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Crítica


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Sinopse

Sara engravida depois de sua primeira vez. Menos de vinte e quatro horas após o ato sexual, dá a luz a um ser aparentemente alienígena, isso enquanto termina de gestar um segundo, ávido por sair e se alimentar de gente.

Crítica

Muitas vezes o cinema de horror é utilizado para oferecer metáforas sobre circunstâncias socialmente relevantes. O extraordinário se coloca a serviço de leituras alegóricas, relacionadas a questões presentes no dia a dia, assim potencializadas por figuras tétricas e/ou ameaças de outro mundo. Frequentemente, medos, controvérsias e afins encontram personalizações em monstros de diversos tipos, origens e níveis de ameaça. Snatchers: Gravidez Monstruosa utiliza uma dinâmica excepcional para abordar coisas como gravidez na adolescência, xenofobia e os perigos do sexo sem proteção. Mas, convém não esperar tanta densidade do produto. Isso porque os diretores Stephen Cedars e Benji Kleiman não parecem essencialmente interessados em substanciar as mensagens subjacentes. A prioridade é a reverência a um tipo específico de produção estilo B, calcada no exagero, no descolamento quase completo da estrita realidade. Improbabilidades, abominações gosmentas, a necessidade de salvar o mundo de tais aberrações. É isso que verdadeiramente importa à dupla nessa comédia que, ainda, utiliza códigos próprios aos filmes de adolescente, àqueles ambientados em escolas.

Dos teen movies, Snatchers: Gravidez Monstruosa vampiriza os arquétipos. Sara (Mary Nepi) é uma adolescente que aspira à popularidade, por isso mesmo se afasta da melhor amiga de outrora, Hayley (Gabrielle Elyse), esta vista como nerd pelos “descolados”. Adivinhem quem vai ajudar a protagonista quando algo der muito errado? As parceiras de festa ou a negligenciada que se importa com ela desde a infância? Para antever esse desdobramento é preciso apenas ter assistido a um par de filmes ambientados em cenários secundaristas. E os realizadores se filiam com gosto aos cânones desse subgênero bastante prolífico nos Estados Unidos. Como essa, há outras convenções: o bonitão com pouca capacidade intelectual; a nova best friend fútil, que provavelmente esconde fragilidades atrás do comportamento histriônico; as coadjuvantes que servem somente de claque; a mãe cuja preocupação parece despropositada, mas que gradativamente soa como absolutamente sensata; o esquisitão invisível que desempenha função fundamental; as autoridades salvadoras.

Snatchers: Gravidez Monstruosa, então, faz uma mistura de vários códigos, embalando tudo num pacote bem humorado, do tipo que alguns rotulariam de “para não levar a sério”. Porém, esse suposto descompromisso não abona determinadas fragilidades, tais como a reiteração de velhos ranços estadunidenses. Embora Sara mencione que o perigo vindo do México é um “lapso de xenofobia”, ou seja, que os realizadores entendam esse cenário de forma mais complexa, isso não os livra das ressalvas por incorrer na construção da ameaça que vêm justamente de um país com o qual os norte-americanos possuem uma relação, no mínimo, ambígua. Sara engravida ao transar pela primeira vez, obviamente sem camisinha, de um sujeito que acabou de realizar uma visita de turismo pelo país latino vizinho. Para completar a chave puramente satírica dessa visão reticente quanto a nação entendida como exótica, precisaria haver uma leitura crítica de todo esse panorama, sobretudo do modo como “o forasteiro” é compreendido. O alienígena, fruto do sexo casual, é o estrangeiro ameaçador.

Então, não se trata de levar a sério ou não um filme escrachado como Snatchers: Gravidez Monstruosa. É preciso entender de que maneiras ele rechaça ou reafirma chavões que não cabem na contemporaneidade. Afora essa oscilação entre ironizar e regozijar-se dos diagnósticos enviesados concernentes ao outro, estamos diante de uma produção que aposta pesado na estilização da violência caricatural e em personagens rasos. Determinantes são as conjunturas. Não estamos frente a um estudo da espessura humana, mas de uma brincadeira geralmente divertida que mostra jovens desorientadas, em meio à organização de suas relações afetivas, tendo de lutar contra criaturas nascidas em condições insólitas. Em alguns momentos, Stephen Cedars e Benji Kleiman esgarçam o horror cômico, se achegando da lógica do besteirol, passo perceptível no desenho dos coadjuvantes, bem como na reação da protagonista e da escudeira à invasão alienígena que se avizinha. Entre mortos e feridos, fica-se ora com a ideia de avacalhação das boas, ora com a sensação de desperdício. Cenas como a ridícula explicação por meio do tosco vídeo da viagem promovem o desempate.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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