Crítica
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Sinopse
Em Setembro 5, durante os Jogos Olímpicos de Verão de 1972 em Munique, uma equipe estadunidense de transmissão esportiva precisa se adaptar para a cobertura ao vivo. Isso porque atletas israelenses são feitos reféns, mudando a linha editorial da imprensa presente. Indicado ao Globo de Ouro 2025.
Crítica
O massacre de 1972 nas Olimpíadas de Munique, na Alemanha, já havia sido retratado com excelência nas telonas em Munique (2005) – um dos filmes injustamente pouco citados quando falamos da carreira do cineasta Steven Spielberg. No entanto, a perspectiva de Setembro 5 é completamente diferente da vista no longa prestes a completar 20 anos. Isso porque a sua ação se passa quase totalmente nos bastidores da transmissão da rede de televisão ABC, cuja equipe estava a postos para registrar recordes, vitórias e derrotas, mas foi obrigada a assumir uma pauta envolvendo aspectos criminais e geopolíticos. O diretor Tim Fehlbaum aposta na claustrofobia do ambiente para sublinhar tensões crescentes, decisões importantes e assim revelar o episódio histórico indiretamente, sempre mediado por olhares de fora e perspectivas jornalísticas, nunca de maneira objetiva. Não vemos o atentado, apenas aquilo que essa equipe decide filtrar dele. O primeiro desafio do filme, o de evitar que a trama seja aborrecida/repetitiva, é superado. Estamos diante de um thriller classudo, com boa utilização das potencialidades da montagem (assinada por Hansjörg Weißbrich) e decupagem inteligente. Juntas, elas criam uma experiência tensa e que prende nossa atenção. Num espetáculo às vezes angustiante e totalmente saudosista (sobretudo a respeito dos métodos jornalísticos de antigamente), a informação é o alvo principal.
Mas, por que no primeiro parágrafo deste texto foi utilizada a palavra “saudosista” para adjetivar Setembro 5? Claro que ninguém em sã consciência sente saudade da beligerância da Guerra Fria. A nostalgia em questão tem a ver com a maquinaria quase artesanal utilizada nos anos 1970 para fazer jornalismo. Aliás, o que o longa-metragem tem de mais interessante é justamente a valorização da criatividade humana associada à tecnologia da época para realizar um trabalho que atualmente poderia ser desempenhado sem tantos obstáculos técnicos. Por exemplo, as artimanhas necessárias para colocar um repórter ao vivo em transmissão nacional ou o jogo de cintura que os chefes precisavam ter para adequar urgências à escala dos insuficientes satélites à disposição. Para quem não teve acesso ou mesmo conhecimento a respeito de todos esses desafios do passado, as práticas enfatizadas pelo roteiro podem parecer coisa de museu. De todo modo, são traços genuínos de uma narrativa histórica com jornalistas analógicos recorrendo a métodos ortodoxos (e não ortodoxos) para garantir a chegada da notícia o quanto antes aos telespectadores. Então, é muito bonita essa atenção que Tim Fehlbaum dá à artesania ligada à apuração e à posterior veiculação da notícia, com direito a planos-detalhe de traquitanas, a capacidade de improviso com equipamentos limitados e a valorização da criatividade humana.
No entanto, nem tudo são flores em Setembro 5. Enquanto vemos o jovem e impetuoso Geoffrey Mason (John Magaro) fazendo das tripas coração para comandar a equipe de esportes que se nega a ceder a pauta à equipe do jornalismo geral da emissora, algo fundamental é infelizmente desperdiçado. O roteiro assinado por Moritz Binder, Tim Fehlbaum e Alex David lida bem com as tensões existentes nos bastidores, especialmente as que dizem respeito à convivência nem sempre pacífica entre alemães, norte-americanos e franceses. Ainda que perca esse resquício de animosidade pós-Segunda Guerra Mundial de vista, lá pelas tantas o abandonado em prol das urgências do atentado, o filme traduz pontualmente algumas tensões em obstáculos práticos – o técnico alemão que somente cede os cabos necessários ao colega francês depois de ser convencido pela compatriota interpretada por Leonie Benesch. Porém, o que falta à trama é um enchimento humano, algo que poderia ter dado outra dimensão para decisões equivocadas, precipitações, gestos autoritários e atitudes facilmente lidas como antiéticas. Uma vez que Tim Fehlbaum não se interessa pela natureza dos personagens, ações perdem muito em sentido e significado. Por exemplo, por que o executivo toma a atitude de colocar no ar a informação não confirmada? Ele é um ambicioso em busca de lugar ao sol ou apenas lhe falta ética profissional?
No fim das contas, a ausência de camadas humanas limita Setembro 5, thriller mais eloquente sobre técnicas jornalísticas do que necessariamente a respeito dos envolvidos atrás e diante das câmeras. Quais valores movem as decisões do personagem vivido por Peter Sarsgaard? Por que a figura interpretada por Ben Chaplin simplesmente se torna obsoleta na medida em que a trama engrena, sendo novamente importante apenas próximo ao fim, quando nem dá muito tempo para as discussões morais/éticas sobre responsabilidade jornalística serem tão relevantes? Quais as implicações emocionais da atuação da intérprete alemã, vítima de um comentário insensível que tentou imputar a ela a culpa da geração anterior, a de seus compatriotas nazistas? O filme é mais empenhado em revelar a mecânica de trabalho, em demonstrar métodos antigos (como a colocação da marca d’água da emissora por meio de dupla exposição, algo que atualmente se faz num piscar de olhos). Ou seja, é mais interessado pelo artesanato jornalístico dos anos 1970 do que pelos humanos. Felizmente, a duração de um pouco mais de 90 minutos é ideal para a experiência não se tornar excessivamente repetitiva/maçante. Também joga a favor do resultado o desempenho do elenco, com destaque a John Magaro e Leonie Benesch, ela que conserva o olhar meio assustado constante em A Sala dos Professores (2023), mas dá conta do recado.
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