Crítica
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Sinopse
Parvana é uma jovem que vive em um Afeganistão governado pelas forças do Talibã. Quando seu pai é preso de maneira injusta, ela precisa se disfarçar como um menino para trabalhar e garantir o sustento de sua família.
Crítica
O ano é 2001. O Afeganistão está tomado pelo regime Talibã, numa guerra em que os perdedores, claro, são os que apenas gostariam de ter uma vida tranquila, ou seja, a maior parte da população. É nesse cenário que vive Parvana, filha de um professor e de uma escritora. Os pais não podem mais exercer suas profissões. Primeiro, pela miséria que assola cada canto de Kabul, a capital. Segundo, porque qualquer educação é proibida. Terceiro, e principal, porque mulheres não podem sair de casa sem o marido. O clima realista não concede alento aos personagens retratados em The Breadwinner, animação dirigida pela irlandesa Nora Twomey e produzida por ninguém menos que Angelina Jolie, tão conhecida por seu olhar ao que acontece no Oriente Médio. Com uma mirada feminina (e feminista), o filme consegue ser pessimista por diversos aspectos ao retratar a dura realidade de quem vive num regime tão opressor, e, por isso mesmo, causa um impacto gigantesco em quem o assiste.
Parvana e seu pai trabalham com a venda de bugigangas e peças de roupas da família em meio ao caos das ruas da cidade. Dois soldados talibãs criticam ferozmente o fato da menina não estar coberta das cabeças aos pés. Dizem que ela chama a atenção. "Você não deveria olhar para ela". A frase dita pelo professor é recebida com ódio por um de seus algozes. Justamente, um ex-aluno que agora está com a mente totalmente contaminada pelos discursos autoritários de quem manda na região. Uma ação leva à outra. O homem é preso por contestar ordens. A família da protagonista, composta da mãe, da irmã mais velha e do irmão pequeno que ainda não consegue falar, começa a sofrer com a falta de alimentos e água. Mas como sobreviver se as mulheres não podem ir à rua? A solução de Parvana é cortar os cabelos, vestir as roupas do irmão mais velho morto e, assim, conseguir trabalho para manter a casa e, quem sabe, dinheiro para tirar seu pai da prisão.
O roteiro de Anita Doron, adaptado da obra infanto-juvenil homônima de Deborah Ellis, é sensível e duro sobre a situação das mulheres no Oriente Médio. As vozes delas são caladas a todo o momento. Quando a mãe de Parvana tenta sair de casa para tirar o marido do confinamento, ela é agredida por homens. O mesmo ocorre com outra representante do sexo feminino que apenas queria comprar remédios. Por isso, não é difícil entender a sensação de liberdade sentida pela personagem principal e uma amiga, Shauzia, que também finge ser menino para trabalhar, quando elas estão de cabelos cortados e usando trajes masculinos pelas ruas. Todo o tratamento de vendedores e transeuntes muda de acordo com o gênero. Se antes Parvana era rechaçada numa loja, agora recebe convites para entrar e consumir tudo que pode. Agora ela também pode exercer sua grande paixão, as letras, ao oferecer os serviços de leitura e escrita para a maioria dos homens analfabetos. É assim que ela conhece alguém que pode lhe ajudar mais tarde com seus maiores desejos.
É também o ensino que a menina de 11 anos teve em casa que faz sua imaginação ser tão pulsante. Em paralelo à dura narrativa que acompanhamos, ela conta uma história, em partes, para acalmar o irmão mais novo. Um conto sobre um jovem que precisa derrotar um elefante maligno das montanhas que roubou todos os grãos usados pela comunidade para a plantação, logo, seu sustento. Não à toa, Parvana e esse herói são tão próximos, no que diz respeito à personalidade. Ambos são destemidos, obcecados em lutar pelo que acham correto, pela salvação de outros além de si. Há uma sinceridade desconcertante no modo como essas duas histórias são contadas em paralelo, chegando ao seu ápice no clímax do filme, quando a guerra estoura de vez.
Os traços da animação são realçados pelas cores fortes, seja a dos olhos verdes de Parvana ou a da explosão de matizes que a narrativa fictícia traz em contraste com o marrom areia predominante da realidade em que o filme é baseado. Porém, mesmo quando o humor alivia o peso do longa, a sensação de que algo pode acontecer a qualquer momento é constante. Não é difícil se perguntar se a protagonista vai ser descoberta, se vai ser repreendida por outros homens, se realmente vai conseguir ver seu pai, nem que seja pela última vez. A direção tenta (e consegue), a todo instante, transmitir essa impressão de terror que todos vivem naquela terra. Principalmente as mulheres, que não podem se expressar, tanto física quanto emocionalmente.
The Breadwinner chega num momento em que, mais que nunca, é importante discutir os direitos igualitários para todos. Especialmente numa terra onde apenas homens têm voz. O maior mérito da produção, ainda por cima, é não ser panfletária, mas totalmente humana. É um tapa na cara de quem acredita que animações não podem recorrer a temas realmente adultos e não tenham condições de discutir temas em voga da sociedade. Talvez o ponto de referência para muitos seja Mulan (1998), da Disney, mas mesmo com seu discurso progressista, aquele filme ainda carrega vários traços fantasiosos demais para ser levado totalmente a sério. Aqui, a situação muda de figura. Dificilmente os pais desavisados vão gostar de assistir a uma produção como esta no cinema, caso o intento seja apenas distrair os pequenos por 90 minutos. Não. Crianças também devem ver para promover discussão dentro de casa. Não apenas sobre machismo e misoginia, mas também acerca da democracia batendo de frente com qualquer tipo de ditadura de mãos de ferro. Afinal, como a própria Parvana constata lá pelas tantas "é a chuva que faz as flores crescerem, não o trovão". Quem dera as pessoas do mundo inteiro aprendessem esta singela lição e a paz conseguisse reinar de verdade sobre todos nós.
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Gostei do enredo do filme 😊