Crítica


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Sinopse

​Um jovem sírio vive no interior do aeroporto de Tempelhof, uma das mais célebres construções do regime nazista, enquanto aguarda as autoridades decidirem sobre sua permanência no país. Um olhar sobre a Berlim contemporânea, acompanhando os sentimentos ambivalentes do protagonista em relação ao não lugar ocupado.​

Crítica

Há um preâmbulo histórico importante em Aeroporto Central: THF. Antes de abordar o cotidiano de refugiados instalados no Aeroporto Tempelhof, em Berlim, o cineasta brasileiro Karim Aïnouz menciona a importância que o local tinha para Adolf Hitler, cujos planos incluíam transforma-lo no maior e mais bonito terminal aeroviário do mundo. Outrora, portanto, instrumentalizado por uma visão supremacista, o local atualmente abriga os imigrantes que fugiram de seus respectivos países por razões variadas, embora a guerra seja a principal motivadora do deslocamento forçado. O tom predominante é o observacional, com testemunhos aparentemente banais das rotinas de famílias inteiras que se encontram acondicionadas em alojamentos pequenos, de jovens saudosos dos consanguíneos que permaneceram em suas terras natais, em suma, de gente que tenta começar uma vida nova longe das raízes. A maior parte dos exilados é síria, fugitivos da conjuntura caótica em seu país.

Karim Aïnouz não demonstra preocupação em apontar caminhos, fincar bandeiras em determinado terreno ou mesmo fazer uma análise pormenorizada da situação dos expatriados. Essa ausência de um posicionamento mais firme e claro incomoda em certas partes, mas desde o princípio fica bastante claro que a intenção é, justamente, despojar o olhar de uma preconcepção marcada, deixando lastro para que o espectador principie sua imersão na convivência daquele povo sofrido diante das normas alemãs. Acompanhamos questões burocráticas, cuidados médicos básicos, conversas aparentemente ordinárias de sujeitos há mais de um ano na morada provisória, o impulso de alguns para tornar harmoniosa e menos dolorosa essa fase intermediária que pode prenunciar o recomeço ou o terrível retorno. Nesse itinerário caracterizado por uma poética que emana das belíssimas imagens captadas, um rapaz e um homem que deseja ser médico sobressaem como emblemas.

Em Aeroporto Central: THF são intercalados, constantemente, vislumbres de aeronaves e demais estruturas que evocam o passado com essa realidade que ali ganha contornos práticos. Ainda que Aïnouz não dê espaço para discursos propriamente ditos, nas bordas das interações são perceptíveis os conteúdos inerentes aos refugiados, como o nem sempre célere processo de assimilação desses cidadãos na nova pátria. Eles ficam isolados por mais tempo que o previsto, embora o Estado garanta financeiramente sua permanência nesse lugar emblemático. O policiamento que zela pela ordem local é visto na condição de totalmente integrado ao dia a dia, com moradores chamando agentes pelo nome e demonstrando-lhes afeto. De maneira semelhante, os profissionais de saúde são encarados como parte vital da estrutura, mesmo que, verdade seja dita, o documentário não se esforce no sentido de opinar sobre tudo aquilo. A câmera, assim, se contenta com uma passividade edulcorada pelo virtuosismo dos planos.

Aeroporto Central: THF tem o grande mérito de não direcionar demasiadamente, de ser um filme que propõe percursos atenciosos de observação das demandas alheias. A ausência de um ímpeto sobremaneira investigativo, aqui preterido em função de uma depuração com toques poéticos, faz de alguns momentos reféns da repetição, com traços mencionados anteriormente. A encenação pega emprestado da ficção vários procedimentos, especialmente no que tange ao âmbito visual, o que torna o resultado curioso por sua sutil riqueza de camadas. Porém, em diversos instantes há a permanência num terreno quase inerte, com as lentes voltadas não necessariamente a eventos, mas ao conjunto de banalidades que delineia esse decurso não grifado por frustração e impaciência, pelo menos não visivelmente. Karim Aïnouz não cria personagens, permanecendo fiel à natureza das pessoas, evitando manipular vivências para encaixa-las em moldes neste filme contemplativo e bonito, mesmo que pouco incisivo e um tanto moroso.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

Grade crítica

CríticoNota
Marcelo Müller
6
Bruno Carmelo
6
MÉDIA
6

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