Crítica
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Sinopse
Terapeuta de casais que nunca teve um orgasmo, Sofia atende James e Jamie, clientes que pensam em dar passos maiores em sua relação desgastada. Eles encontram novas possibilidades no clube underground Shortbus.
Crítica
Sexo ainda é um tabu. Crescemos enquanto civilização, progredindo na ciência e noutros campos do conhecimento, mas esse tão coloquial e prazeroso elemento da vida humana continua encontrando uma série de barreiras morais para circular fora da clandestinidade. John Cameron Mitchell, egresso da cena independente americana, abraçou com vitalidade a ideia de criar uma comédia romântica extremamente sexualizada, sem com isso deixar de focar emoções que, na maioria das vezes, alimentam as pulsões carnais. Shortbus, sobre o escândalo produzido em alguns, procura abraçar náufragos sentimentais para depois acalentá-los.
Se para muitos soam incômodas as cenas de homens se masturbando até sorver o próprio gozo, mulheres se tocando como se nelas não recaísse o peso de uma sociedade machista, interações homossexuais e taras diversas, é por que a repressão sexual imposta desde cedo atua na contenção da libido como se disso restasse segurança. Em Shortbus temos a terapeuta de casais que nunca experimentou o orgasmo e sente vergonha de dizê-lo ao marido. Observamos os Jamies, aparente modelo conjugal, ambos perturbados: um pelo amor incondicional e o outro pela depressão profunda. Surgem, ainda, a dominatriz e o voyeur, arquétipos enriquecidos da mesma forma por suas angústias existenciais. É bom ressaltar, todos embalados pela linda trilha sonora de Michael Hill e do grupo Yo La Tengo.
Em meio a penetrações explícitas e orgasmos, Mitchell vai construindo uma delicada tapeçaria das fraturas pós-11 de setembro. Pessoas emocionalmente quebradiças tentam extravasar por meio de seus corpos o que a mente não deixa aquietar. Elas encontram num clube democrático (homônimo do filme) o local ideal para fruir suas vidas sexuais com um pouco menos de culpa, deixando aflorar anseios de prazer. A meu ver, a chave para entender aonde quer chegar o diretor com Shortbus, sobretudo na utilização de Nova York como pano de fundo ativo, é dada no breve e emocionante diálogo entre um jovem modelo e o já senhor ex-prefeito. O homem mais velho abre seus pecados ao desconhecido, diz que aquela terra recém devastada pelos ataques é um lugar de gente tolerante, perfeita para os golpes desferidos pelos intolerantes. Acaba como sutil e bela declaração de amor.
A cosmopolita “Big Apple” refugia aqueles que conheceram a concretude da vida pela alameda trágica da barbárie. Nesse cenário, no qual medo e cotidiano se confundem, os “desajustados” de Shortbus sentem o baque dos problemas (sejam eles de ordem pessoal ou global), mas, por outro lado, buscam constantemente sobrevivência e felicidade. Se para salvar o relacionamento for preciso incluir a terceira pessoa, um dos Jamies irá escantear seu ciúme. Se para obter o tão sonhado orgasmo for necessário acessar os recônditos do desejo, como faz a terapeuta pré-orgásmica, tudo bem. Aos chocados com genitálias e atos que nem deveriam ser mais tachados de “libertinos”, dada sua cotidianidade, recomenda-se tentar imergir sem tantas amarras na narrativa proposta. A recompensa será a veia intimista e verdadeira de Shortbus, longa sobre pessoas e suas interligações, não algo agressivo ou muito longe do que eu ou você (feliz ou infelizmente) vivemos.
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