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Sinopse

Certa de que os astros erraram com ela, Alice ganha um livro quase em branco, apenas com instruções que indicam: qualquer previsão astrológica escrita nele se realizará. O que Alice fará com esse poder de influenciar a vida alheia?

Crítica

As intenções por trás da realização de um filme como Tá Escrito são bastante claras, mas nem por isso a produção se mostra desprovida de méritos. Sua protagonista, a atriz Larissa Manoela, foi um fenômeno mirim na televisão que tem realizado uma transição para o cinema com bastante cuidado. Sua primeira aparição na tela grande foi com apenas dez anos de idade, no conceituado O Palhaço (2011), de e com Selton Mello. Ao fazer parte de um todo, diminuiu as atenções – e responsabilidades – sobre si, mas essas cresceram nos anos seguintes, em projetos campeões de bilheteria, como Carrossel: O Filme (2015) e Meus 15 Anos (2017). Ela agora não é mais criança, e, portanto, precisa se provar como viável e atrativa enquanto adulta. Por outro lado, o diretor Matheus Souza estreou mais ou menos na mesma época que ela, com a comédia romântica Apenas o Fim (2008), e logo foi apadrinhado – e recebido com comparações – por veteranos como Daniel Filho e Domingos Oliveira. Mas tal entusiasmo não teria sido apressado? Os anos seguintes mostraram que sim, e o cineasta segue em busca de um filme que lhe sirva de assinatura. Frente a estes propósitos, é certo que há um desequilíbrio entre o que os dois alcançam. Mas, por outro lado, os esforços aqui empregados não foram em vão por completo.

Souza pode ser o diretor e roteirista, mas em tempos de empoderamento feminino e reconhecimento do lugar de fala, não se meteu nessa história sem as companhias certas. Para tanto, convocou duas mulheres para lhe ajudar na elaboração da trama – algo fundamental, visto que o ponto de vista assumido pelo enredo é por inteiro feminino (o da personagem de Larissa, afinal). A atriz Thuany Parente (estreando na nova função) e Mariana Zatz (indicada ao Grande Prêmio do Cinema Brasileiro e ao Prêmio Guarani pelo texto de Turma da Mônica: Lições, 2021), se uniram a ele para explorar a narrativa de uma garota que, assim como a atriz que a defende na ficção, precisa acreditar em si mesma e dar um passo certeiro rumo à maturidade. O que Alice (Manoela, em uma composição segura) quer é sair debaixo da asa da mãe e declarar sua própria independência, indo morar sozinha e encontrar um trabalho que lhe dê satisfação pessoal e os recursos necessários para realizar suas ambições. Porém, assim como acontece com muitos da sua geração, lhe falta confiança – ou, em outras palavras, autoestima suficiente – para seguir em frente. E a culpa disso não está em uma criação superprotetora, numa sociedade digital que infantiliza seus usuários ou na falta de referências, mas – veja só! – nos signos!

Sim, pois é esse o elemento que se apresenta como diferencial em uma proposta igual a tantas outras, tanto no cinema feito no Brasil quanto no exterior: dessa vez está tudo “escrito nas estrelas”, e depende de como interpretar os sinais que chegam a cada um dos envolvidos. Para tornar a mistura um pouco mais palatável – ou acessível, caso o cliente prefira – um MacGuffin (um dispositivo de enredo, não mais do que uma desculpa para que as coisas aconteçam) se apresenta na figura de um livro mágico, no qual tudo que nele é escrito se torna realidade. Mas não é tão aleatório assim. Como o único emprego que Alice encontra é apresentando um podcast sobre astrologia na internet, suas orientações transcritas serão, invariavelmente, dirigidas a um grupo ou outro do zodíaco. Ou seja, em um momento serão afetado todos aqueles de Leão, no seguinte os de Libra, e por fim os de Peixes, e assim por diante. A confusão, como se pode prever, será questão de tempo. E restará a ela desfazer a bagunça.

Alice não é muito diferente de tudo aquilo que Larissa Manoela tem feito nos últimos anos, por mais tente emprestar a ela dúvidas e discussões um tanto mais profundas (ou algo nessa linha). Mas, em linhas gerais, há pouco no seu perfil que a distancie da Malu de Fala Sério, Mãe! (2017) ou da Ana de Modo Avião (2020), por exemplo. Porém, Karine Teles (se divertindo com o pouco que lhe é oferecido) tem menos destaque do que Ingrid Guimarães (na primeira comparação), ao mesmo tempo em que não há a figura transformadora que Erasmo Carlos se prestou (no segundo caso). A atriz, portanto, está em voo solo, e aqueles ao seu lado são não mais do que coadjuvantes pontuais. Até intérpretes desenvoltos, como Victor Lamoglia (com o desprendimento necessário para a piada) ou Kevin Vechiatto (o eterno Cebolinha, aqui restrito a um tipo sem maiores nuances), se veem como não mais do que escada para a performance da protagonista. Uma jornada que ela não percorre sem ruídos, mas também sem se permitir abalar por tais tropeços. É com ela que a bola do jogo está, e sua desenvoltura em comandar o ritmo dos acontecimentos lhe é natural, comprovando que, independente da faixa etária, o carisma segue ao seu lado.

É quase impossível evitar os comentários entre a figura da ficção e sua vida real. Esses paralelos são reforçados pelo conflito visto em cena entre mãe e filha (que, felizmente, é apenas tangenciado, e nunca medido numa profundidade por demais semelhante com o ocorrido de fato com a atriz e sua família) e, principalmente, pela participação do namorado de estrela, o ator André Luiz Frambach, também na tela como seu interesse romântico (felizmente ele se libera de uma versão de príncipe encantando ao brincar com o estereótipo do ‘boy lixo’, mais ou menos como Nick Jonas fez com sua esposa Priyanka Chopra em O Amor mandou Mensagem, 2023). Caberá ao espectador, portanto, evitar tais distrações e se focar no que, enfim, Tá Escrito entrega: uma Larissa Manoela pronta para desafios de acordo com sua experiência e um Matheus Souza confortável em fazer o que dele se espera, abrindo mão de ataques de originalidade nem sempre bem sucedidos em nome de outros interesses (e orientações). O filme é dela, portanto. E dentro desse espectro, é tão previsível – e adequado – quanto a leitura do horóscopo diário.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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CríticoNota
Robledo Milani
5
Francisco Carbone
4
MÉDIA
4.5

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