Crítica
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Sinopse
Depois de sobreviver misteriosamente a um acidente espacial, um sujeito traz consigo uma perigosa criatura.
Crítica
Há um pano de fundo político em Estranho Passageiro: Sputnik. Não à toa, a trama se passa em 1983, quando o mundo vivia a polarização da Guerra Fria. De um lado, os Estados Unidos e seu estilo capitalista de consumo e individualismo. Do outro, a União Soviética e o comunismo que privilegiava o heroísmo e uma noção mais coletiva de convivência. Curiosamente, o cineasta Egor Abramenko se aproxima de diversos modelos cinematográficos estadunidenses, inclusive quando a intenção é criticar procedimentos oficiais. O militar de alta patente disposto a fazer tudo para cumprir sua missão, rapidamente transformado numa caricatura que personifica essa nocividade autoritária, é equivalente a tantas figuras parecidas presentes em filmes norte-americanos de ação, nos quais a crítica ao sistema acaba superficial. Curiosamente, é o que acontece nesse longa-metragem que também apela à ficção científica e ao terror para construir uma trama com elementos bem dispostos, mas que desperdiça justamente a consistência dos subtextos que poderiam ser fundamentais.
A protagonista é Tatyana (Oksana Akinshina), a típica personagem que utiliza métodos não ortodoxos para atingir resultados sem preocupar-se com os meios. Desse modo, não seria tão diferente do responsável pelo quartel general que esconde um segredo vindo do espaço. Porém, a simetria entre pessoas que vão acabar em lados opostos por uma série de consequências não é dilapidada, apenas sinalizada sem afinco. Em meio a uma investigação de má conduta profissional, a doutora é encarregada de acompanhar de perto o confinamento de um cosmonauta recentemente regresso do espaço. Na verdade, sua missão depois revelada é compreender o comportamento da criatura extraterrestre e "parasitária" que todas as noites sai do corpo do hospedeiro Konstantin (Pyotr Fyodorov) para alimentar-se. Estranho Passageiro: Sputnik tem um bom clima de suspense mediando todas as etapas que vão da apresentação parcial da situação à forasteira, passando pela gradual descoberta de dados omitidos pelos oficiais responsáveis, chegando à rebeldia contra os ditames do Estado.
Porém, além de não substanciar o que está fervilhando nas entrelinhas, Egor Abramenko se atrapalha um pouco quanto ao desenvolvimento dos personagens, os restringindo aos limites dos arquétipos aos quais se filiam. Tatyana, por exemplo, não apresenta seu pragmatismo de modo irredutível, mas tampouco tem um trajeto emocional e psicológico suficientemente desenhado para justificar a atitude de largar o dever em prol da ligação desenvolvida com os seres vivos (humano e inumano) em inviolável simbiose. Konstantin tem uma questão mal resolvida com a paternidade. Ela eclipsa sua tragédia vivenciada como sujeito servidor da pátria, mas por ela traído em função de “um bem maior”. Já o comportamento do coronel Semiradov (Fedor Bondarchuk) esvazia a desaprovação ao governo, pois ainda que funcione como indício, tornando-se a parte que poderia explicar o todo, está atrelado à ideia que o cinema norte-americano perpetrou de um militar despótico supostamente correto, mas cujo desvario representa uma distorção bem perigosa de seu dever.
Estranho Passageiro: Sputnik permanece dividido entre abraçar o delineamento de uma trama tensa, validada pela forma como desenha gestos e suas respectivas implicações, e estofar essa movimentação com observações de cunho simbólico. Os instantes em que a criatura ataca, fazendo vítimas impiedosamente, são filmados com vigor, assim expressando bem a apreensão e o medo incutidos nos vários personagens. Mas, levando em consideração que grande parte do enredo se passa entre descobertas, conversas e conspirações, ou seja, que o privilégio é exatamente o diagnóstico de uma ordem político-social a partir do sci-fi, e não necessariamente o contrário, o filme deixa a desejar pela falta de uma valorização robusta dessas possibilidades discursivo-analíticas. Até as nuances da ligação de Tatyana com o alienígena são deixadas de lado, minimizadas principalmente no terço final. Nele, moldes importados de Hollywood prevalecem sobre os tonalidade dos comentários quanto ao funcionamento das engrenagens da União Soviética como um bloco denso que visava a soberania, pretensamente disposto a qualquer coisa para conseguir vantagem geopolítica.
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Grade crítica
Crítico | Nota |
---|---|
Marcelo Müller | 5 |
Francisco Carbone | 7 |
Chico Fireman | 5 |
MÉDIA | 5.7 |
Rapaz, não entendi nada. Uma crítica cheia de rebuscamentos que prejudicam mais do que auxilia alguém que só quer saber se o filme é bom ou não.