Sinopse
Depois que seu mentor morre, o professor de filosofia Marcelo parece a escolha mais óbvia para ocupar o posto deixado vago na universidade pública. No entanto, ele não contava com o retorno à Argentina do carismático e brilhante Rafael, outro candidato à cátedra acadêmica.
Crítica
Tudo começa com uma morte simples e banal. Um sujeito está fazendo a sua corrida rotineira no parque, passa mal e inesperadamente deixa de existir. De uma hora para outra, o emérito professor da Universidade de Buenos Aires se transforma em lembrança, quando muito no legado que pode ser perpetuado ou ainda repensado por seus aprendizes. Começar o filme com a constatação de que a vida é frágil e a morte capaz de ressignificar cenários é uma forma bem inteligente de propor a filosofia como motor da reflexão. No entanto, o protagonista de Puan é Marcelo (Marcelo Subiotto), substituto natural do falecido, o primeiro da linha sucessória da cátedra acadêmica da UBA. Ele se preparou para esse momento durante toda a sua vida, seguindo os ensinamentos do mestre, mas é incapaz de falar um par de palavras na homenagem póstuma que prestam ao morto. Ao contrário do rival inesperado, o carismático Rafael (Leonardo Sbaraglia), filósofo igualmente gabaritado para ascender ao lugar de destaque da instituição, mas um sujeito cativante, bonito e que destoa do lugar-comum dos intelectuais ensimesmados. Seria muito fácil, a partir dessa oposição, ficar reiterando um antagonismo simplório – de um lado, o herdeiro natural, o esforçado brilhante sem tato social, do outro, o oportunista “forasteiro” que galga degraus com a ajuda de seu carisma. No entanto, não é isso o que acontece nessa comédia.
Mesmo que o espectador seja convidado a enxergar as coisas pela ótica de Marcelo, em nenhum momento o filme expõe Rafael como um vilão sem conteúdo (o que facilitaria as coisas ao protagonista). A dupla de cineastas formada por María Alché e Benjamín Naishtat parece realmente mais interessada em sublinhar os pequenos aspectos ridículos da condição humana, às vezes por meio da ganância e da rivalidade, mas sem perder de vista a ternura. Por exemplo, Marcelo é quase um palhaço triste, homem brilhante com certas doses de melancolia e uma ambição acadêmica que tem a ver com construções sociais. Talvez a real vocação desse homem seja levar a filosofia para fora dos quadros acadêmicos, como quando o vemos ensinando essa prática do livre pensar e do questionamento em dois cenários extremos: na residência da idosa rica que enxerga a filosofia como capricho que o dinheiro pode proporcionar e na periferia em que, por protocolo, é escoltado por um policial para evitar episódios de violência. No entanto, os cineastas não estão dispostos a ceder às tentações reducionistas dos rótulos, haja vista a relativização da futilidade da contratante milionária (que soa realmente interessada na matéria) e ao quebrar qualquer expectativa quanto à falta de curiosidade periférica na filosofia. O grande mérito de Puan é justamente utilizar os relativismos em prol de uma visão menos determinista.
Outro ponto importante a ser destacado em Puan é o desenho da moldura social que envolve os personagens. Marcelo é casado com uma mulher que aparece na televisão rebatendo o discurso conformista da apresentadora de inclinação conservadora. Enquanto isso, a universidade está envolta num clima de efervescência política. Especialmente depois da segunda metade dos anos 1990, a Argentina se notabilizou cinematograficamente por filmes em que as crises sociais e econômicas estavam presentes em seus respectivos tecidos narrativos. Seria exagerado dizer que a produção dirigida por María Alché e Benjamín Naishtat é, na essência, uma obra de cunho político? Possivelmente não. Porque, além das revoltas estudantis, trabalhistas e do corpo docente (situações inseridas pontualmente na trama), o próprio Marcelo é fundamentalmente encarado como membro pensante desse proletariado em constante batalha contra os poderes opressores. Isso fica claro pela necessidade de acumular funções (atividades na universidade, aulas particulares e dentro de programas socioeducacionais no subúrbio) a fim de manter o sustento de sua residência. Tendo isso em vista, María e Benjamín conseguem uma proeza: quebrar a dupla sisudez prontamente atrelada à política e à filosofia para fazer um filme de teor agridoce que dá conta de entreter e propor alguns questionamentos relevantes. Não é pouco.
Não há lugares para mocinhos e bandidos em Puan, tampouco para verdades imutáveis. Ainda que faltem pequenos ajustes na comunicação das diferentes camadas do protagonista (íntima, social, acadêmica, familiar, etc.), o filme injeta certos princípios da filosofia na construção narrativa, sendo um deles o questionamento constante a respeito do que tomamos por verdade. Ainda que sejamos convidados a nos engajar às demandas de Marcelo, esse protagonista adorável justamente por conta da exposição certeira de suas fragilidades demasiadamente humanas, nada sustenta que seu antagonista, o solar e cativante Rafael, não seja um candidato tão qualificado ou ainda melhor para ocupar da cátedra da Universidade de Buenos Aires. María Alché e Benjamín Naishtat arquitetam determinadas expectativas e não necessariamente as contemplam seguindo o senso comum, fazendo desse jogo instigante uma forma de relativizar as coisas. E um exemplo disso está na sequência banal que mostra Marcelo chegando em casa, com a cabeça cheia de questionamentos e problemas, se deparando com um monte de gente e crianças bagunçando o seu quarto. É de se esperar que em algum momento ele exploda e/ou, ao menos, demonstre insatisfação com o cenário. Mas, não. O protagonista se limita ao seu papel de coadjuvante naquela situação e ainda extrai graça da presença dos pequenos arruaceiros.
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filosofia é fazer perguntas. por que o filme tem nome de uma estação de metrô? o que significa o nome puan? qual origem? pq ler não apenas de cabeça para baixo mas com a cabeça enfiada numa cadeira sem base? como se fosse o fundo da terra, um avestruz? pq o tango? pq fica difícil aceitar julgamentos? pq o filho de Pena rouba a cena? pq Pena chama-se Pena? pq ele dá pena? hoje já é amanhã e preciso dormir. senão continuaria a perguntar.