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Sinopse

Tyler sobreviveu por pouco à sua última missão. Sem muito tempo para descansar, ele terá de encarar outra dessas aventuras nas quais é colocado seriamente em risco de morte. Ele precisa resgatar a família de um criminoso.

Crítica

Por mais que sejam nebulosos os números de visualizações ou o impacto causado por longas que estreiam diretamente nas plataformas online, em alguns casos chega a ser fácil verificar seu sucesso. Como, por exemplo, ocorreu com Resgate (2020), aventura estrelada por Chris Hemsworth e escrita e produzida pelos irmãos Joe e Anthony Russo – os três recém saídos do arrasa-quarteirão Vingadores: Ultimato (2019). Fruto de uma expectativa por esse reencontro que se via nas alturas, o resultado conquistou prêmios e indicações no People Choice Awards, Hollywood Critics Association, Academia de Cinema de Ficção Científica, Fantasia e Terror e no Critics Choice Super Awards – instituições que, em geral, balizam mais a popularidade do que a qualidade crítica de determinado projeto, mas ainda assim – e permaneceu por semanas na lista dos mais assistidos da Netflix, produtora responsável por sua realização e exibição. Assim, a chegada de uma sequência era só questão de tempo. No entanto, Resgate 2 subverte a ordem do anterior, e ao invés de ousar nas cenas de ação e avançar em um novo conceito de thriller, se apresenta acomodado com os louros recebidos pelo seu antecessor, mostrando-se como não mais do que um ponto de passagem – um terceiro episódio se revela mais do que evidente. Ou seja, é só um passatempo, que atinge um ou outro momento de maior interesse, mas que falha enquanto conjunto em ir além do que aquilo já esperado.

Chama atenção, por exemplo, que seja a mesma equipe de roteiristas – com o acréscimo de Ande Parks, autor da graphic novel “Ciudad”, que deu origem à trama – e permaneça no comando dessa história o coordenador de dublês Sam Hargrave (um dos responsáveis pelas peripécias vistas em títulos como Deadpool 2, 2018, Atômica, 2017, e Jogos Vorazes: Em Chamas, 2013, entre outros). Também ativo nos bastidores de diversos projetos do Universo Cinematográfico Marvel, foi o bastante para o surgimento de uma relação de parceria e confiança com Hemsworth. Ele realmente se dedica a obter o máximo do astro, deixando de lado eventuais superpoderes da sua criação mais famosa para se validar como um brutamontes próximo da vida real, um homem que sofre por ter perdido a família (os momentos sofríveis do conjunto, pois o ator não possui alcance dramático para tal retrato), mas que encontra forças sabe-se lá onde quando comprometido com uma causa (os esforços que fazem o conjunto valer a pena).

Após dez minutos de recapitulação – é quase um “nos episódios anteriores”, quando tudo que de importante ocorrido antes é lembrado – Resgate 2 tem início no minuto em que o primeiro filme se encerrou, mostrando o mercenário Tyler Rake (Hemsworth, disposto em fazer dessa uma nova franquia em seu nome, após ter desperdiçado chances como Homens de Preto, Caça-Fantasmas e Férias Frustradas) caindo de uma ponte e sobrevivendo ao impacto da maneira mais milagrosa possível. Após meses em coma, ele acorda sem nenhuma grande lição a contar. Mas se aquele que mais nada tem a perder é justamente o que mais longe está disposto a ir, percebe-se ser ele o homem ideal para uma missão suicida: resgatar uma mulher e seus dois filhos, mantidos em cativeiro em uma prisão russa de segurança máxima ao lado do marido e pai das crianças, um mafioso com importantes conexões internacionais. Se instantes atrás Rake parecia mal conseguir se manter em pé, basta um clipe de recuperação ao melhor estilo Rocky Balboa (ou Rambo ou qualquer outro tipo já vivido por Sylvester Stallone) para estar pronto para o que der e vier.

Resgate 2 se mostra válido por essa sequência de... bom, enfim... de resgate, ora! São mais de vinte minutos ininterruptos de um plano-sequência engenhoso e milimetricamente calculado, que visa tanto explorar o potencial tático do protagonista, quanto o empenho bélico de seus oponentes, deixando claro que, independente do lado da questão, não tá fácil pra ninguém. Porém, mais do que isso, é também uma oportunidade de exibicionismo, no qual Hargrave e sua equipe ostentam o máximo do que possuem a disposição, em contorcionismos e reviravoltas que pouco contribuem com o andar dos acontecimentos, ainda que sirvam para deixar qualquer um na audiência de queixo caído se perguntando “como fizeram isso?”. Eis, enfim, um legítimo embate entre forma e conteúdo, impressionante aos olhos, mas frágil diante de qualquer reflexão mais elaborada. Ao contrário de um Hitchcock, que fazia uso desse tipo de recurso com o intento que aumentar a tensão dos eventos, dessa vez estes se mostram a serviço apenas de um encanto momentâneo, que até impressiona de início, mas é incapaz de perdurar diante de qualquer questionamento mais elaborado.

E assim o filme se resume. Não há muito além dessa superfície, pois o antes é conhecido, e o depois aponta com clareza para onde se dirigir. Assim como as lições que os envolvidos aprenderam em seus anos de UCM, mais intrigante do que tudo visto em quase duas horas de ação – Rakes salva a família, e passa o restante do tempo tentando mantê-la protegida dos bandidos determinados a se vingar – é o epílogo, quando um personagem aleatório (Idris Elba, deixando para trás o sonho de ser ele próprio um James Bond para se assumir como o encarregado de passar as missões impossíveis adiante) entra em cena apenas para declarar de forma enigmática: “se você está preocupado comigo, espere só até conhecer o meu chefe”. Portanto, sem início e nem conclusão, Resgate 2 acredita ter cumprido sua função de manter uma fina chama de interesse acesa, empurrando qualquer decisão mais radical para um eventual desfecho da trilogia. O erro não é nem apostar em tantas probabilidades, mas seguir pensando frente aos cenários atuais – o streaming e a volatilidade dos tempos – como faziam aqueles encarregados de trilhas semelhantes três ou quatro décadas atrás. Isso, sim, é cringe.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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