Crítica
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Sinopse
Uma cidade solar e alegre como Recife pode guardar segredos insondáveis nos seus recantos históricos. Hermano volta à capital pernambucana para encontrar o irmão desaparecido em circunstâncias nebulosas.
Crítica
A volta do filho pródigo a Recife desvela uma série de mistérios. Hermano (Daniel Rocha) aceita pisar novamente em sua terra natal, da qual foi escorraçado pelo pai na adolescência, porque precisa encontrar o irmão caçula desaparecido. Recife Assombrado, então, além do elemento sobrenatural, busca extrair intensidade da relação familiar desgastada, dos infortúnios que separaram consanguíneos e alimentam uma mágoa aparentemente indelével. Dr. Antonio (Germano Haiut), o patriarca abastado, se restringe a resmungar e choramingar toda vez que o primogênito lhe demonstra asco. A falta de consistência dessa figura arrependida, resultado do pouco tempo de tela e da ausência de matizes na interpretação de Germano, acaba minando a potencialidade da interação acidentada. Pelo fato de ser imprescindível, a contenda doméstica, encenada de forma desajeitada, compromete o conjunto, deixando-o a mercê apenas do enigma a se resolver.
Recife Assombrado é um thriller com toques sobre-humanos. O sumiço de Vinicius (Pedro Malta) é a chave para o entendimento da circunstância insondável. O cineasta Adriano Portela aposta num desvelamento simplório das verdades ocultas. Cada pessoa acessada por Hermano adiciona uma peça nesse quebra-cabeça. O grande problema é exatamente o caráter expositivo dos diálogos, a carência de organicidade nas falas subordinadas desengonçadamente à revelação paulatina de uma dinâmica guardada a sete chaves. Quando diante dos empregados da transportadora do pai, o protagonista é municiado incessantemente de dicas que o levam à próxima etapa, mas isso não se dá de modo engenhoso, instigando o espectador. Justamente a fragilidade do roteiro e dos diálogos deixa exposta a estrutura seguida à risca. Antevê-se que o próximo interlocutor completará esquematicamente a lacuna deixada pelo antecessor e assim por diante. Até o fim.
Ainda que tente relacionar à trama com as singularidades do Recife, recorrentemente mencionando lugares e conjunturas relevantes, o realizador não dá conta de utilizar a História como capital em Recife Assombrado. Há terreno reduzido para apegar-se à missão de Hermano, igualmente às dos outros personagens. Isso se dá pela maneira acelerada com que as situações são apresentadas, desenvolvidas e resolvidas. Por conta disso, a dinâmica familiar fica bem comprometida, limitada ao que as pessoas falam, mas sem a espessura dramática para soar verossímil. O mesmo pode ser dito das demais relações. A revelação da natureza sobrenatural de Jair das Almas (Márcio Fecher) obedece à mesma lógica expositiva, com alguém encarregado grosseiramente de verbalizar tudo, sem espaço para nuances ou iluminações graduais. Num todo tão subserviente à palavra, são escassos os lastros à construção de uma atmosfera genuína de tensão, debilidade que lhe limita bastante.
Já a animação é uma ferramenta bem-sucedida em Recife Assombrado. Determinadas cenas, como o assassinato do comparsa, se beneficiam da junção entre as modalidades, com texturas se interconectando a fim de substanciar a esfera fabular. Uma pena que Adriano Portela não lance mão mais vezes desse dispositivo que consegue, ainda que tímida e apressadamente, estabelecer pontos de convergência entre o ordinário e o extraordinário. Quando resolve colocar os dois pés da seara do horror, o filme até consegue justificar a pouca atenção à densidade dos personagens, uma vez que lendas de entidades atravessando malignamente o tempo, bem como os contratos firmados com sangue, prescindem dessa corpulência e se resolvem relativamente bem assim. Todavia, como a maior parte do filme é uma busca entremeada pelo ódio ao pai, ou seja, a contenda doméstica domina cada movimento, sobrepesa consideravelmente a opacidade das pessoas e dos gestos.
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