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Sinopse

Scooby-Doo e sua turma enfrentam um mistério para lá de desafiador: um plano diabólico para libertar o cão fantasma Cérbero. Eles terão de correr contra e tempo e usar toda a sua inteligência para evitar o “dogpocalypse”.

Crítica

Talvez ainda não tenhamos estudado o suficiente a influência da estratégia produtiva que levou uma das mais tradicionais editoras de quadrinhos dos Estados Unidos a se tornar um estúdio cinematográfico poderoso. Obviamente, antes que existisse o Universo Cinematográfico Marvel, as franquias já estavam por aí. Retrocedendo ainda mais no tempo, vislumbramos os Monstros da Universal, entre outras assinaturas de grupos/empresas surgindo como sinônimo de certo padrão – tipo os filmes da Hammer, as novas pirações da Troma, os longas com o carimbo de Roger Corman. Porém, mais que necessariamente uma grife (embora ainda o seja), a Marvel estabeleceu no horizonte dos grandes eventos, daqueles com milhões em marketing, a ideia de Universo. Batizada assim, de modo eloquente, ela alude a projetos que se comunicam em crossovers pensados para combinar personagens de mundos aparentemente distintos em circunstâncias com eles  convivendo. E Scooby! O Filme, mais do que resgatar as deliciosas traquinagens da Monstros S/A, é o pontapé inicial do ambicioso Universo Cinematográfico Hanna-Barbera, vide a forma como mescla suas propriedades.

Para demarcar bem essa noção de começo, Scooby! O Filme apresenta o momento essencial do encontro entre Salsicha e Scooby-Doo. O roteiro é engenhoso ao intensificar esse instante-chave com o gatilho emocional que frequentemente volta à tona para redesenhar as relações entre vários componentes. O menino solitário que transita pela beira da praia encontra o cãozinho esfomeado em fuga da polícia. A comida e a amizade, dois elementos  basilares desses personagens que acabam se provando o coração pulsante da empresa adiante montada com os amigos Fred, Velma e Daphne – estes que aqui estão mais para coadjuvantes de luxo, embora não de todo negligenciados. Há piscadelas aos saudosistas de plantão durante todo o longa-metragem, inclusive pelo modo como outras figuras da Hanna-Barbera são incluídas em meio à modernização que aparece via os gadgets e as várias utilizações de dispositivos contemporâneos, tais como smartphones e mídias sociais. Claramente está se mirando, ao menos, dois públicos distintos, mas que são contemplados de modo equilibrado na aventura. Nesse caldo cabe uma celebridade atual, mas ali encaixada como antigamente.

A delineação do Universo Cinematográfico Hanna-Barbera começa a ficar escancarada quando os sócios da Monstros S/A descobrem que o vilão é, nada mais, nada menos, do que Dick Vigarista, desta vez sem a presença do inseparável imediato Muttley. Aliás, essa falta que faz o cão mais rabugento dos desenhos animados rima com o elo entre Salsicha e Scooby, assim como também reverbera na ligação (aos trancos e barrancos) de Dinamite, o Bionicão, e seu parceiro, o Falcão Azul, dupla que satiriza Batman e Robin, oriunda dos desenhos exibido originalmente a partir de 1976. Mas, o sujeito que deveria garantir a salvação do mundo é um herdeiro acovardado pela sombra do pai, um tanto perdido diante da necessidade de fazer jus à tradição, porém sem negligenciar as suas singularidades. Os distintos salvadores uniformizados funcionam como uma versão super-heróica de Scooby e Salsicha, e também obviamente oposta a Dick Vigarista e Muttley. Essa identificação aumenta a sensação de que as questões de uns são percebidas em outros, com variações bem articuladas. Portanto, a construção de uma coesão é bastante eficiente em meio ao estrépito das peripécias.

A missão de evitar que Dick Vigarista junte os crânios do Cérbero – o cão mitológico de três cabeças que guarda a entrada do mundo subterrâneo na mitologia grega – acaba sendo bela desculpa para fazer uma ode saudosista à amizade e à própria tradição das produções Hanna-Barbera. Quando parece não haver espaço para mais participações especiais, os criadores tiram da cartola a possibilidade de entrecruzar a atualidade cheia de dispositivos e tecnologia avançada com o passado pré-histórico, assim tornando crível o delicioso aparte do Capitão Caverna. Como parte de uma estratégia de negócio, Scooby! O Filme desempenha com louvor a função de ser a pedra fundamental, testando uma fórmula possível, provavelmente abrindo caminhos para iniciativas semelhantes que entremeiem as tantas propriedades intelectuais da Hanna-Barbera. Sempre privilegiando noções simples, tais como a amizade, a autoestima e os vínculos emocionais, numa embalagem com sabor de nostalgia, o filme se torna um êxito. Oferece uma dinâmica nova e é reverente à natureza dos personagens, bem como ao estúdio que exibia crossovers bem antes disso virar mote à criação de Universos.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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