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Sinopse

Três personagens desencantados com a vida: um ex-campeão de fisiculturismo, um secretário de uma clínica de beleza acima do peso e um cantor religioso desanimado. Todos anseiam por amor e conexão em uma cidade que não os acolhe.

Crítica

Teerã: Cidade do Amor desperta atenção, inicialmente, por propor uma estética do desconforto. Seus personagens estão espremidos no canto da tela, ou no terço inferior da imagem, cercados por um grande vazio ao redor. Seria fácil fazer deles o centro das cenas, porém o diretor Ali Jaberansari prefere valorizar a sensação de deslocamento dos três protagonistas através da forma da imagem: eles serão vistos muitas vezes de costas, em roupas inadequadas para o lugar onde se encontram, no meio da multidão quando gostariam de estar sozinhos, ou solitários quando queriam ter alguém por perto.

O incômodo passa, invariavelmente, pelo corpo: Hessam (Amir Hessam Bakhtiari) é um fisiculturista e personal trainer, candidatando-se para atuar num filme cujo tema jamais lhe é informado – os produtores precisam apenas de um homem musculoso. Mina (Foroguh Ghajabagli), a recepcionista de uma clínica de estética, sonha em perder peso e se adequar aos padrões defendidos pela clínica onde trabalha. Vahid (Mehdi Saki) possui um corpo contraído e triste, desenvolvido após anos de canto religioso em funerais. Para as mulheres ao redor, ele aparenta estar sempre depressivo, ser franzino demais, e portanto inseguro ou desinteressante. Seus corpos, apesar de não possuírem qualquer deficiência, não se encaixam nos padrões, tornando-se motivo de chacota ou fetiche.

Jaberansari dá um passo além ao inserir estes corpos numa crônica moral de teor progressista. Nesta Teerã urbana e moderna, entrecortada por grandes avenidas e marcada por conversas fugazes ao celular, uma mulher decide tomar as rédeas de seu futuro amoroso e seduzir os homens; outro personagem quer abandonar a vocação religiosa em nome da vida profana do canto em casamentos privados; e o terceiro esconde por trás do ideal de virilidade a atração por outros homens. Silenciosamente, por meio do humor e da empatia pelos marginais, o filme aborda a abertura do Irã à laicidade e ao Ocidente – vide a sugestão da França como berço cultural e as frases de uma sensualidade estereotipada quando Mina sussurra “baby” aos homens pelo telefone.

Teerã: Cidade do Amor possui a esperteza de tornar todas as suas imagens evidentemente políticas sem traduzi-las em diálogos, ou seja, deixando ao espectador absorver o conteúdo destas subversões. Os temas da homossexualidade ou da emancipação feminina são abordados em sugestões sutis, porém onipresentes. O filme discursa o tempo inteiro sobre aquilo que não se pode discursar, debatendo o tabu por sua vertente mais agradável e popular. Talvez se possa dizer que o diretor não aprofunde estas questões, ou talvez se trate apenas de uma estratégia para levar a um público mais amplo discussões que jamais poderia abordar com tamanha frontalidade.

A comédia dramática planta sementes de uma ousadia silenciosa, efetuando o retrato de uma sociedade ainda não transformada por completo, para a qual a diversidade implica em exclusão e solidão. Embora os personagens possam agir em conformidade com seus desejos, os resultados não são favoráveis, visto que o diretor evita o otimismo fácil. A conclusão, belo momento tragicômico de equivalência entre diferentes formas de marginalidade, retrata a necessidade de seguir em frente mesmo quando todas as apostas afetivas deram errado. O filme aborda a questão do amor por si próprio tanto quanto retrata o amor por outros, sem se ver na necessidade de fornecer um par para cada solitário enquanto proposta de felicidade.

A repetição, parte fundamental de Teerã: Cidade do Amor, pode trazer algumas limitações à proposta. Os personagens efetuam atividades repetitivas – os treinamentos do fisiculturista, os atendimentos ao telefone da recepcionista, as apresentações do cantor -, em contextos de certo modo ritualizados, ou sacralizados pela sociedade. Estes gestos enfadonhos são criticados pelo diretor, de onde extrai parte considerável de suas gags (o sorvete, os DVDs, os quebra-cabeças, as camisas pretas), mas também condiciona o roteiro às mesmas repetições. A parte central da narrativa se desenvolve pouco, uma vez que a estagnação social e afetiva constitui seu tema de estudo. Em outras palavras, o filme nem sempre consegue falar sobre vidas tediosas sem se tornar, por si próprio, tedioso.

Ao menos, ele consegue retratar estas vidas cinzentas através de uma estética igualmente cinzenta, que valoriza a aparência em detrimento da essência. Os cômodos repletos de quadros padronizados de paisagens, os vasos de flores tão belos quanto impessoais e as imagens projetadas nos muros (de Louis Garrel, de lutadores, de rostos cirurgicamente operados) remetem ao retorno à ordem, aos moldes opressores de beleza e felicidade aos quais o trio principal aspira. As cenas em que Hessam, Mina e Vahid são colocados em pontos de ônibus solitários, e depois dentro de ônibus vazios da cidade grande representam menos um recurso naturalista do que uma leitura metafórica de seus estados de espírito. A maior vantagem deste pequeno filme, marcado pelo humor sensível e empático, é construir um mundo ao mesmo tempo verossímil e moldado aos personagens que os habitam. Teerã pode ser vista como uma megalópole avançada ou retrógrada, acolhedora ou fria, caso o espectador enxergue, nos três protagonistas, figuras típicas da cidade ou imagens de exceção.

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Crítico de cinema desde 2004, membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema). Mestre em teoria de cinema pela Universidade Sorbonne Nouvelle - Paris III. Passagem por veículos como AdoroCinema, Le Monde Diplomatique Brasil e Rua - Revista Universitária do Audiovisual. Professor de cursos sobre o audiovisual e autor de artigos sobre o cinema. Editor do Papo de Cinema.
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