Crítica
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Boa parte dos filmes de Darren Aronofsky conta com personagens que mergulham de alguma forma em um processo de autodestruição. Depois de incluir isso logo em seu primeiro longa-metragem, Pi (1998), o diretor continuou nessa linha em Réquiem Para um Sonho, no qual mostrou os custos degradantes que o vício em drogas traz para as figuras centrais da história. É um daqueles filmes que são difíceis de digerir inicialmente, e isso é prova de sua força diante do espectador.
Baseado no livro de Hubert Shelby Jr., que escreveu o roteiro em parceria com o próprio Darren Aronofsky, Réquiem Para um Sonho se concentra em Sara Goldfarb (Ellen Burstyn), senhora solitária que passa a maior parte de seu tempo vendo o programa de Tappy Tibbons (Christopher McDonald) na TV, e no trio formado por seu filho Harry (Jared Leto), a namorada dele, Marion (Jennifer Connelly), e o amigo Tyrone (Marlon Wayans), todos viciados em heroína. Cada um desses personagens possui um sonho em especial, e esperam realizá-lo em breve. Enquanto Sara é convidada para participar do programa que tanto gosta, o que a leva a tomar pílulas para emagrecer na tentativa de entrar em um vestido perfeito para a ocasião, Harry, Marion e Ty tentam juntar dinheiro para investir em um negócio que resolva suas vidas. Mas o vício de cada um acaba os impedindo de seguir com seus planos da forma como gostariam.
Um detalhe curioso em Réquiem Para um Sonho é que enquanto Sara sabe que a heroína não traz nada de bom para o filho, ele diz o mesmo sobre as pílulas que ela passa a tomar, mas ambos não têm noção do estrago que estão fazendo com as próprias vidas ao se entregarem impulsivamente aos seus respectivos vícios. Aliás, não deixa de ser interessante perceber que cada uma dessas drogas resultam em tragédia, mostrando que não há muita diferença entre elas. E algo que fica claro é que estes tipos (assim como deve ser com várias pessoas na vida real) fazem uso dessas substâncias para fugir de realidades vazias e cheias de decepções. Algo que pode ser visto, por exemplo, na cena em que Harry imagina Marion transando com outro homem, esquecendo-se disso logo depois de injetar heroína na veia.
No entanto, os personagens até podem se sentir mais aliviados com as drogas, mas as consequências que elas trazem são realmente tristes de se acompanhar, sendo que eles se veem obrigados a desistir de coisas que inicialmente desejavam para si mesmos. Dessa forma, não é à toa que ouvimos a excepcional e melancólica trilha de Clint Mansell mesmo nas cenas em que Sara, Harry e os outros aparentam estar muito bem e com um sorriso no rosto, pois sabemos que o caminho percorrido por eles é destruidor e pode não ter volta.
Em algumas passagens em que os personagens estão sob o efeito das drogas, Darren Aronofsky é inteligente ao usar uma lente grande angular que deforma um pouco a imagem de maneira que entendamos mais ou menos como eles se sentem. O diretor também acerta em cheio ao criar um ambiente pesado, que beira um pesadelo e percorre toda a narrativa, contribuindo para que o filme tenha o impacto pretendido. Nesse quesito, o cineasta ainda tem a ajuda da excelente fotografia de seu colaborador habitual Matthew Libatique, que dá um tom cru às imagens vistas na tela, algo que inclusive havia feito muito bem em Pi. E a montagem de Jay Rabinowitz dá um ritmo inquieto à história, refletindo um pouco estas vidas, além de ser repleta de momentos inspirados, como as rápidas sequências em que vemos as drogas sendo usadas ou como aquela em que Sara toma café da manhã e cortes secos fazem os alimentos sumirem repentinamente, ressaltando a rapidez dela na hora de comer.
Tendo ainda grandes atuações de seu elenco, desde Ellen Burstyn (merecidamente indicada ao Oscar) até Marlon Wayans, Réquiem Para um Sonho foi um ótima passo na carreira de Darren Aronofsky. E é bom ver que, depois deste filme, ele conseguiu realizar obras igualmente relevantes, que o confirmam como um dos diretores mais interessantes da atualidade.
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