Crítica


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Sinopse

O órfão John Ronald Reuel Tolkien está em seus anos de formação. Em meio aos estudos, encontra amizade, amor e inspiração artística entre um grupo de colegas excluídos da escola. Isso o leva até o início da Primeira Guerra Mundial, que ameaça acabar com a “irmandade”. Todas essas experiências inspiram Tolkien a escrever seus famosos romances sobre a Terra-Média.

Crítica

Conhecido amplamente por ser o criador de O Senhor dos Anéis, o sul-africano J.R.R. Tolkien, além de escritor, foi professor em Oxford e emérito filólogo. Aliás, a paixão desse intelectual pelo estudo das linguagens está na base de seu trabalho ficcional, um elemento vital à criação de idiomas próprios a serem proferidos pelas criaturas fantásticas de seus romances épicos. Em Tolkien, cinebiografia dirigida por Dome Karukoski, essa fascinação pelas questões idiomáticas ameaçam, em dois momentos, fomentar um princípio narrativo considerável. Todavia, bem como as demais aproximações do longa-metragem, essa se dá de modo excessivamente romantizado, algo visto tanto na exposição da pretendente a respeito da miríade de coisas que uma palavra carrega consigo quanto na fala parecida do mentor, que também chama sua atenção ao conteúdo dos vocábulos. O enredo toma caminhos convencionais, partindo da infância árdua sob os cuidados da mãe, passando pela rotina num bondoso lar adotivo e chegando às dificuldades da dura e onerosa vida adulta.

A despeito de abordar alguém com uma contribuição notável à literatura mundial, Tolkien prefere se deter nos dados ordinários, privilegiando o, por assim dizer, lado humano, edulcorando contratempos e esquecendo-se de figuras importante em seu decurso, como o irmão caçula que desaparece inexplicavelmente de um ponto em diante. Mais à frente, se atém a uma jornada amorosa simplória e melosa com Edith (Lily Collins). Vivido por Nicholas Hoult, Tolkien é uma peça destoante na irmandade estabelecida com os colegas de origem social abastada. Os quatro amigos reunidos constantemente na adolescência para estabelecer planos de mudança do mundo por meio da arte, isso entre um gole de chá e outro, são claramente a inspiração de Frodo, Sam, Merry e Pippin, os hobbits que, apesar dos prognósticos absolutamente desfavoráveis, cumprem uma função central na campanha contra as hordas de Sauron nos livros ambientados na mítica Terra-Média. Aliás, o filme tem instantes de alusão sutil à obra de Tolkien, mas evita fundamentar-se nas referências, estas parcimoniosas.

Tolkien possui uma estrutura segura, sem maiores espaços para riscos, assim beirando o burocrático. O filme se beneficia da qualidade da direção de arte e dos demais dispositivos para exibir uma ótima reconstituição de época. Do front da Primeira Guerra Mundial – ainda que ali abunde lama e falte sangue – aos aposentos universitários há um cuidado evidente com o lastro histórico. Mesmo sublinhando o legado essencial por meio dos recorrentes desenhos, mapas e anotações em cena, o filme acaba passando a falsa sensação de que o universo de O Senhor dos Anéis, bem como aquele encarregado de expandi-lo e contextualiza-lo, principiou em O Hobbit. Nem a brevíssima menção, na trincheira, de escritos a serem levados a alguém pré-determinado em caso de morte do autor é suficiente para esclarecer essa importante consecução de eventos que, adiante, desembocou num sucesso sem precedentes. Isso é apenas um dos exemplos do descuido da trama com o legado de Tolkien. A constatação da excepcionalidade é minimizada em virtude da prevalência de banalidades.

Mesmo não configurando um percurso estritamente retilíneo, buscando a significação de passagens circunstanciais pelos vislumbres do passado, Tolkien é vítima de uma subserviência mal disfarçada ao tradicional e corriqueiro. O filme enfileira liberdades narrativas, tais como a observação leviana e apressada do lar adotivo que abriga Tolkien após a morte repentina da mãe, e tangencia, com semelhante displicência, questões importantes, sendo a principal delas o fato de Tolkien, ao contrário dos inseparáveis e endinheirados amigos, pertencer a um estrato social completamente desfavorável. Problemas mencionados são contornados como num passe de mágica; elipses permitem a supressão de consideráveis períodos da trajetória acidentada do protagonista; contratempos se esvanecem por simples conveniência, então não ganhando o peso dramático devido. Dome Karukoski não se arrisca, preferindo a estrada trivial, apresentando cenas bonitas, vide o “surgimento” de Sauron num cenário depauperado, mas pecando pelo acúmulo de cautela, assim como os hobbits antes de sua missão que muda a guerra, mas diferentemente de Tolkien e sua obstinação vigorosa.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

Grade crítica

CríticoNota
Marcelo Müller
5
Roberto Cunha
6
MÉDIA
5.5

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