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Sinopse

Danielle é uma exploradora dos oceanos que descobre um novo desafio: uma terrível, porém pioneira, descida ao abismo Ártico. James é um empreiteiro acusado de ser espião e interrogado por jihadistas africanos. Ele irá se unir à moça para ajudá-la em sua missão.

Crítica

Antes dos flashbacks – recursos que entrecortam a linha principal de Submersão – desenharem mais acuradamente os contextos dos personagens principais, o que temos é James (James McAvoy) enjaulado, bastante ferido, e Danielle (Alicia Vikander) absorta em nostalgia, prestes a embarcar numa aventura científica que há muito ansiava. O cineasta Wim Wenders permite ao passado ressignificar essas duas existências separadas espacialmente ao mostrar a conjuntura em que elas se imiscuíram num paradisíaco hotel francês à beira-mar. São duas instâncias narrativas tratadas de maneiras completamente diferentes pelo alemão. No agora, há uma agonia latente, por certo alimentada pela distância. No outrora, a descoberta de um sentimento que desemboca em discussões existencialistas, cujo epicentro é a morte e as implicações de sua inevitabilidade no decurso do ser. Há, também, um desequilíbrio evidente e incômodo entre os dois períodos, fruto da condução demasiadamente arrastada, que carece essencialmente de uma abordagem menos dispersa.

Baseado no livro homônimo de J. M. Legard, Submersão possui uma série de easter eggs, piscadelas apenas funcionais do ponto de vista da curiosidade. O navio que leva a biomatemática Danielle a alto mar se chama L’Atalante, mesmo nome do longa mítico do francês Jean Vigo e da nau que o batiza; Naitulus, o submarino amarelo (Beatles presente) encarregado de acessar águas profundíssimas para desvendar os mistérios da vida, é homônimo da embarcação do icônico Capitão Nemo, protagonista do livro 20.000 Léguas Submarinas, de Júlio Verne. Ter ou não essas referências previamente faz pouca diferença na apreciação do filme como um todo, a não ser na condição de indício de uma construção que tenta, nem sempre com sucesso, evocar certas fatias do imaginário acerca do oceano e de seus mistérios. O fato de James ser um espião a serviço da Inglaterra pouco acrescenta enquanto o casal está junto, sendo relevante nessa dinâmica apenas num breve confronto de realidades que expõe Danielle à censura.

Além da dificuldade de interpenetração entre os estágios temporais da trama, Submersão transcorre num ritmo inconstante, sem que o cineasta consiga extrair a devida dramaticidade de determinados tempos mortos e/ou frações que visam deflagrar um caráter puramente contemplativo. Ocasionalmente há lampejos de excepcionalidade, com Wenders apresentando perspectivas, tanto dramáticas quanto imagéticas, que levam o filme para outros lugares, descolando-o da estrita realidade e aproximando-o de uma abstração que robustece os preceitos do todo. Pena que são instantes de exceção, em geral apressados. No que tange às interpretações, Alicia Vikander e James McAvoy se esforçam como podem para sobrepujar as debilidades de Danielle e James, demonstrando o talento de sempre. Juntos, funcionam bem, porém, separados têm impactos desiguais, culpa da direção trôpega que restringe a atriz a olhares perdidos ao oceano, além de indícios simplistas de saudade. Ele tem mais espaço.

Dentro das qualidades de Submersão, há um inteligente desenho sonoro, especialmente no que diz respeito à representação da sobrevivência de James à sanha jihadista na Somália, que potencializa a ameaça e os instantes de apreensão. O fechar estrondoso de uma porta, passos duros que ecoam nos espaços, tudo isso contribui para um enriquecimento da experiência, para além do que a imagem simplesmente oferece. Falando nos árabes, há uma delineação leviana e perigosa, que remonta a um eurocentrismo condenável. Os locais são vistos a partir da posição dos extremistas religiosos, sem um esforço considerável para circunscrever tal fatia numa realidade específica, evitando generalizações. Wim Wenders realiza um filme difícil de acompanhar sem algum enfado, com brilhos bem circunstanciais, perdido em suas pretensões não alcançadas, ainda que tenha dois ótimos intérpretes que tentem observar as camadas dos protagonistas que descobrem o amor nas proximidades do abismo.

As duas abas seguintes alteram o conteúdo abaixo.
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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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