Crítica
Leitores
Sinopse
Silvio é a cinebiografia do maior apresentador de todos os tempos da televisão brasileira, aqui interpretado por Rodrigo Faro. Esse olhar começa em um dia em especial: apenas 12 horas depois de ter a sua filha sob custódia de um sequestrador, o comunicador enfrenta um obstáculo ainda mais complicado: sua casa é invadida e ele é mantido como refém. Percebendo que sua vida está em risco, ele busca refúgio nos distantes pensamentos de toda sua trajetória.
Crítica
Os trailers de Silvio não deixaram boas impressões. Peças publicitárias encarregadas de provocar o interesse do público, eles logo causaram comentários negativos na internet, principalmente sobre a caracterização de Rodrigo Faro como Silvio Santos, um dos grandes comunicadores da televisão brasileira. De fato, a maquiagem e o cabelo pareciam bastante artificiais. No entanto, a composição do protagonista é problemática como um todo, a começar pelo conceito norteador, passando pela maneira como tudo é apresentado e chegando ao trabalho de Faro encarnando o seu maior ídolo. Cinebiografia mais convencional do que assume num primeiro momento, o longa-metragem dirigido por Marcelo Antunez (o mesmo de Polícia Federal: A Lei é Para Todos, 2017) aparentemente oferece um recorte da trajetória de Senor Abravanel (Faro). Porém, ele utiliza flashbacks como estratégia narrativa para citar a infância, a adolescência, o começo da fase adulta, os companheiros e fundamentais mentores à construção da carreira como empresário/apresentador. O recurso seria menos esquemático se o realizador utilizasse a máxima de Silvio vendo passar o resumo da vida diante dos olhos ao se aproximar da morte. Porém, não é isso o que acontece. O filme tem um emaranhado de causos obedientes à cronologia na qual aconteceram, isso em busca de uma escalada da pobreza rumo ao sucesso.
A situação conflituosa em torno da qual tudo acontece em Silvio é o sequestro verídico sofrido pelo apresentador horas depois da soltura de sua filha mantida em cárcere privado pelo mesmo meliante. Silvio está tranquilo, fazendo seus exercícios em casa, quando Fernando (Johnnas Oliva), depois de ser emboscado pela polícia, pula o muro da residência do dono do SBT e o faz de refém. Marcelo Antunez quer a todo custo mostrar o protagonista como um negociante nato, alguém que raramente perde as estribeiras, mesmo com uma arma apontada para o peito. No entanto, Rodrigo Faro não consegue atingir um resultado menos do que desanimador e postiço nas tentativas de expressar a inteligência de Silvio Santos, bem como o seu senso de proteção da família. O ator toca apenas uma nota, claramente não estando à altura do desafio de traduzir cinematograficamente os dilemas e embates internos do Homem do Baú. O texto também não ajuda, vide as várias frases de efeito, os simplismos retóricos e a defesa até um tanto ingênua da humildade de um homem transformado em sinônimo de popularidade aos domingos. Ao elaborar os cenários imaginários, por exemplo, quando o bandido aparece na infância admirando a sua agora vítima, Marcelo Antunez tenta (em vão) dar um ar simbólico ao cenário de escuridão infinita no qual vemos apenas a criança brincando diante da TV e as imagens em p&b de Silvio.
O cineasta não é bem-sucedido ao criar elos emocionais e psicológicos entre Silvio e Fernando. Em parte, porque não há consistência nessa conexão e sequer qualquer pista a respeito do contrário, ou seja, daquilo que distancia sequestrado e sequestrador. Enquanto tenta convencer a alta cúpula do governo estadual a dar garantias ao bandido para encerrar o pesadelo, Silvio tem sucessivos flashes de sua trajetória. Assim, Silvio não consegue disfarçar a sua satisfação com um sumário repleto de elogios ao menino que venceu a agressividade paterna, ganhou uma segunda chance da polícia, construiu um império econômico com a ajuda de figuras importantes e está ali, agora, negociando para que nenhuma morte aconteça. Com os olhos brilhantes de devoção, Marcelo Antunez enxerga Silvio Santos como um modelo de homem a ser seguido, sujeito resiliente num momento de sua vida em que tenta sobreviver para ajustar as contas com os episódios menos positivos de seu passado – retratado como uma sucessão românica de êxitos permitidos somente aos predestinados. O realizador adiciona condimentos e especiarias nesse molho, mas o preparo faz dele um caldo ralo. O cineasta abandona assuntos e considerações como quem libera espaço para mais um testemunho do Silvio merecedor de nossa admiração incondicional. As atuações não colaboram, a não ser a de Johnnas Oliva, ator que até se sai bem.
Marcelo Antunez propõe e abandona ideias sem muita cerimônia. Por exemplo, cria uma situação na qual o revanchismo de determinado policial poderia ser uma bomba relógio, mas simplesmente se esquece desse coadjuvante quando acontece algo previsível. Pela perspectiva oferecida no longa, Senor Abravanel é o típico homem de família que merece ser aplaudido. De negativo, quando muito, é ciente da necessidade de reconhecer erros para ajustar as coisas com as pessoas feridas ao longo do seu caminho. Os negociadores, os policiais e até o governador de São Paulo na ocasião são utilizados como pretextos para tentar injetar perspectivas diferentes no diálogo entre Silvio e Fernando. As filhas e a esposa de Silvio Santos são ramificações de uma árvore frondosa que se tornou proprietária de emissora de televisão. Silvio Santos é enxergado como pai zeloso e protetor. Voltando à famigerada caracterização de Rodrigo Faro, ela compromete a adesão emocional, gerando uma imitação caricatural de alguém tão mimetizado em programas humorísticos por seus trejeitos. Produção que rivaliza com Mamonas Assassinas: O Filme no quesito “cinebiografia simplória e desengonçada”, Silvio traduz em termos elogiosos a vida de Silvio Santos por meio de várias chantagens emocionais. Até quando Silvio é babaca, a ênfase está na nobre capacidade de se arrepender e ser digno de perdão. Aqui, Silvo é um santo.
Últimos artigos deMarcelo Müller (Ver Tudo)
- Jose Barahona, renomado cineasta português, morre aos 55 anos - 3 de dezembro de 2024
- Gotham Awards 2024 :: Um Homem Diferente vence o prêmio principal - 3 de dezembro de 2024
- O Penitente - 3 de dezembro de 2024
Grade crítica
Crítico | Nota |
---|---|
Marcelo Müller | 3 |
Robledo Milani | 4 |
Alysson Oliveira | 2 |
Chico Fireman | 4 |
Francisco Carbone | 3 |
MÉDIA | 2.6 |
Deixe um comentário