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Sinopse

Otimista por natureza, Amber tenta conciliar trabalho, vida cotidiana e alguns segredos. Sempre com um sorriso no rosto, ela espera estudar na prestigiada Carnegie Mellon. Amber terá se ser corajosa para vencer os obstáculos.

Crítica

Amber (Auli'i Cravalho) é uma jovem dedicada como poucas. Trabalha num asilo confortando os idosos que por lá moram, levando-lhes iguarias e sorrisos; move montanhas para que a escola onde estuda seja um lugar melhor; faz um segundo turno na loja de rosquinhas e encoraja o dono a completar a sua formação colegial; e ainda dá força para alguém sair de um relacionamento abusivo. Aspectos de personalidade obviamente positivos. Lamentável é a mão pesada do diretor Bett Haley ao apresentar tudo isso como meros pilares de uma tese segundo a qual a protagonista não merece os problemas que vem enfrentando ultimamente. Para arrematar essa fatura que aponta à injustiça insistentemente reiterada, a adolescente precisa dormir no ônibus dirigido profissionalmente por sua mãe, uma vez que a ambas a única alternativa a isso é morar com um sujeito violento. Quase uma Rockstar vai organizando suas engrenagens sem vergonha de colocar tudo muito bem explicitado e óbvio. A batalhadora tem poucos pontos fracos e apenas deixa eles evidentes ao ser vítima de uma dor lancinante que, vejam, surge como uma edificante tempestade que precede a bem-vinda bonança.

Quase uma Rock Star passa longe de observar de modo consistente as dificuldades de Amber. Para o realizador basta sinalizar que ela consegue tomar banho na casa de repouso onde desenvolve uma amizade importante com uma senhora ranzinza, por exemplo, para que um dos tantos percalços da condição de sem-teto seja pretensamente resolvido. Mas, o grande calcanhar de Aquiles do filme é justamente o roteiro esquemático, contemplado pela direção. E há elementos dispostos levianamente, como a configuração da turma de melhores amigos. Esta parece que apenas visa demonstrar uma suposta ciência da responsabilidade quanto à diversidade na representação. Amber (de ascendência oriental) tem como parceiros um adolescente negro, um cadeirante, outro com deficiência intelectual e uma menina descolada, mas daquelas que tende ao sarcasmo e ao estilo por conta de sua sinceridade peculiar. Nenhum desses personagens, a não ser o menino que vem a ser o interesse romântico, tem qualquer espaço maior para justificar a sua presença em cena.

Dentro desse esqueleto  claro – que torna o filme absolutamente previsível –, há o poema predileto da mãe, cujo tema é a necessidade de ter esperança, sobretudo nos momentos ruins, e a música composta pelo falecido pai, que defende ser essencial o lar (metafórico e literal). Ora, é muito acintoso tudo isso, levando em consideração que justamente estamos diante da protagonista levada à descrença na possibilidade de finais felizes e que (o mais escancarado) não tem uma casa para chamar de sua. Quase uma Rock Star também apresenta conveniências difíceis de engolir, num itinerário que prevê reviravoltas acontecendo exatamente quando se precisa delas e reações típicas, tais como desapontar aliados diante de uma encruzilhada. A mansão aparece à disposição como retiro idílico tão logo se faça urgente isolar-se para praticar um talento a ser brevemente posto à prova e (o mais desengonçado nesse sentido) o animalzinho adoece gravemente na véspera de um evento que pode mudar drasticamente o futuro da menina. O acúmulo disso é gritante e nada sutil.

Como ponto positivo de Quase uma Rock Star (forçando um pouco a interpretação), a observação de como o dinheiro faz diferença. Se houvesse uma dinâmica de merecimento celestial, ou algo que o valha, Amber certamente estaria entre as primeiras da fila rumo ao sucesso. Porém, como bem sabemos, a vida é bem mais difícil quando não se tem grana suficiente para colocar planos em prática e explorar talentos. Pena que Brett Halley esteja mesmo interessado nos lugares-comuns próprios às tramas motivacionais, perseverando em aliviar as discussões contidas nas circunstâncias para sublinhar o valor da amizade e as formas de altruísmo sendo recompensadas. Ou seja, as leituras socioeconômica e humana acabam soterradas por uma pegada piegas que privilegia a lição de que aos bons está reservado o reino da felicidade. De certa maneira, se trata de um conto de fadas moderno, no qual a vida (e suas contingências) parece ora como a madrasta malvada que tende a tratar “Cinderelas” com desdém, ora como a mãe afetuosa disposta garantir que tudo acabe bem.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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