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Sinopse

Liderado pela guerreira Andy, um grupo de mercenários imortais luta há séculos para proteger o mundo dos mortais. A habilidade excepcional desse time é exposta e seus guerreiros terão de evitar que ela seja reproduzida.

Crítica

Charlize Theron caiu nas graças dos fãs do cinema de ação. Está virando figurinha carimbada no gênero. Depois de Mad Max: Estrada da Fúria (2015) e, principalmente, Atômica (2017) ela parece ser uma opção bastante viável caso os produtores precisem de alguém capaz de alternar intensas peripécias físicas e uma condição trágica. A sina de Andy, sua personagem em The Old Guard, é a imortalidade. Desde tempos imemoriais, é desprovida de vulnerabilidades em último caso. Embora sinta dor, inclusive no processo de ter o corpo restaurado das eventuais feridas, perfurações de bala e lacerações, a ela é impossível morrer. Nos intervalos das missões recheadas de tiros, porradas e bombas, a atriz sul-africana consegue espaço para expressar o peso que os séculos (milênios?) depositam sobre seus ombros. Mas, a cineasta Gina Prince-Bythewood não dá tanta linha para que essa humanidade atravessada por uma excepcionalidade ganhe os holofotes com a frequência merecida. Está mais preocupada com o estabelecimento de uma mitologia, algo facilitado pelo fato de termos uma novata em cena. Nile (KiKi Layne), recém-incorporada ao bando, precisa de contextos para entender aquilo. E o filme se demora nas explicações pormenorizadas à ex-soldado (e a nós).

É exatamente essa pegada expositiva que mina boa parte dos potenciais de The Old Guard. Natural que, especialmente após descobrir-se imortal, Nile tenha inúmeras perguntas a fazer ao pessoal da velha guarda, acostumado à rotina de não temer a finitude. Mas, não é absolutamente necessário que o filme cite todas elas, quase consecutivamente, como se sinalizasse um quebra-cabeça sendo montado com o cuidado de não deixar peças soltas. É o típico tratamento paternalista que Hollywood frequentemente dispensa ao espectador, partindo do pressuposto de que este não é sequer capaz de entender sutilezas e completar determinadas lacunas, ou seja, de assumir uma posição menos passiva diante da telona. E dá-lhe esclarecimentos daquilo que sobrepesa cada personagem, vide a história pregressa da parceria desfeita pela ignorância dos homens ou a tristeza abatida sobre outro membro em virtude do drama inexorável da mortalidade dos entes queridos. Porém, é bastante positivo, embora tímido, que num filme de ação, gênero historicamente consagrado a uma masculinidade agressiva, haja o casal homossexual com um par de instantes de demonstração clara de afeto.

The Old Guard caminha por esse trajeto pedagógico se valendo de modo oscilante de determinados arquétipos para lá de conhecidos. Chiwetel Ejiofor interpreta o sujeito que se alia aos perniciosos cientistas. Ele não se furta de tomar atitudes perversas, pois motivado pela dor que retorce seu bom senso ao ponto de leva-lo a acreditar que más condutas podem ser entendidas como boas ações. Aliás, essa característica também aparece na figura do traidor. Curiosamente, a noção de que "os fins justificam os meios" é a grande armadilha na qual o longa-metragem cai inadvertidamente. De um lado, a óbvia reprimenda aos métodos do cientista inescrupuloso da vez – vivido por Harry Melling (o primo xarope de Harry Potter na saga cinematográfica baseada nos livros de J.K Howling). Esse homem de negócios não vê problemas em fazer dos importais meras cobaias de laboratório, desde que seus experimentos resultem em benefícios à humanidade. Mas, em dado momento a ação dos mercenários “do bem” incorre no terreno pantanoso do pretexto, causando um paradoxo.

Nile demonstra insatisfação diante dos métodos de Andy e companhia. Todavia, ao tomar conhecimento de que as carnificinas ao longo dos anos, de algum modo, representaram benefícios ao mundo, ela aceita rapidamente o quinhão e não se faz de rogada ao abraçar o destino. No fim das contas, afora a questão da ganância financeira do vilão, o que diferencia ambos os grupos justamente quanto aos fins justificando os meios? Pela forma como termina, The Old Guard aparentemente é uma aposta da Netflix, sua empresa produtora/distribuidora, no sentido da criação de uma franquia. Pensando a partir desse prisma, fica ainda mais esquemático o processo de passagem de bastão que perpassa integralmente o enredo. Quando Andy diz a Nile “da próxima vez você vai na frente”, se referindo a uma abordagem em batalha, pode-se imaginar uma possível sequência em que Charlize Theron ocupe de maneira mais ostensiva o espaço de mentora. É como se, mirando a construção de uma saga, os produtores não quisessem ficar dependentes de uma estrela desde o começo, aproveitando-se do prestígio dela apenas como um elemento propulsor e que lhes confere certa grife.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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