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Sinopse

Depois de um longo período internado numa instituição psiquiátrica, Spider volta às ruas de Londres, mais precisamente à região do East End, lugar onde cresceu. No coração de suas memórias repousa a perda da mãe.

Crítica

Spider: Desafie Sua Mente foi apresentado para o público brasileiro com esse subtítulo intrigante. Desnecessária, porém pontual, a provocação diz respeito ao quebra-cabeça cinematográfico proposto por ninguém menos que David Cronenberg. Da mente soberba e inventiva do canadense, a literatura de Patrick McGrath se torna um intrincado jogo no qual o personagem-título e os espectadores se envolvem como cúmplices; pistas e pressuposições são lançadas continuamente, contudo suas soluções são mistérios, assim como este enigmático protagonista. No leste de Londres, entre os anos 1960 e 1980, Spider cresce entre situações adversas. Ele acredita ter visto seu pai assassinar brutalmente sua mãe e substituí-la por uma prostituta, Yvonne. Crente que os dois planejam sua morte, ele traça um plano que acaba atingindo efeitos trágicos e permanentes. Anos mais tarde, liberado de uma casa de recuperação, ele deixa de tomar seus remédios e passa a ser assombrado pelos medos de infância. A loucura parece inevitável.

A insanidade é um assunto recorrente na arte porque ela assusta enquanto envolve. A mente humana é uma máquina complexa e intrincada com problemas ocasionais em seus componentes, e Spider: Desafie Sua Mente permite que este universo corrompido seja acessado. Cronenberg não realiza exatamente um filme, mas um pesadelo em frames. Roteirizada pelo próprio McGrath com base em seu aclamado livro, a trama ainda carrega influências confessas dos primeiros textos de Samuel Beckett, que recorrentemente despia seus personagens até os instintos e influências mais primitivos.

A vida de Spider é controlada pela rotina. Ele escreve constantemente palavras sem sentido em seu diário, visita um mesmo café regularmente, onde se senta sempre no mesmo lugar e resolve quebra-cabeças com facilidade. O roteiro de McGrath apresenta rapidamente estes hábitos do personagem e suas importâncias para ele, assim como as consequências inevitáveis da quebra destes costumes. Enquanto ele se recorda pouco a pouco dos eventos que o guiaram até sua atual situação, o filme apresenta uma série de flashbacks aleatórios em que Spider presencia seu passado de fora. Assim, Cronenberg revela a completa imersão de seu protagonista no próprio mundo, enquanto hábil e lentamente tece as teias necessárias para compreendermos a série de fatores que contribuíram para sua personalidade, tão singular quanto aterrorizante.

Grotesco num nível que apenas Cronenberg é capaz de atingir, Spider: Desafie Sua Mente atinge surpreendentemente tal feito sem sangue ou vísceras, apenas com uma cena de violência e um punhado de sêmen. A condução do cineasta é precisa e das mais apuradas em sua sublime filmografia, mérito reconhecido com o prêmio de melhor direção no Genie Awards, considerado o Oscar canadense. Sua potência diretiva, bem como planos e composições visuais, são intensificados satisfatoriamente pela trilha opressiva de Howard Shore e fotografia assinada por Peter Suschitzky, eventual colaborador do cineasta.

Spider é inquietante por conta de sua estranheza, mas ao longo da projeção percebe-se que ele vive um pesadelo do qual jamais pode despertar, repleto de conspirações e inseguranças. Ralph Fiennes captura esta essência e todas as sutilezas do tipo que representa, nesta que é certamente uma de suas maiores interpretações. O ator concebe nuances e representa o desconforto de seu personagem com seu próprio corpo e condição. Ele murmura, mas quando fala, o faz como uma criança faria, revelando o homem que nunca se desapegou de sua infância. Miranda Richardson impressiona com a habilidade de transitar entre papeis e Gabriel Byrne é igualmente eficiente, e se torna cada vez mais intimidante e poderoso com o desenrolar do filme e seu personagem.

Spider: Desafie Sua Mente é aflitivo, ainda que lento e imersivo, características que o filme compartilha com seu protagonista. David Cronenberg direciona cada elemento de sua obra para um mesmo propósito, e o resultado é uma das produções mais surpreendentes e convincentes sobre a insanidade – tema ao qual o cineasta se aproximaria novamente em Um Método Perigoso (2011). Mesmo que se resolva em suas conclusões, o longa deixa algumas questões ecoando na mente de seus espectadores, incitando estes a novos olhares. É um sentimento propício à inquietação, algo que novamente nos relaciona com Spider.

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é crítico de cinema, membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Graduado em Publicidade e Propaganda, coordena a Unidade de Cinema e Vídeo de Caxias do Sul, programa a Sala de Cinema Ulysses Geremia e integra a Comissão de Cinema e Vídeo do Financiarte.
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