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Sinopse

Em The Alto Knights: Máfia e Poder, dois dos mais notórios chefes do crime organizado de Nova York, EUA, Frank Costello e Vito Genovese, outrora melhores amigos, disputam o controle das ruas. Ciúmes mesquinhos e uma série de traições os colocam num rota de colisão fatal que transformará a máfia (e o país) para sempre. Com Robert De Niro.

Crítica

Nada é mais impiedoso do que o tempo. Esse é um senhor levado, que tanto ensina, mas alto também pode ser o preço que cobra por todo esse aprendizado. E aquele que não souber se atualizar, rapidamente ser deixado de lado. Em resumo, é a impressão que se tem diante de The Alto Knights: Máfia e Poder, filme realizado por talentos que três ou quatro décadas atrás ditavam as regras na meca do cinema mundial, mas que agora, passados todos estes anos, soa, no mínimo, datado, mas não dizer anacrônico. Barry Levinson ganhou o Oscar por Rain Man (1988) – um longa que, diga-se de passagem, nem poderia ser feito da mesma forma atualmente, dadas às problematizações que somente hoje se tem consciência – e já dirigiu Robert De Niro em nada menos do que quatro projetos anteriores. Os dois estão novamente juntos, trazendo ao grupo o roteirista Nicholas Pileggi (de Os Bons Companheiros, 1990, e Cassino, 1995, ambos estrelados por… De Niro). Enfim, os elementos estão postos para um encontro estelar. Mas o resultado é tão morno quanto qualquer prato requentado no dia seguinte.

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Frank Costello foi uma figura histórica entre os maiores contraventores norte-americanos do século XX. Tanto que a tentação de levar sua trajetória para às telas sempre foi muito forte. Enquanto personagem, pode ser visto em projetos como Império do Crime (1991) – interpretado por Costas Mandylor – ou Bugsy (1991) – vivido por Carmine Caridi – esse último, aliás, dirigido pelo próprio Levinson. Porém, se em muitas dessas apropriações ele fora visto como coadjuvante, dessa vez está no centro das atenções – ou quase isso. Pois divide a cena com Vito Genovese, seu melhor amigo – e também maior inimigo. A relação entre eles, que nascera na infância e se estendera por suas vidas, sempre foi controversa, tumultuada e cheia de altos e baixos. Típica história que se diz “digna de cinema”. Mas, como se vê, os pilares aqui reunidos são todos por demais próximos do tema, já tendo o visitado em diversas ocasiões anteriores. E é justamente essa falta de distanciamento que prejudica tais esforços.

Para começar, há de se apontar o equívoco de colocar De Niro interpretando não um, mas os dois protagonistas, e dependendo para tanto não de sua mais do que reconhecida versatilidade, mas de uma mal ajeitada – e pesada – maquiagem para compor um ou outro tipo. Ambos são desenhados a partir de conceitos básicos e superficiais – um é calmo e estratégico, o outro é tempestivo e violento – e, estrategicamente, evita-se colocá-los lado a lado na maior parte do tempo. Quando o encontro se mostra impossível de ser evitado, é tratado com tamanha cerimônia – pelos enquadramentos, pela trilha sonora, pelo registro por vezes em câmera lenta – que beira o risível gerar uma expectativa que nunca chega a ser atingida. Em geral, o que se tem é a reclamação de um, enquanto que seu opositor tudo o que tem a fazer é ganhar tempo para dar uma resposta à altura da ofensa que lhe foi infligida.

Tanto Costello, quanto Genovese, mandaram nas ruas – e, principalmente, no submundo – de Nova York por décadas, ainda que esse controle tenha sido exercido em grande parte de modo alternado. Quando Genovese foi condenado pela justiça e precisou fugir para a Itália, foi em Costello que confiou para seguir no comando de seus negócios escusos. Porém, enquanto esteve fora, nada menos do que a Segunda Guerra Mundial eclodiu, e o mundo que encontrou ao retornar era completamente diferente. Simplesmente retomar de onde parou não era mais possível. A contravenção de antes, em meio à Lei Seca, deu espaço ao tráfico de drogas e a uma violência que escalava vertiginosamente. Os dois, portanto, perceberam que não havia mais espaço para eles. Somente um poderia prosseguir. E é sobre esse embate que o filme se ocupa na maior parte do tempo. Mesmo que o duelo, de fato, nunca chegue a acontecer. E isso é o mais frustrante.

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Pileggi se tornou conhecido pelas colaborações com Martin Scorsese, e o mesmo estilo narrativo, com muita descrição, depoimentos em off – e até mesmo frontais – e contextualizações a todo instante se faz presente, porém sem a habilidade de alguém que em mais de uma ocasião soube driblar o clichê. Barry Levinson não alcança o mesmo resultado, e acaba por apresentar algo compassado, que vai se desenvolvendo de modo atabalhoado, por vezes até mesmo truncado, sem a fluidez necessária para justificar um interesse renovado. De Niro, ao menos, troca companhias questionáveis – como Sebastian Maniscalco ou Oakes Fegley, que protagonizaram ao lado do ator títulos esquecíveis como Meu Pai é um Perigo (2023) e Em Guerra com o Vovô (2020), respectivamente – pela sua própria, e se The Alto Knights: Máfia e Poder se mostra tão descartável quanto estes citados, ao menos se percebe uma nítida vontade em realizar algo sério e adulto. Em meados do século passado é possível que tivesse funcionado. Agora, está no mínimo ultrapassado.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.

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