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Sinopse

Susie Bannion, uma jovem bailarina americana, vai para a prestigiada Markos Tanz Company, em Berlim. Ela chega assim que Patricia desaparece misteriosamente. Tendo um progresso extraordinário, com a orientação de Madame Blanc, Susie acaba fazendo amizade com outra dançarina, Sara, que compartilha com ela suas suspeitas obscuras e ameaçadoras.

Crítica

A proposta de reinventar Suspíria (1977) soou, no mínimo, ousada desde o seu anúncio. Afinal de contas, porque mexer com um dos filmes mais aclamados dos anos 70, por muitos considerado a obra-prima de Dario Argento? Seu compatriota Luca Guadagnino, fã confesso do original cultuado, se dispôs a fazer uma releitura absolutamente não subserviente, que se comunica em algumas instâncias com a sua inspiração, porém não reverenciando-a ao ponto de constituir imitação. Portanto, são dois exemplares quase completamente diferentes, com pegadas bem distintas, tanto visuais quanto dramáticas. Suspíria: A Dança do Medo se passa exatamente no ano em que o longa-metragem de Argento foi lançado, no qual houve o sequestro do Voo Lufthansa 181 por quatro membros da Frente Popular para a Libertação da Palestina. O fato é mencionado em diversas passagens do enredo, deflagrando uma possível leitura do conjunto como alegoria política alimentada, ainda, pela erupção da força feminina.

Suspíria: A Dança do Medo se esforça para construir uma atmosfera em que o horror e a efervescência da sociedade alemã, ainda dividida pelo emblemático muro, se imiscuem como dimensões praticamente indiscerníveis. Isso fica claro na forma como menções ao Grupo Baader-Meinhof, organização alemã de extrema-esquerda, são distribuídas ao longo da trama, constantemente chamando a atenção para o que acontece fora das paredes da escola de dança capitaneada por Madame Blanc (Tilda Swinton). Nesse sentido, sublinhando a compreensão metafórica da produção, em determinado ponto uma das veteranas consideradas bruxas pelas dançarinas que alcançam pelo menos nesgas da verdade fala que uma das meninas preferiu “explodir bancos que juntar-se a nós”. Por tal perspectiva, pode-se entender a confraria de feiticeiras como personificação da extrema-direita, embora tal entendimento seja confrontado pelo protagonismo feminino. Esse ruído parece intencional.

Há, no entanto, uma morosidade no desenvolvimento de Suspíria: A Dança do Medo, filme que se, por um lado, logra grande êxito em instantes como as danças obviamente capturadas no seu âmago ritualístico, por outro, desperdiça potenciais reduzindo-os à esfera verbal. O discurso falado, em muitos momentos, sobrepuja os seus equivalentes visuais e sonoros, o que prejudica a atmosfera do horror em detrimento da clareza. Diferentemente de Suspíria, em que deliberadamente eram borradas as fronteiras entre a verdade e o delírio, em que o espectador era levado a um estado de incerteza sufocante, aqui tudo é minuciosamente explicitado, sempre com alguém pronto a esclarecer a mitologia paulatinamente desvelada por um psicólogo idoso. O fato desse personagem também ser interpretado por Tilda Swinton apenas torna mais direto o estabelecimento da simplória dicotomia entre a razão e o insondável. O roteiro é prolixo e isso afeta o filme como um todo.

Susie (Dakota Johnson), a protagonista, é uma figura à deriva, reduzida à função de presa a ser devidamente preparada para um sacrifício maior. Luca Guadagnino acerta ao investir no interesse crescente de Blanc por ela, ao ponto da veterana pensar em colocar planos seculares em risco por amor/devoção à novata. As cenas da norte-americana ensaiando, aprimorando-se à custa de esforço físico, se aproveitando de um talento que parece nato, asseveram esse vínculo entre mestra e aprendiz, levando a relação entre elas a outro nível, menos técnico e mais espiritual/primal. Todavia, o cineasta permite que essa força primitiva, brutal, evanesça em meio a uma tentativa bem-vinda, mas não de todo feliz, de temperar a história de terror com pitadas políticas. Elas alimentam um subtexto não integralmente consistente, pelo menos não de maneira proporcional à importância que Guadagnino confere a ele. Suspíria: A Dança do Medo é um filme morno, que se excede ao tentar estofar sua obra inspiradora, perdendo-se no meio do caminho entre a alegoria e realidade fantástica estipulada.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.
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