float(43) float(12) float(3.6)

Crítica


4

Leitores


12 votos 7.2

Onde Assistir

Sinopse

O professor James começa a notar que um de seus alunos vira constantemente alvo de provocações. Tentando resolver a questão, ele se depara com violências bem mais complicadas do que supunha.

Crítica

O viés moralista prevalece em Professor. O protagonista é James (David Dastmalchian), docente que na infância passou maus bocados nas mãos dos valentões. No presente, lecionando em sua classe de inglês, ele instiga os alunos a debater a natureza do usurário Shylock, um dos personagens mais importantes da peça O Mercador de Veneza, de William Shakespeare. Bondade, maldade e, principalmente, a leitura de quem, de fato, é a vítima daquela trama secular estabelecem uma dinâmica sublinhada pelo cineasta Adam Dick, cuja mão pesada também se faz notar em outros momentos. Exemplo crasso disto, a necessidade de ressaltar que os estudiosos usam óculos e possuem dificuldade de socializar. O problema não é exatamente a existência do lugar-comum, mas a utilização ao ponto de banalizar certos contornos da personalidade dos envolvidos. Ao invés de investigar com minúcia as fraturas emocionais do sujeito identificado com os alunos encurralados por colegas decididos a tripudiar sobre as adversidades alheias, o filme prefere pegar caminhos facilitadores.

À medida que apresenta tormentas atravessando James, a começar pelo divórcio desgastante, o realizador costura a aproximação entre Preston (Matthew Garry) e Daniela (Esme Perez), reiterando a noção de que os semelhantes se atraem. A timidez dele logo se encaixa com a dela e ambos constroem um vínculo. Mas há um vilão em cena, tipificado e desenvolvido como tal. Tim (Curtis Edward Jackson) é o rapaz abastado, filho de um figurão da cidade, criado vendo seu dinheiro acobertando falhas e crimes. Professor induz o espectador a não criar empatia por esse personagem que beira o caricatural, agressivo diante dos desvalidos e capaz de dissimulações absolutamente reprováveis. Ele nos é apresentado mentido, manipulando e espezinhando. Portanto, o desenho desse antagonismo tão marcados não combina com o ensaio de reflexão que aponta à inexistência de uma fronteira inquestionável entre certo e errado. É como se, não dispondo das ferramentas, ou de competência, necessárias para sustentar esse debate inquietante, ao cineasta restasse sabotar-se.

Marcado por traumas da meninice, James se encontra suspenso pela dor da separação. Todavia, Professor não consegue estabelecer um elo entre essas duas coisas, amalgamando-as somente para criar um cenário de pressão prestes a explodir. Quando a agressividade começa a guiar algumas das condutas, fica difícil saber se a resposta é por conta do acumulo ou estritamente do espelhamento. Em vários instantes de cólera, ele fala com mágoas dos privilégios do adolescente, fazendo menção à sua condição financeira para lá de confortável. Embora noutro episódio de desabafo expanda sua tese sobre o mundo supostamente incapaz de castigar os que distribuem sofrimento a partir do pedestal protegido da lei implacável aos demais, ele não é caracterizado por uma consciência de classe perceptível ou luminar. Embora seja fácil aderir aos personagens, inclusive pela inclinação simplista do roteiro a frequentemente cindir o mundo escolar simplesmente em dois, é árdua a missão de compreender o quê filme deseja. No fim das contas, prevalece o mero “as aparências enganam”.

Ora Professor se detém no bullying, reafirmando a crueldade de uns e a fragilidade de outros, nesse ínterim distanciando James dos primeiros e o aproximando dos segundos. Ora ilumina mais o protagonista, pretensamente conferindo tempo e terreno para nos aproximarmos dele a fim de entender até atitudes reprováveis. O Mercador de Veneza entra a fórceps, como uma muleta erudita para dirimir equilibrar as fragilidades do conjunto. É lamentável que também se passe displicentemente por questões urgentes, tais como a xenofobia que quase resulta em tragédia. O longa acaba sendo um acúmulo de intenções prontamente abortadas. Ao invés de aumentar as áreas cinzentas, de explorar personalidades, ações e reações de maneira menos frontal, o cineasta prefere o caminho oposto, esclarecendo quais papeis cada um desempenha, mas contradizendo essa clareza aos 45 do segundo tempo. Adam Dick tira do nada uma dinâmica tola para arrematar a sua lição de moral que pouco sinaliza uma vontade de compreender a complexidade dos contextos.

As duas abas seguintes alteram o conteúdo abaixo.
avatar
Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *