Professor Marston e as Mulheres-Maravilhas
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Angela Robinson
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Professor Marston and the Wonder Women
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2017
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EUA
Crítica
Leitores
Sinopse
Wiliam Marston, psicólogo de Harvard, leva uma vida não convencional. Ela ajudou a tornar real o Detector de Mentiras e também criou a Mulher-Maravilha, personagem dos quadrinhos, em 1941. Marston mantinha uma relação polígama envolvendo sua esposa, Elizabeth Marston, psicóloga e inventora, e Olive Byrne, uma ex-aluna que virou acadêmica. Essa relação e os ideais feministas das duas mulheres foram essenciais para a criação da personagem.
Crítica
William Moulton Marston pode não ser um nome muito conhecido do público em geral, mas duas de suas criações são bastante famosas. A primeira é o detector de mentiras, o polígrafo. A segunda, ainda mais pop, é a heroína dos quadrinhos Mulher-Maravilha. Pois o filme dirigido e escrito por Angela Robinson trata não apenas do processo de suas invenções como traça um paralelo entre a vida pessoal do psicólogo e escritor e sua relação poligâmica como combustível para o seu processo criativo. O grande trunfo de Professor Marston e as Mulheres-Maravilhas é entender que não foi ele sozinho quem realizou suas façanhas, por isso, as vozes de suas duas parceiras também são reconhecidas como protagonistas dessa história. Por outro lado, fica uma nítida sensação de que a vontade suprema era abocanhar público com o sucesso de bilheteria da versão live action, é claro, de Diana Prince, lançada meses antes.
O recorte escolhido pela diretora e roteirista começa na vida acadêmica de Marston (Luke Evans) ao lado da esposa, Elizabeth (Rebecca Hall), uma cientista tão brilhante quanto o marido, mas que não tem seu talento reconhecido pelo fato “de ter uma vagina”, como a própria faz questão de frisar. Eles conhecem a estudante Olive Byrne (Bella Heathcote), que logo se oferece para ser assistente na pesquisa do casal. Entre testes de eficácia do polígrafo e a crescente atração sexual latente, a relação entre os três começa a tomar outras formas, com Marston vendo na esposa uma mulher dominadora, enquanto a jovem loira de olhos claros se comporta de forma submissa. Uma união que ele chama de “mulher perfeita” e que, mais tarde, se tornaria a inspiração para formar a heroína da DC Comics.
Robinson, diretora já acostumada com séries como The L Word e Hung (das quais foi produtora executiva), que tratavam, respectivamente, de homossexualidade feminina e prostituição masculina, aproveita essa experiência para não ajuizar outro tema polêmico em mãos. Em nenhum momento a roteirista julga o casal formado por aquelas três pessoas. O máximo que ela faz é contextualizar a época em que isso ocorre (que vai do final dos anos 20 até 1947) e, claro, como a tradicional família “de bem” olha com escárnio esse tipo de “depravação”. Porém, o interesse da diretora não é panfletário, no que diz respeito à sexualidade alheia e suas diversas formas, mas, sim, na direção de como aquela relação amorosa transformou a Mulher-Maravilha no que ela é hoje.
Não que seja um feito tão bem apurado. Ao mesclar a narrativa linear da história do casal com o depoimento de Marston ao órgão de censura da época (em que ele foi acusado de criar histórias para Diana Prince com fortes teores homossexuais de sadomasoquismo), a todo o momento parece que a diretora quer fazer links da vida pessoal do psicólogo com as características que formam a personagem. Não que realmente não existam, afinal, foi de suas amadas que ele tirou suas ideias. Inclusive o físico parece ter sido inspirado em Byrne, sobrinha de Margaret Sander, famosa feminista da época. Não à toa o laço da verdade acabar relacionado com a invenção do polígrafo, as práticas fetichistas de bondage estarem nos quadrinhos da heroína (ainda que de forma subliminar) e o fato do próprio Marston ser um feminista influenciar no empoderamento da personagem. Porém, algumas cenas (especialmente a que envolvem o avião invisível) acabam forçando um pouco a barra nesse sentido.
Neste contexto, mais interessante é a Teoria DISC discutida pelo psicólogo, com os princípios de Dominância, Influência, Estabilidade e Conformidade para analisar o comportamento do ser humano, o que se aplica totalmente e seu relacionamento com a esposa e a amante (se assim Byrne pode ser chamada). Percebe-se totalmente a importância da influência dessas duas personagens incríveis, ainda mais que elas são defendidas por belas atuações. Se Bella Heathcote derruba qualquer análise superficial de sua beleza quando solta o belo timbre de voz com a segurança ainda que ingênua de sua Olive, Rebecca Hall, uma atriz tão competente quanto geralmente subestimada, traz uma força incontrolável à personalidade de Elizabeth. Luke Evans não fica atrás, ainda que seu personagem acabe servindo muitas vezes de escada para as duas mulheres. Uma ótima inversão de papéis ao que geralmente costumamos assistir em cinebiografias em que a esposa é que serve nesse papel para a ascensão do protagonista.
O que causa um pouco de frustração na experiência de Professor Marston e as Mulheres-Maravilhas, além da maquiagem que nunca envelhece seus personagens (mesmo que se passem duas décadas de sua história), é a falta de ousadia em retratar esse relacionamento tão complexo e polêmico, assim como a perda de foco. Se o espectador espera que o filme seja somente sobre a criação da Mulher-Maravilha, pode até sair um pouco frustrado, pois a personagem só toma forma de verdade quanto quase dois terços do filme já se passaram. Há também alguns clichês em diálogos que enfraquecem o roteiro, especialmente quando o longa vai se aproximando no fim até uma fatídica cena em seus minutos finais. No entanto, ainda que um pouco quadrada e cheia de falhas (parece ter sido feito às pressas para pegar o público interessado no filme solo da heroína), a produção serve como porta de entrada para a curiosa história por trás dos bastidores. Com tanta polêmica em mãos, a vontade que fica é saber mais sobre como tudo se passou. Se o filme não satisfaz por completa esta curiosidade, bibliografia é o que não falta por aí. Porém, se melhor produzido, o filme se tornaria um belo candidato a premiações do ano. Era só lapidar. Talvez tenha faltado um pouco mais da verdade, acima de tudo.
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Grade crítica
Crítico | Nota |
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Matheus Bonez | 6 |
Robledo Milani | 5 |
MÉDIA | 5.5 |
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