Crítica
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Sinopse
Três casais se reúnem numa casa de campo no início do século 20. Problemas de ordem sexual afligem os anfitriões, um professor está prestes a se casar com uma mulher mais jovem, e um médico apaixonado por uma enfermeira.
Crítica
Livremente inspirado na peça Sonho de uma Noite de Verão, de Willian Shakespeare, este longa-metragem de Woody Allen surge como um respiro em sua carreira, depois de Noivo Neurótico, Noiva Nervosa (1977), Interiores (1978) e Manhattan (1979), trazendo de volta a leveza de suas primeiras comédias ao passo que, através de uma deturpada revisão da obra original, preenche com discussões ainda atuais os espaços entre uma sacada e outra. Woody Allen e William Shakespeare parecem ainda mais próximos se fizermos uma análise ampla de suas carreiras. Ambos se dividiram entre comédia e drama. Também, o cerne de suas histórias são as diferentes naturezas dos relacionamentos interpessoais, principalmente os amorosos, em tramas que simplesmente crescem em torno dessas interações. Em Sonhos Eróticos de uma Noite de Verão, Allen explora com descontração e muita honestidade o grande tabu da infidelidade, ou melhor, dos desejos pelo próximo, e como isso muitas vezes implica em ser infiel.
Do ponto de vista pura e pragmaticamente científico, o ser humano se relaciona para fins de reprodução. Perpetuar a própria espécie é um instinto básico que nos coloca no mesmo nível de seres como os vírus, por exemplo, segundo as ideias do autor e biólogo Richard Dawkins. O amor, nesta análise quase matemática do assunto, seria uma invenção da psique humana para dar sentido ao ato, algo que muitos outros teóricos vão relacionar ao próprio surgimento do conceito de “cultura”. Segundo esse prisma, o amor nasceu no momento em que o homem atribuiu significado à primeira coisa. Sentimentos seriam, assim, a forma do gene egoísta proposto por Dawkins, escondido no núcleo da nossa constituição, de traduzir suas necessidades de sobrevivência para o consciente. Indo muito mais além do que o necessário aqui, mas só para terminar a ilustração, a teoria explicaria geneticamente até mesmo a homossexualidade, então uma forma de controle populacional.
Woody Allen é um artista estudado, afeito a transmitir sua paixão fazendo a arte pela arte, o que não deixa de ser o caso aqui, quando leva os três casais que protagonizam o longa-metragem para o meio de uma floreta, onde vivem confusões amorosas que envolvem trocas, traições e cômicas situações que remetem diretamente à peça de Shakespeare. Contudo, sua aparentemente singela obra ganha contornos de maior profundidade quando realmente analisa o indubitável desejo pelo próximo, muitas vezes apenas carnal – e, portanto, segundo o que foi discutido antes, natural e instintivo – que em nada interfere ou tem a ver com o já disseminado e implícito conceito cultural de amor. Claro que, ele mesmo um apaixonado, e estando ciente que a consciência de um sentimento não o faz isento do mesmo, não descarta a importância e a reverência diante do mais aclamado deles só para provar que a chamada “livre libido” não é tão condenável assim. “O sexo é o que alivia a tensão, o amor é o que a causa”, defende ele em certo momento.
Não era a primeira vez que Allen discutia o sexo, principalmente reafirmando de acordo com sua visão a errônea e comum associação dele com o amor – algo questionado por um dos personagens: “não são a mesma coisa?” – e também não seria a última. Mantendo apenas a ideia principal da obra em que foi inspirado, o roteiro coloca Andrew (Allen) e Adrian (Mary Steenburgen) como um casal em dificuldades na cama, prestes a receber em sua casa no campo outros dois casais, o amigo dele, sua acompanhante, um filósofo egocêntrico e sua noiva Ariel (Mia Farrow), com quem o anfitrião já se envolvera antes. Logo Andrew, que ainda gosta de Ariel, ajuda o amigo médico a conseguir transar com a mesma, enquanto a enfermeira acompanhante deste dá conselhos para Adrian de como comportar-se na cama, não sem antes aceitar uma despedida de solteiro com o Professor Leopold (José Ferrer).
Usando diálogos divertidíssimos e de natureza honesta, Allen consegue ainda nos explícitos dias atuais manter atento o espectador, graças a essa transparência de seus personagens, que surge através de uma casualidade cômica, seja em assuntos normalmente tabus – “Como está o casamento?” “Bem, não está funcionando, mas bem” - ou naqueles que soam engraçados simplesmente por sua óbvia explanação – “Ele tem uma flecha no coração, vai morrer”. De outra forma, esconde sobre a identidade de Leopold, o filósofo, uma brincadeira com Russeau, ele que discute em O Contrato Social justamente o conceito do “bom selvagem”, e que defende, com algum puritanismo, a bondade intrínseca à espécie humana. Uma visão que claramente atacaria o ato “selvagem” de um indivíduo comprometido relacionando-se com outro que não seu parceiro pré-estabelecido, exatamente o tipo de perspectiva unilateral que o cineasta condena aqui, colocando o Professor, que inicia o filme dizendo “devo ser enaltecido por ser civilizado?”, logo numa relação animalesca extraconjugal. Sempre repleto de um rico subtexto filosófico, artístico e humano, mesmo em suas menores obras, Woody Allen faz com Sonhos Eróticos de uma Noite de Verão uma comédia divertida e ágil, que se consegue levar a dissertações sobre o seu conteúdo. É, com certeza, um dos acertos de sua carreira.
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Grade crítica
Crítico | Nota |
---|---|
Yuri Correa | 8 |
Robledo Milani | 5 |
Ailton Monteiro | 7 |
Francisco Carbone | 7 |
Chico Fireman | 6 |
Cecilia Barroso | 6 |
MÉDIA | 6.5 |
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