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Crítica

Tive um professor que dizia a história do mundo se tratar, no fundo, da história das mulheres. Elas são todas Helenas, dizia ele, referindo-se àquela que iniciou a guerra de Tróia. Ao contar a trajetória da exploradora, escritora, arqueóloga, militante política e mil-outras-ocupações-à-frente-do-seu-tempo Gertrude Bell (Nicole Kidman), Queen of the Desert reitera o protagonismo feminino no desenvolvimento da história ao colocá-la como peça fundamental para a reorganização do espaço no Oriente Médio após a divisão do Império Otomano. 

Escrito e dirigido pelo alemão Werner Herzog, Queen of the Desert é um épico construído sobre a estrutura clássica, conservando os vícios e as virtudes da linguagem. A escolha leva à tela um dos poucos filmes do gênero no estilo de A Ponte do Rio Kwai (1957), Lawrence da Arábia (1962) e Passagem para a Índia (1984), dirigidos pelo inglês David Lean, a ser encabeçado por uma mulher.

Apesar da posição central no cenário político da época, a Gertrude de Herzog exige pouco da técnica de Kidman, muito devido à rígida estrutura do longa, que alterna momentos dramáticos (três ou quatro sequências de diálogo que dão ao enredo corpo no tempo e espaço) e as deslumbrantes paisagens do Oriente. São nos momentos mais visuais que o diretor parece mais à vontade. Ao investir em planos aéreos e abertos, a fotografia de Peter Zetlinger, tradicional parceiro do diretor, consegue contrabalançar o risco da aventura de Bell com a beleza das imagens.

A viagem para dentro de si – como a própria Bell descreve pateticamente o seu percurso – tem início quando a protagonista perde o secretário da embaixada inglesa Henry Cadogan (James Franco), homem que descreve como a paixão de sua vida. A partir de então, Gertrude conquistará involuntariamente todos os homens que passarem pelo seu caminho, entre eles o jovem T. E. Lawrence, inusitadamente interpretado por Robert Pattinson.

Para o enredo, a sede por aventura e o compromisso em compreender o orientalismo, algo que o filme faz questão de destacar no desfecho, são secundários. Ainda melhor assim. Ao preservar o contexto da época, Herzog conserva a singularidade do espírito de Bell e não a transforma em arma política para a histeria do importante debate contemporâneo sobre igualdade.

Os méritos de construir um dos melhores épicos dos últimos tempos não elimina a estrutura engessada do longa. A falta de profundidade com que a direção trabalha determinados passagens, apelando inclusive para letreiros, um modo preguiçoso de encaminhar a história, arrefece qualquer tensão, o que tornaria Queen of the Desert um filme acima da média.

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