulher surge nos segmentos sustentando as instituições mantenedoras das “raízes”, ainda que o ambiente permaneça sequelado de machismo, elas conduzem alas de compositores, tocam firme na bateria, têm sucesso como carnavalescas; estão à frente de projetos de preservação do patrimônio imaterial das suas agremiações. Muitas estão inseridas em rodas de samba, atualmente o nicho onde o samba de raiz mais se expõe.
Crítica
A ideia é razoavelmente simples: a diretora Rozzi Brasil publicou numa rede social um anúncio simples, que pedia, basicamente, que mulheres, garotas e senhoras interessadas em samba se manifestassem. A intenção? Formar um grupo afetivo, de troca de ideias, histórias e vivências. Que servisse também como apoio colaborativo, possibilidades de partilha e surgimento de parcerias. Ou seja, uma bela e animada roda de samba, assumidamente feminina. Então, #Procuram-se_Mulheres (assim mesmo, com hashtag e sublinhado) é um documentário no qual a realizadora proporciona espaço para que elas, tradicionalmente eclipsadas, ganhem um tão merecido espaço. E o resultado é envolvente, mesmo àqueles estranhos a esse universo.
Rozzi Brasil foi autora do blog “O Cinema é a Minha Praia” e é parte ativa do projeto social Por Telas, desenvolvido pela escola de samba Portela no Rio de Janeiro. Estas duas paixões, cinema e samba, a motivaram a tocar adiante #Procuram-se_Mulheres. Por Telas foi o primeiro curso audiovisual dentro de uma escola de samba no Brasil. E os resultados começam agora a aparecer. Assim como o trabalho de Rozzi, outros dois documentários foram feitos por alunos: Pés e Pescoço Ocupados, de Ruan Lucena, e Um Craque Esquecido, de Ygor Lioli. São iniciativas como essa que permitem aos membros das próprias comunidades falar de suas realidades, sem esperar pelo olhar privilegiado de elementos externos. O que se vê no filme é justamente pessoas falando de si e sobre si, independentes da análise de quem as observa no lado de cá da tela. A naturalidade e a liberdade de expressão de uma condição como essa fazem toda a diferença.
Tudo começou a partir da vontade de se registrar a presença feminina no samba. E quem são essas mulheres, portanto? São aquelas que estiveram não apenas ao lado dos grandes sambistas, musas inspiradoras que resultaram em canções que ressoam nas festas e provocam as lágrimas de milhares de foliões e apaixonados por todo o país e exterior. Rozzi deixa claro que seu esforço não está em eternizar essa imagem romântica. O que busca são as artistas, as criadoras, as que batalham dia e noite em suas vidas ordinárias, mas que, mesmo assim, encontram tempo para ir além dos limites impostos – por elas e pelos outros – para se revelarem. Mais alegres, mais inspiradas, mais sonhadoras. Mais vivas, afinal.
#Procuram-se_Mulheres é um exercício, acima de tudo. Não é um documentário que irá mudar a vida de ninguém – mas, por outro lado, revela possuir uma função ainda mais importante ao registrar histórias de quem já mudou bastante. Ao deixar de lado a ambição de ser perfeito, o conjunto assume uma simplicidade libertadora. Mulheres que compõem, que cantam, que enfrentam preconceito e desconfiança. Que eram invisíveis e agora estão ocupando lugar central. Mesmo que seja nessa obra singela, porém longe de ser menor. Que seja uma semente, e vá além. Tanto a diretora quanto as suas personagens merecem mais.
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