Crítica


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Sinopse

No coração do bairro do Pina, um pacato supermercado tem o seu cotidiano alterado por um inexplicável fenômeno da natureza, o "Céu Piscante Multicor". Entre as prateleiras e estoques do Superpina, clientes e funcionários experimentam o "Amor Primo".

Crítica

A Praia da Pina é uma das duas localizadas na costa da cidade de Recife, Pernambuco. E se a Pina pode ser vista como um espaço mais democrático, está também um tanto abandonada. E isso se deve porque a da Boa Viagem, por ser melhor localizada, acaba sendo cenário dos maiores e mais luxuosos edifícios (como é visto em Aquarius, 2016, por exemplo). Por essa breve explicação, é possível se ter uma ideia do público que frequenta Superpina: Gostoso é Quando a Gente Faz, longa de estreia de Jean Santos, também autor do roteiro. O mais curioso, no entanto, é que tanto a do Pina quanto a da Boa Viagem não são próprias para o banho, devido ao possível ataque de tubarões. Mas assim como a personagem de Sonia Braga se banhava, o mesmo aqui acontece, e logo na primeira cena, quando nos deparamos com um surfista nu indo mar adentro. O recado é dado de imediato, e apenas para os bons entendedores. É de se lamentar, no entanto, que esse exercício de síntese se perca durante o desenrolar da trama.

E, afinal, qual é o enredo de Superpina: Gostoso é Quando a Gente Faz? O protagonista é Augusto (Paulo César Freire), alguém que nada faz durante o dia, e menos ainda se importa com o que se passa ao seu redor. Invariavelmente pelado – são raras as cenas em que aparece vestido – divide apartamento com Paula (Dandara de Morais, de Ventos de Agosto, 2014), uma amiga. A naturalidade da relação dos dois logo fica explicada: ele declara nunca ter sentido tesão na vida, e estar mais do que satisfeito consigo mesmo. É por isso que, quando uma garota o pega deitado nu na areia e decide transar com ele, o seu desconforto se torna visível: ele simplesmente não está interessado. Aliás, há muito sexo no filme. Orgias, surubas, trocas de casais e suingues. Nada, no entanto, forte o suficiente para despertar algo dentro do rapaz.

Superpina, aliás, termo que dá título ao filme, é também o nome do supermercado onde boa parte da trama se desenvolve. É lá onde encontramos o segurança, a moça do caixa, o açougueiro. São tipos genéricos, assim como grande parte dos eventos que os cercam. É onde Paula acaba indo trabalhar, após perceber que levar a vida cuidando de idosos não a levaria a lugar nenhum. É um ambiente propositalmente artificial, repleto de ofertas e atrações, mas das quais nenhuma parece ser de verdade: “é tudo falso, o que tá barato hoje já fica caro amanhã, como num rodízio”, é dito lá pelas tantas. Assim como o próprio lugar, que assim que as portas se fecham e os clientes se vão se transforma em um campo aberto para pegação e prazer. O orgasmo é almejado. Mas será que é, de fato, atingido?

Baseado no curta-metragem homônimo lançado um ano antes, Superpina: Gosto é Quando a Gente Faz é exatamente isso: uma história que foi alongada para muito além da sua capacidade. É curioso perceber, também, que por mais que se esforce para fazer uso de um manto revolucionário e transgressor, basta uma análise um pouco mais detalhada para perceber o quão bem comportado de fato o filme é: em todas as cenas de sexo – e são muitas – por mais gente que apareça participando, são sempre casais heteros que surgem no centro da ação – e quando se abre espaço para duplas gays, as mesmas logo são desfeitas para a formação de novos pares heterossexuais. Enfim, atira-se para todos os lados, sem nem um alvo sequer em mira. E, obviamente, nada se acerta. Seria até engraçado, se não fosse trágico.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.

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