Sinopse
Orélie-Antoine de Tounens foi um advogado e explorador francês do século XIX que se dedicou a conquistar a Patagônia. O rei se depara com seres flutuantes e inimigos vestindo máscaras enormes enquanto percorre espaços fotografados por filme celuloide.
Crítica
O francês Orélie-Antoine de Tounens, interpretado neste longa-metragem de Niles Atallah por Rodrigo Lisboa, é um personagem histórico, autoproclamado rei da Araucaina e da Patagônia no século XIX. Ele queria instituir esse novo reino ao sul do Rio Biobio, reivindicado soberania em virtude de um suposto sangue nobre que, então, sobrepujaria a autoridade dos governos chileno e nativo. Rei conta essa trajetória absurda, apostando numa linguagem repleta de signos distintos, se distanciando bastante de modelos convencionais, do que decorre a dificuldade de considera-lo estritamente uma cinebiografia comum. A alegoria é a força motriz da narrativa que começa alternando rostos e máscaras. No julgamento do aventureiro, bem como nos instantes de seu cárcere, todos têm semblantes pétreos, artifício curioso que amplifica o tom de fábula instaurado como linha mestra da abordagem simbólica e experimental.
Acompanhamos a trama se desenrolar em diversos capítulos, partindo da chegada de Tounens ao território pelo qual deveria ser guiado por um chefe indígena que falecera pouco antes. A busca pelo filho e herdeiro da tribo consolida a visão do europeu sobre aqueles que ele intenta “salvar da ignorância”. Em meio a uma série de representações e evocações poéticas do folclore intrínseco à concepção dos povos sul-americanos, temos a construção de um protagonista de comportamento excêntrico, um lunático deslocado de seu local de origem que proclama aos quatro ventos a validade da monarquia, sistema de governo já ultrapassado pela instauração das democracias. Rei conserva esse viés crítico, especialmente nas cenas do promotor expressando o descontentamento chileno com a postura do estrangeiro.
No que concerne ao plano formal, o longa-metragem demonstra o fetichismo do realizador por procedimentos e características técnicas do cinema. Desde o começo percebe-se isso, em virtude da emulação da película desgastada, tornada componente praticamente onipresente da metade do filme em diante, o que sufoca bastante o âmbito imagético. Rei enfileira alguns maneirismos que tangem a esse desejo de brincar com as particularidades das texturas dificilmente conseguidas pelos suportes digitais. A “sujeira” na tela é proporcional à quantidade de anos em retrospectiva. Dessa maneira, assim que o protagonista relembra seus contatos iniciais com a terra escolhida para instaurar aleatoriamente seu reino, ou seja, ao retrocedermos temporalmente, abundam riscos e imitações da deterioração que polui a aparência, numa associação óbvia.
O deslumbre crescente de Niles Atallah com os efeitos de sua proposição visual acaba atrapalhando a esfera da fantasia, pois desvia nossa atenção do lirismo, ainda que tente exatamente o contrário, ou seja, potencializá-lo por meio de características puramente cinematográficas. Rei é apoiado nessa estrutura arriscada, que relega o protagonista e sua relação singular com espaços já ocupados – segundo sua visão eurocêntrica, carentes de uma liderança pretensamente superior – a posições nem sempre condizentes com sua importância. O filme empalidece gradativamente, muitas vezes permanecendo à deriva. A despeito da criatividade flagrante, falta ao cineasta o traquejo para extrair pujança da retroalimentação dos elementos dos quais lança mão em ritmo acelerado. À bem-vinda aura de lenda conquistada, a produção prefere as hipérboles, sobrecarregando-nos.
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Grade crítica
Crítico | Nota |
---|---|
Marcelo Müller | 5 |
Francisco Carbone | 10 |
Leonardo Ribeiro | 7 |
MÉDIA | 7.3 |
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