Crítica
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Sinopse
A verdade por trás do golpe que levou Jesus Cristo à crucificação. Depoimentos de personagens bíblicos que vão desde os negacionistas, crentes em teorias da conspiração, até os que acreditam na inocência do filho de Deus. O polêmico depósito de 89 mil moedas na conta da ex-mulher de Judas é um dos grandes mistérios a serem revelados.
Crítica
O grupo humorístico Porta dos Fundos de fato representa um marco para a comédia nacional. Começando de forma despretensiosa na internet, rapidamente se tornou ‘viral’ – que é a maior ambição de qualquer um vindo do ambiente digital. Com vídeos de esquetes rápidos (de dois a cinco minutos, em média) sendo lançados todas as semanas, logo trataram de estender suas ações para outras mídias, como televisão e cinema – nem sempre com os melhores resultados, importante observar. É por isso que talvez tenham decidido voltar ao ambiente de origem – o youtube – para o lançamento do episódio especial do natal 2020, batizado de forma nada sutil como Teocracia em Vertigem. A receita é a mesma de sempre, as inspirações são bastante óbvias, e os resultados apontam exatamente para o esperado: uma catequese apenas para convertidos.
Já há alguns anos, Fábio Porchat, Gregório Duvivier e turma se reúnem para um programa diferenciado, de maior metragem – em torno de uma hora, como nesse caso – para emular uma história baseada nos signos, digamos, natalinos. Ou seja, trata-se de encenações de passagens bíblicas, porém com vieses assumidamente provocadores, diálogos modernos e pontos de vista que buscam a graça através da ironia e do deboche. A comédia, importante ressaltar, na maioria das vezes se dá pelo uso inteligente de palavras e conceitos, algo que a equipe de roteiristas faz com bastante esmero. Porém, isso nem sempre é possível, e não se pode fechar os olhos para alguns exageros, pontos fora do tom e excessos que teriam tido melhor resultado caso tivessem sido contidos. Mais ou menos como o que se percebe neste ano.
Após Se Beber, Não Ceie (2018) e de A Primeira Tentação de Cristo (2019), os especiais dos natais anteriores, Teocracia em Vertigem surge quase como uma resposta. Primeiro, ao conservadorismo crescente percebido no país, em evidência desde as eleições presidenciais de 2018. Segundo, também como reflexo dos ataques terroristas que a sede do grupo, no Rio de Janeiro, sofreu no final de 2019 – justamente após ao lançamento de A Primeira Tentação de Cristo, que exibia, entre outras coisas, um Jesus Cristo supostamente gay. Como até agora nem a polícia, muito menos a Justiça conseguiu resolver alguma coisa em relação a esse incidente, coube aos próprios comediantes darem o troco. E assim o fizeram com o que de melhor eles tem em mãos: não violência, mas o riso. É de se lamentar, no entanto, que na pressa em provocar, tenham deixado exatamente a melhor das suas armas de lado.
Também devido às limitações impostas pela pandemia do COVID-19, que restringiram as gravações do programa, o formato escolhido foi o do documentário para contar a história mais antiga de todas: a vida de Jesus Cristo. Mais precisamente, seus últimos dias, repassando quem ele teria sido, como era a sua influência entre as pessoas da época, como teria se dado seu julgamento, crucificação e, posteriormente, e ressurreição. Como o título já adianta, a inspiração é o documentário indicado ao Oscar Democracia em Vertigem (2019), de Petra Costa – que, inclusive, chega a aparecer em cena, porém em uma piada mínima que é adiantada por completo no trailer da produção. Como o viés político de quem está por trás da realização é mais do que declarado, Jesus Cristo faz as vezes dos ex-presidentes Dilma e Lula, e enquanto que os deputados federais responsáveis pelo impeachment da última seriam os fariseus que condenaram o filho de Deus à morte. Uma analogia simples e direta, ainda que eficiente. Mas não necessariamente, entretanto, engraçada.
Com um número impressionante de participações especiais: de Marcos Palmeira a Emicida, de Daniel Furlan a Paulo Tifenthaler, de Renato Goés a Yuri Marçal, além do retorno de ex-integrantes da trupe, como Clarice Falcão e Rafael Portugal, por exemplo, a impressão que fica é que havia uma necessidade de enfileirar o maior número de vozes relevantes possíveis, mesmo que nem sempre elas tenham sido aproveitadas da melhor maneira – visto o ocorrido com a própria Petra Costa, como citado acima. Assim, Teocracia em Vertigem se mostra como o resultado de uma boa ideia – não da melhor ideia – diante das condições impostas, sejam sócio-políticas, ou mesmo sanitárias e de segurança. E com tanto com o que se preocupar – as integridades artísticas dos envolvidos, a amplitude do especial, a necessidade de provocar mudanças através do desconforto – é notório que muitas destas metas até foram atingidas, ainda que em nome de um sacrifício maior: o humor. O lema comercial em seu lançamento foi “não veja” – afinal, os que já conhecem, não encontrarão nada de novo, e os que os desprezam, certamente não identificarão ambiente que possa servir de estímulo à reflexão. É, portanto, para ambos um bom conselho, na mesma linha de “quem avisa, amigo é”.
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Grade crítica
Crítico | Nota |
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Robledo Milani | 5 |
Edu Fernandes | 8 |
Francisco Carbone | 6 |
Alysson Oliveira | 6 |
Marcelo Müller | 5 |
MÉDIA | 6 |
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