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Sinopse

O melhor assassino do mundo está ficando velho e menos confiável. Por isso, seus chefes decidem criar um clone mais novo e mais forte dele próprio, que terá como primeira tarefa justamente exterminá-lo. A partir de agora, o veterano mercenário será caçado por uma inteligência tão primorosa quanto a sua.

Crítica

Quem diria que veríamos o dia em que Will Smith ficaria devendo a Jean-Claude Van Damme? Sim, pois não se engane: o diretor pode ter dois Oscars na estante de casa e os efeitos especiais serem alardeados como de última geração, mas esse Projeto Gemini nada mais é do que uma releitura – bastante rasteira, aliás – de Duplo Impacto (1991), um dos maiores sucessos do astro belga. Tudo bem que antes eram irmãos gêmeos, e agora se tratam de clones, mas essa não chega a ser uma diferença tão grande. Afinal, o esquema básico é exatamente o mesmo: primeiro estranhos, começam se enfrentando, para logo em seguida se darem conta de que estão no mesmo lado da ação e unirem forças. Lembra a trama de outro título recente – Batman vs Superman: A Origem da Justiça (2016) – que também seguia os mesmos preceitos. A dúvida, portanto, é: no meio de toda essa mistura, há algo de novo que justifique a atenção? De forma alguma.

Pra começar, o próprio argumento do clone desconhecido não é novo – o Homem-Aranha vive com essa dor de cabeça nos quadrinhos há anos, um dos capítulos de Star Warsleva esse conflito até no nome (Star Wars: Episódio II – Ataque dos Clones, 2002), e essa questão está no cerne dos acontecimentos de longas diversos, da aventura Logan (2017) ao melodramático Não Me Abandone Jamais (2010), passando por clássicos do gênero, como Blade Runner: O Caçador de Andróides (1982) a Alien: A Ressurreição (1997), entre tantos outros. Ou seja, a partir do momento em que é tomada a decisão de voltar a esse universo, seria bom se garantir em trazer algo de novo para agregar à discussão. E apesar dos que os trailers e toda a campanha de marketing tenha tentado vender, o que Ang Lee tenta com Projeto Gemini é levantar uma discussão mais filosófica e menos física. Ou seja, está mais para Razão e Sensibilidade (1995) e menos para Hulk (2003). Se é que isso é possível dentro do contexto proposto.

Se não, vejamos. Henry Brogan é um assassino profissional. Mas não um qualquer: o melhor do ramo, como todos ao seu redor não se cansam de repetir. Ele pode matar cientistas e eliminar inimigos à queima roupa, mas como tem o rosto de Will Smith, que mesmo quando interpreta um bandido faz isso da maneira mais simpática possível (Esquadrão Suicida, 2016), rapidamente o personagem traz à tona uma crise de consciência, que o leva a manifestar o desejo de se aposentar. Seus chefes, no entanto, não aceitam as boas novas com tranquilidade, e para evitar maiores dores de cabeça, decidem eliminá-lo – que fique claro que em nenhum momento é dito o porquê de o quererem morto, além de uma simples contrariedade aos seus anseios e frases soltas, como “ele pode saber demais”. Só que, como já foi dito, igual a ele não existe. Quer dizer, até tem, sim. Mas é mais do que parecido. É o próprio. Um clone, que compartilha o mesmo DNA, uma encomenda programada 25 anos (precaução é tudo por aqui, pelo jeito) antes, é enviada ao seu encalço, tendo como única missão assassiná-lo.

Acontece que, assim que se encontram, Henry percebe de imediato que há algo de errado. Júnior – sua versão mais jovem – é um pouco mais lento, mas também será confrontado com a novidade. Eles até partem para o confronto – em apenas duas sequências, uma perseguição de motocicletas com efeitos tão artificiais que evocam lembranças dos albinos de Matrix Reloaded (2003), e outra à noite, enclausurados em catacumbas nos subterrâneos de Budapeste, deixando o espectador tão confuso que pouco importa, no final, quem está de fato lutando contra quem – mas logo se dão conta de que, tendo tanto em comum, melhor é partirem para a conversa. Um questiona a própria mortalidade, o outro duvida de sua existência. Perguntam a si mesmos sobre seus propósitos, e como podem fazer a vida do outro melhor – um corrigindo os erros que cometeu, o outro procurando aprender com aquele mais experiente. Parecia que seria apenas tiro, porrada e bomba, mas, na verdade, o que vemos é uma velha – e bastante desgastada – reunião familiar.

É difícil reconhecer o diretor do sensível O Segredo de Brokeback Mountain (2005) ou do mágico As Aventuras de Pi (2012) em Projeto Gemini. Esse é um filme mais dos seus produtores – entre eles, Jerry Bruckheimer, da saga Piratas do Caribe – e dos roteiristas David Benioff (X-Men Origens: Wolverine, 2009), Billy Ray (Jogos Vorazes, 2012) e Darren Lemke (Shazam, 2019). Mas, acima de tudo, é reflexo da imagem acomodada que Will Smith há tempos tem se concentrado em difundir entre fãs e admiradores. Poderia ser mais um capítulo da saga Missão: Impossível – e, por alguns momentos, chega a tangenciar as peripécias de Tom Cruise – mas é tudo tão milimetricamente calculado, que até mesmo essa autenticidade programada se perde. Entre vilões maniqueístas e erros de continuidade, as reviravoltas vão se acumulando sem muito sentido, atrás apenas de emoções baratas que logo se evaporam. O material reunido apontava para um caminho tortuoso. Ao ser tratado com tamanha displicência, a tragédia era mais do que anunciada. E é exatamente o que acontece, sem espaço para qualquer originalidade, navegando quase que exclusivamente no âmbito da cópia e da reciclagem. Tanto na ficção como resultado de todos esses (parcos) esforços.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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