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Sinopse

Um homem de aparência dócil é acusado de um brutal assassinado. Intimada a depor, sua esposa acaba agravando a situação e logo depois decide contratar um antigo advogado para tentar livrar seu marido das garras da lei.

Crítica

“A gerência deste cinema sugere que, para maior entretenimento de seus amigos que ainda não viram este filme, você não divulgue a ninguém o segredo do desfecho de Testemunha de Acusação”. Ao final deste interessante suspense dirigido por Billy Wilder, era este anúncio que o locutor fazia aos espectadores. À época, não existia o acordo tácito entre o público de não liberar informações importantes sobre a trama, os hoje popularmente conhecidos spoilers. Mas não se preocupe. Mesmo que o longa-metragem de Wilder tenha sido lançado em 1957, tempo mais do que suficiente para que o pedido acima feito pelo locutor seja ignorado, este texto crítico não estragará nenhuma surpresa da história. Até porque muito mais interessante do que o twist no desfecho é a trajetória dos personagens.

Wilder e Harry Kurnitz assinam o roteiro, baseado em peça da Dama do Suspense Agatha Christie – que, por sua vez, retirou a ideia de um conto que havia lançado em 1925. Na trama, o advogado Wilfrid Robarts (Charles Laughton) está sob cuidados médicos, vigiado de perto pela falastrona enfermeira Plimsoll (Elsa Lanchester) após receber alta do hospital. Sua saúde não anda bem e casos criminais estão completamente fora de questão. Isso até bater à sua porta Leonard Vole (Tyrone Power), um homem que afirma estar sendo acusado de um crime que não cometeu. No caso, o assassinato de uma senhora rica chamada Emily French (Norma Varden). Primeiramente, Wilfrid não se interessa pelo caso, até que a esposa de Vole, a fria Christine (Marlene Dietrich) aparece em seu escritório. Ela é o único álibi de Leonard, que pode atestar que o marido não estava na casa de French durante o crime. O caso, no entanto, complica quando Christine aparece no julgamento não como testemunha de defesa, mas de acusação. O advogado de Leonard terá que usar de toda sua astúcia para conseguir livrar seu cliente de uma denúncia terrível – e, tudo indica, de uma esposa das mais vingativas. Billy Wilder faz em Testemunha de Acusação seu filme mais hitchcockiano, mesmo que não quisesse. Seja pela temática de suspense, seja pelos talentos envolvidos no elenco. Vários dos atores utilizados pelo cineasta já haviam trabalhado com o Mestre do Suspense anteriormente - Laughton em Agonia de Amor (1947), Dietrich em Pavor nos Bastidores (1950), Varden em Pacto Sinistro (1951) e John Williams em Disque M para Matar (1954). Por isso talvez seja tão natural que alguns apontem este como “o melhor filme de Hitchcock que ele nunca dirigiu”. Seja Hitchcock, seja Wilder, ambos são mestres da Sétima Arte – e é pouco provável que o segundo tenha tentado emular os trejeitos do primeiro neste filme. Fica muito mais a cargo do espectador buscar estas referências.

Charles Laughton teve sua última indicação ao Oscar pela performance em Testemunha de Acusação – foram três lembranças da Academia e um prêmio apenas, por Os Amores de Henrique VIII (1933). O ator é a alma do longa-metragem de Billy Wilder. Seu personagem, o advogado Wilfrid Robart, é irresistivelmente irônico, incorretamente sarcástico e possui sagacidade ímpar. Seus diálogos com a enfermeira Plimsoll, vivida pela esposa do ator, Elsa Lanchester, também indicada ao Oscar, são alguns dos melhores momentos cômicos do filme. As tiradas nunca surgem como algo deslocado. Elas mostram a personalidade forte do advogado e são um ótimo contraponto à frieza de Marlene Dietrich, outro destaque do filme. Reza a lenda que a atriz tinha como certa sua indicação ao Oscar e não escondia a frustração pela Academia não ter lembrado de sua performance. Uma lástima. Dietrich vive um dos arcos mais interessantes do longa-metragem, começando como uma mulher gélida, deixando aparecer um pouco de calor em um flashback (onde também mostra uma de suas famosas pernas) até chegar ao desespero e total desprendimento no desfecho. Em meio a isso tudo, ainda surpreende com uma performance insuspeita – e que se não recebe muito escrutínio é apenas para não estragar o prazer do espectador ao assistir ao filme. Uma bela atuação, que merecia maior atenção dos votantes do Oscar à época. Tyrone Power, em seu último papel no cinema, se mantém interessante por toda a trama, ainda que receba pouco a fazer em boa parte do filme.

O ritmo de Testemunha de Acusação nunca deixa a bola cair – algo fácil de acontecer em dramas de tribunal – conseguindo manter o interesse do espectador em cada nova informação que surge na tela. Muitos lembrarão com maior interesse do final surpresa. Mas é bom ter em mente que ele só funciona tão bem por ter sido construído de forma tão apurada por Billy Wilder e sua equipe. É curioso notar que, fosse realizado nos dias de hoje, provavelmente o grande antagonista da história saísse incólume. Na Hollywood dos anos 50, isso simplesmente não poderia acontecer. Um ótimo suspense saído da mente criativa de Agatha Christie, executado com maestria por Billy Wilder e interpretado com esmero por uma trinca de grandes atores formada por Charles Laughton, Marlene Dietrich e Tyrone Power. Se a soma de todos estes talentos não fizer o leitor querer assistir ao filme, nada mais fará.

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é crítico de cinema, membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Jornalista, produz e apresenta o programa de cinema Moviola, transmitido pela Rádio Unisinos FM 103.3. É também editor do blog Paradoxo.
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