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Sinopse

Bryan Widner é um jovem supremacista branco. Coberto de tatuagens racistas da cabeça aos pés, leva uma vida cheia de violência e ódio. Quando conhece Julie e suas três filhas, decide abandonar o movimento neonazista e transformar sua vida , contando ainda com a ajuda de um ativista negro.

Crítica

Duas palavras-chave para analisar este drama se encontram nas ideias de conversão e redenção. Bryon (Jamie Bell) é apresentado ao espectador quando se encontra moralmente no fundo do poço: ele é visto durante uma manifestação de supremacistas brancos, gritando palavras de ordem racistas e xenofóbicas antes de espancar um adolescente negro. Durante o mesmo protesto, encontra um homem negro que demonstra simpatia por ele. Na cena seguinte, descobre a existência de uma mulher bondosa, de espírito forte e tendência democrática, por quem se apaixona. Assim, graças à boa vontade, persistência, compaixão e principalmente ao amor romântico, encontra uma maneira de sair da cegueira rumo a uma vida de aceitação das minorias. Skin: À Flor da Pele (2018) demonstra profundo otimismo na crença da transformação pessoal, por pior que seja o indivíduo, fazendo da história de Bryon um caso exemplar em tempos de ódio.

O melhor aspecto do filme se encontra na tentativa de compreender as razões pelas quais alguém se junta a uma gangue nazifascista. O roteiro do diretor Guy Nattiv faz questão de demonstrar pessoas em fragilidade emocional e financeira sendo cooptadas por uma espécie de família adotiva que lhes fornece cama, comida e um senso de proteção em troca do cumprimento estrito das regras. Além da presença de Bryon, o filme revela um adolescente sendo introduzido no grupo pela primeira vez, em paralelo com o desejo crescente do protagonista por uma dissociação da vida criminosa. Enquanto um faz o processo de entrada, o outro desenha a possibilidade de saída. Bill Camp e Vera Farmiga, no papel do “Pai” e da “Mãe”, como gostam de ser chamados, efetuam ótimo trabalho de manipulação emocional, enquanto proporcionam um tipo de cuidado mínimo que o Estado não oferece a estes jovens. No que diz respeito à descrição psicológica, o filme cumpre bom papel, sem demonizar os membros da gangue nem perdoá-los de fato. Jamie Bell hesita entre a demonstração da virilidade brutal exigida dele e a ternura que transparece ocasionalmente com a namorada Julie (Danielle MacDonald). O diretor demonstra evidente interesse nos laços entre essas pessoas, tomando o cuidado de não transformá-las em caricaturas.

Apesar das qualidades de construção de personagens, Skin: À Flor da Pele surpreende por lançar um olhar mais moral do que sociopolítico ao caso de Bryon. Os diálogos estão recheados de frases de julgamento ao protagonista: “Talvez você seja um homem mau”, ele diz a si mesmo no espelho. “Você tem coração, você não é como eles, baby!”, suplica a namorada. Quando a inquilina reclama da presença de um nazifascista em sua propriedade, Julie responde aos gritos: “As pessoas mudam, Sheryl!”, antes mesmo que o tatuador supremacista demonstre qualquer vontade de mudar. A edição prepara o espectador para a conversão à bondade desde o início, alternando cenas da vida de Bryon com sessões em que suas tatuagens no rosto e no corpo são retiradas cirurgicamente – prova de que se converterá mais tarde. O roteiro é tão dependente da lógica da tentação e da recaída, dos chamados dos anjos (Julie/Daryle) contra o apelo dos demônios (Fred/Shareen), que se torna difícil não aproximar o resultado de um cinema cristão. Em sua estrutura otimista e de certo modo previsível, alternando-nos sobre iminente a conversão do personagem, o projeto se assemelha aos dramas católicos de descoberta da fé e/ou aceitação de Cristo. Não por acaso, uma das únicas canções ouvidas no filme traz os versos “Seu amor é verdadeiro / Seu amor é gentil”, em referência a Deus.

A impressão de uma narrativa cristã é reforçada pelo estilo maneirista do diretor. As cenas recorrentes de tatuagens sendo removidas se constroem em câmera lenta, com música sacra ao fundo e a luz esbranquiçada dos equipamentos médicos fazendo a vez de intervenção divina. As cenas de ataques racistas e xenofóbicos ocorrem à noite, sob forte luz de lâmpada das ruas, em becos sombrios e assustadores. Logo após participar de um crime de ódio, Bryon vomita em direção à câmera, em plano próximo, com a imagem tremendo. Nattiv não se mostra muito sutil em suas escolhas, apostando em diversos planos aéreos simulando o olhar divino sobre os personagens, e sublinhando alguns que já eram suficientemente claros pelo roteiro. As cenas na gangue são vistas por meio de uma câmera tremida, enquanto a vida doméstica ao lado de Julie apresenta uma estética mais calma, agradável. Mesmo a linguagem cinematográfica se carrega de forte teor moral, determinando as ações boas e as ruins. Cenas um pouco exageradas do personagem dirigindo numa autoestrada em crise emocional resumem a jornada do herói que precisa encontrar a bondade em si próprio.

Na conclusão, como de costume em produções baseadas em fatos, mostra-se as fotos dos verdadeiros Bryon e Daryle, sorridentes e amigos, como prova de que a ficção não seria tão absurda assim. Nattiv olha para os casos mais graves da sociedade e enxerga um caso ainda mais digno de melhorias, ao invés de tentar compreender de que maneira o grupo dos Vikings nasceu, e de que maneira este grupo se insere numa lógica social mais ampla. Como permanecem ocultos por tanto tempo? De onde vem o financiamento para as ações continuarem? Existem outros grupos como estes? O diretor, e o filme, evitam dar este passo atrás, capaz de transformar o filme num estudo sociológico. O personagem de Daryle, assistente social capaz de estabelecer a ponte entre o jovem nazista e o resto da sociedade, é deixado em segundo plano, enquanto o roteiro privilegia os sentimentos transformadores por Julie, a namorada. Entre modificar a sociedade por meio de ações amplas ou converter indivíduos um por um, confrontando-os a si mesmos até encontrarem o perdão, o projeto prefere a segunda alternativa.

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Crítico de cinema desde 2004, membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema). Mestre em teoria de cinema pela Universidade Sorbonne Nouvelle - Paris III. Passagem por veículos como AdoroCinema, Le Monde Diplomatique Brasil e Rua - Revista Universitária do Audiovisual. Professor de cursos sobre o audiovisual e autor de artigos sobre o cinema. Editor do Papo de Cinema.
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