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Crítica


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Sinopse

Católicos fervorosos, Claude e Marie não estão necessariamente contentes pelo fato de três de suas quatro filhas terem se casado com homens de outras religiões. Sua esperança é a filha caçula.

Crítica

Um dos maiores sucessos recentes do cinema francês – levou mais de 12 milhões de espectadores aos cinemas no seu país de origem – busca sua graça em um grave e atual problema enfrentado pela sociedade local – a imigração desenfreada. Que mal eu fiz a Deus?, no entanto, não está interessado em debater teorias ou em listar exemplos de como as coisas pode ter fugido ao controle do governo e dos cidadãos. Pelo contrário, aponta para o quão contemporânea essa questão é e até que ponto ela já está inserida em nossas rotinas, sejamos franceses, europeus ou de qualquer canto do mundo. A globalização é fato, e melhor do que nos injuriarmos com ela é acharmos motivos para rir daqueles que ainda se debatem contra o inevitável.

Claude (Christian Clavier, que viveu o herói dos quadrinhos em Astérix e Obélix contra César, 1999) e Marie Verneuil (Chantal Lauby, de A Gaiola Dourada, 2013) formam um casal igual a tantos outros: de classe média e aposentados, retiram-se a maior parte do tempo na grande casa que possuem no campo. Como sonho, mantém a esperança que cada uma de suas quatro filhas tenham um bom casamento e formem, elas próprias, suas felizes famílias. Católicos tradicionalistas, vão acumulando frustrações quando uma delas decide se casar com um árabe, a outra com um judeu e a terceira com um rapaz oriental. Resta a esperança de que a caçula siga os parâmetros por eles mesmos traçados e encontre um jovem branco de boa família cristã como par. Porém, se a situação com as garotas mais velhas já era complicada, o desconforto fica ainda maior quando descobrem que a mais nova escolhe um moço africano como namorado.

Seria muito fácil imaginar Que mal eu fiz a Deus? como uma comédia escrachada reduzida à óbvios estereótipos. Se fosse uma produção brasileira ou de Hollywood, por exemplo, dificilmente se obteria mais do que isso. No entanto estamos falando de um longa europeu – francês, acima de tudo – e aí está sua grande diferença. Há risos, sim, e uma que outra piada mais rasa. Mas há também um subtexto por trás de tudo isso. E há bons exemplos a esse respeito durante o seu desenvolvimento. Como o primeiro jantar com os três genros originais, em que estes ocupam-se mais em atacar a si mesmos, a ponto do velho preconceito tradicional ficar de lado e nem mais ter importância. Ou quando o pai do rapaz negro se revela ainda mais racista do que os próprios protagonistas, deixando claro que o conflito não se reduz a uma mera questão de crença religiosa ou cor de pele. São as origens, de onde viemos, que falam tão alto que muitas vezes nem conseguimos ouvir a voz da razão, por mais evidente que esta esteja estampada diante os nossos olhos.

Indicado ao Goya – o Oscar espanhol – como Melhor Filme Europeu e premiado no Troféu Lumiere como Melhor Roteiro, Que mal eu fiz a Deus? vai, amparado pelo bom elenco – em especial pelo casal de protagonistas – e pela condução segura do diretor e roteirista Philippe de Chauveron (em seu primeiro longa de destaque internacional) lentamente descontruindo cada uma das ideias pré-concebidas que o espectador possa ter em relação a sua história. Não evita-se nem ignora-se os clichês, mas assume-se os mesmos para invertê-los e empregá-los a favor da narrativa. Com isso, ganha a audiência, que é surpreendida em suas convicções, e o realizador, que entrega um longa bem humorado e fácil de ser assimilado, ao qual assiste-se com crescente interesse e grande torcida por um desfecho que consiga amarrar suas pontas e ainda oferecer algo a mais. Feito esse que, felizmente, é alcançado com exemplar demonstração de criatividade e competência.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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