Crítica

Geena Davis e Susan Sarandon têm os papeis de suas vidas em Thelma & Louise, aventura dramática de Ridley Scott que talvez seja precursora ao colocar mulheres na condução de um tradicional road movie norte-americano. Em muitos aspectos, é mais um filme do gênero que representa: a estrada como símbolo de liberdade está lá, assim como os personagens desajustados preenchendo cada parada das protagonistas. As ótimas atrizes fazem o que podem, assim como seu diretor, porém os artifícios recorrentes de tantas outras produções constituem este filme como uma espécie de Sem Destino (1969) feminino – mas nada feminista.

Com o porta-malas cheio e a ideia de um fim de semana longe de seus relacionamentos conturbados, duas amigas caem na estrada prontas para se afastar de qualquer problema, porém é exatamente o que elas encontram a cada quilômetro percorrido. Após Thelma sofrer uma tentativa de estupro no estacionamento de um bar, Louise a defende e assassina o agressor. As duas iniciam uma fuga, são perseguidas por um policial que é simpático à situação delas e até esbarram num cowboy com cara de Brad Pitt. No caminho para o México, que parece reservar a salvação da dupla, uma passagem pelo Grand Canyon muda suas jornadas por completo.

Ridley Scott alterou significativamente os temas de suas produções precedentes para apostar na roteirista de primeira viagem Callie Khouri, que com algum talento e a sorte de principiante recebeu o Oscar de Melhor Roteiro Original pelo filme – nos anos seguintes, ela assinaria apenas os irregulares O Poder do Amor (1995) e Divinos Segredos (2002). Ainda que seja constantemente apontado como um dos melhores exemplares cinematográficos para o discurso feminista, Thelma & Louise está longe disso, pois não existe responsabilidade, igualdade, sensibilidade ou compreensão nas atitudes de suas protagonistas, apenas vingança, retribuição e comportamento sádico – o que parece distante dos valores que constituem o feminismo.

Curiosamente, Thelma & Louise poderia terminar logo na supracitada sequência do estacionamento, já que Thelma possuía marcas de agressão e provavelmente seria inocentada de qualquer julgamento com a alegação de legítima defesa. Como este não é um curta-metragem sobre os riscos que mulheres correm ao viajar sozinhas, a trama se desenvolve com a fuga como tema principal – assim como a busca dessas protagonistas por liberdade, independência e tranquilidade. No entanto, tal narrativa oferece um discurso deturpado, uma vez que esta busca oferece apenas violência, frustração e, finalmente, morte.

Com fotografia, figurinos e direção de arte evidentemente datados e carregados com o que deve permanecer enterrado nos anos 1990, Thelma & Louise é incoerente no que defende e repleto de códigos comuns a tantos filmes. A amarga desventura das amigas reserva alguns momentos cômicos e até tocantes, porém o que se salva numa revisão são mesmo as performances de Davis e Sarandon, assertivamente indicadas ao Oscar como protagonistas de um filme quase esquecível, não fosse suas magnéticas presenças.

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é crítico de cinema, membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Graduado em Publicidade e Propaganda, coordena a Unidade de Cinema e Vídeo de Caxias do Sul, programa a Sala de Cinema Ulysses Geremia e integra a Comissão de Cinema e Vídeo do Financiarte.
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