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Sinopse

Depois que seu companheiro morre nas mãos da ditadura civil-militar brasileira, Denise é perseguida enquanto está grávida, acaba sendo presa, mas ainda consegue fugir para fora do país. Cerca de 40 anos depois, essas mulheres são ainda afetadas por um passado que não se pode apagar.

Crítica

Repare bem...”. A expressão é facilmente assimilada pelo idioma português. E se for em Portugal, parece fazer ainda mais sentido. No entanto, uma rápida reflexão a respeito incita ao questionamento: “repare” como “chamar atenção” ou com o significado de “conserte, arrume, melhore”? Pois ambos os casos se adaptam ao que a atriz e realizadora portuguesa Maria de Medeiros se dispõe a narrar com seu documentário Repare Bem, exibido dentro da mostra competitiva de longas-metragens estrangeiros no 41° Festival de Cinema de Gramado. O filme, aliás, é uma coprodução entre o Brasília, Espanha, França e Itália, e foi filmado nas cidades de São Paulo, Roma e Amsterdã. Apesar desse caráter globalizado se refletir pelos bastidores da realização, sua história é nitidamente nacional, e há muito o que ele tem a dizer ao público brasileiro contemporâneo.

Medeiros se apropria de um caso que veio à luz graças aos esforços da Comissão de Anistia e Reparação, promovida pelo Ministério dos Direitos Humanos, no Brasil. É reconstituída a trajetória de Eduardo Leite “Bacuri”, revolucionário militante contra a Ditadura Militar que foi assassinado em 1970 pelas mãos do exército brasileiro. Quem oferece emocionantes depoimentos são sua então companheira, Denise Crispim, e Eduarda Crispim Leite, a filha. A primeira fugiu do país ainda grávida, e desde então tem morado na Itália. A filha, por sua vez, atualmente mora na Holanda. Elas retornaram ao Brasil para receber esse pedido de perdão do Governo Nacional e o certificado de anistiado de Bacuri, que foi, ainda que postumamente, absolvido de todos os seus supostos crimes. Há, ainda, a participação da mãe de Denise – e avó de Eduarda – através de cartas e fotografias. Essa trinca de mulheres oferece um retrato rico e extremamente comovente de uma vida que parecia perdida no passado e que agora ganha um justo reconhecimento.

Mais reconhecida internacionalmente pelo papel que defendeu como namorada de Bruce Willis no clássico pop Pulp Fiction – Tempo de Violência (1994), de Quentin Tarantino, Maria de Medeiros é também uma realizadora de respeito, tendo sido premiada em diversos festivais com o drama histórico Capitães de Abril (2000), além de já ter participado dos documentários episódicos Bem-Vindo a São Paulo (2004) e Mundo Invisível (2012). Portanto, não se trata de nenhuma novata, nem como documentarista, muito menos como cineasta. Se por um lado o formato assumido em Repare Bem é por demais convencional – em alguns momentos nos remete mais a uma reportagem especial de televisão do que a um longa-metragem com ambições audiovisuais – é de se reconhecer o mérito da produção – e da realizadora, é claro – em obter declarações significativas de suas entrevistadas, além de saber dosar as ilustrações com imagens de pesquisa, registros históricos e ambientações do cotidiano atual destas personagens da História que não só sobreviveram ao passado como estão ainda hoje vivas e dispostas a não permitir que o que lhes aconteceu seja esquecido.

Repare Bem se apoia na força de sua história e na habilidade de Medeiros como condutora para transmitir ao espectador uma mensagem que ainda hoje repercute. Se o tema é caro ao público brasileiro, da mesma forma não o restringe diante plateias internacionais, pois situações de cerceamento de liberdade já foram registradas nas mais diversas localidades ao redor do globo. Mas, neste caso específico, há ainda o deleite do cinéfilo, que encontra paralelo na cultura da diretora, que consegue estabelecer um importante e revelador diálogo com o clássico Um Dia Muito Especial (1977), de Ettore Scola. A relação, que em nenhum momento soa despropositada, oferece um prazer estético ainda maior a este registro de denúncia tão importante e necessário.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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Robledo Milani
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Ailton Monteiro
7
MÉDIA
6.5

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