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Sinopse

Uma professora de Francês começa um romance com um de seus alunos, que tem metade da sua idade. Depois da morte do pai, sua filha retorna para casa e a complicada relação entre as duas se intensifica com a presença do rapaz. O presente se colide com o passado desenterrando profundos conflitos familiares.

Crítica

Alguns filmes são simplesmente ruins. Outros podem ser ofensivos, mal-intencionados e até mesmo perniciosos. Há ainda os que tentam, mas revelam seu amadorismo a cada segundo da projeção. The French Teacher: Um Amor à Três, escrito e dirigido pela gaúcha Stefania Vasconcellos, infelizmente, se encaixa nessa última categoria. Apesar de ter frequentado a Escola de Teatro de Porto Alegre (TEPA), se formado em Direção de Cinema pela Escola Darcy Ribeiro, no Rio de Janeiro, e trabalhar atualmente em Los Angeles, nos EUA, fica impresso do início ao fim deste que é o seu segundo longa como realizadora uma total falta de percepção de mise-en-scène, denotando deficiências desde o ajuste da câmera como a disposição dos elementos em cena, como os personagens devem se comportar e os argumentos que, supostamente, fariam que a trama avançasse. Tudo é tão artificial e simplista que na maior parte do tempo o único sentimento emulado é o do constrangimento total e absoluto.

Cleo (Marie Laurin, que transita entre a apatia e o exagero, sem paradas intermediárias) é uma mulher solitária, que mora sozinha e ocupa seus dias dando aulas de francês. Quando Matthew (Sean Patrick McGowan, de Virando a Página, 2014, incapaz de evitar a expressão armada de galã suburbano) se apresenta como novo aluno, não há sutileza nas intenções confessas do rapaz: ele está interessado mais na professora do que nas aulas. Primeiro chega adiantado à classe, depois solicita aulas particulares, e por fim a convida para uma festa. Tudo é bastante escancarado, para que não reste dúvidas. O problema é que não há o despertar desse desejo: a sensação é que se aproximou da tutora com uma agenda já pronta, algo que nunca chega a ser esclarecido.

A partir do momento em que os dois dormem juntos e se declaram, com direito a “eu te amo” de um lado e do outro, uma questão familiar, já pontuada desde o começo da trama, volta a se manifestar. O pai de Cleo é um senhor doente, com Alzheimer. Há um cuidador sempre com ele, mas, como única filha, é seu papel também se fazer presente. No entanto, enquanto lhe dá banho, o idoso a chama pelo nome da já falecida mãe, sua esposa. E, num rompante, chega a lhe dar um beijo romântico. É óbvio que o homem está pensando na antiga companheira. Mesmo sendo a única pessoa racional entre os dois, tal gesto é suficiente para abalar a mulher de tal forma que passa evitar novos contatos, certificando-se do estado paterno apenas por telefone, sem mais visitá-lo. Quando vem a notícia do seu falecimento, dois pesos se somam: o de um trauma vivido na infância – a reação desproporcional não permite dúvidas a respeito do que um movimento tão simples teria suscitado – e a culpa por tê-lo abandonado nos seus últimos dias. E assim, como se não fosse suficiente, no meio desse imbróglio eis que surge a filha dela, que retorna para o velório.

Questões como um chalé deixado como herança, que a protagonista nunca soube de sua existência, mas que mesmo assim se encontra em perfeito estado de conservação, ainda que o velho proprietário há muito já devesse ter esquecido dele devido a sua doença, são problemas menores dentro da nova dinâmica que se estabelece com a chegada desta terceira figura – que parece ser introduzida apenas para justificar o subtítulo “Um Amor à Três”. A mãe está frágil com a recente morte do pai, mas, ao mesmo tempo, passa a se comportar como uma adolescente virginal, excitada a cada nova ligação do namorado, chegando escondê-lo da filha. Seria um recato maternal? Pelo contrário, pois, a partir do que se entende com a severidade dos seus gestos assim que filha e rapaz se conhecem e começam a interagir, é um nítido caso de ciúmes por parte da mulher mais velha. É também quando a diferença de idade do casal passa a ser um pormenor perseguido pela diretora à exaustão. O preconceito se torna evidente numa sequência num ambiente noturno. Quando a protagonista adentra o lugar, todos os jovens presentes passam a encará-la com expressões de espanto. Comentários como “por quê ele trouxe a mãe para uma festa?”, seguidos de risinhos infantis, se proliferam. A pergunta que fica é: ao expor tal situação sem o menor cuidado, seria o sentimento dos personagens ou da realizadora?

Chegando ao ponto de citar O Poderoso Chefão (1962) em uma cena de laranjas caindo ao chão antes de anunciar uma morte – o que a mulher fazia com todas aquelas frutas dentro da bolsa? – esse The French Teacher: Um Amor à Três não desiste de cavar uma cova cada vez mais funda para si mesmo quando, aleatoriamente, passar a inserir pequenas rixas diárias entre mãe e filha, apenas para deixar claro que a relação das duas, já tensa, se tornaria ainda mais instável com a chegada do rapaz apaixonado. Mas os diálogos entre eles são sempre muito forçados, aleatórios e desprovidos de qualquer potencial de convencimento. Enfim, trata-se de um desastre anunciado, e que só piora diante da insistência no uso de tomadas em câmera lenta, tantas e absurdamente deslocadas que, caso tivessem sido exibidas na velocidade normal, era capaz de estarmos agora diante de um curta-metragem. Um conjunto tão mal estruturado como esse poderia ser apenas um grande equívoco, mas a soma crescente de más decisões torna o desastre ainda maior.

Filme visto online no 7o BIFF: Brasília International Film Festival

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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