Tom of Finland
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Dome Karukoski
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2017
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Finlândia / Suécia / Dinamarca / Alemanha / EUA
Crítica
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Sinopse
Crítica
Você provavelmente já ouviu falar de Touko Valio Laaksonen. Ao menos, por seu pseudônimo, Tom of Finland. Não precisa ser gay para ter visto, em algum lugar, seja na internet ou ao vivo, alguma de suas obras. Ilustrações de homens musculosos, geralmente com uniformes militares ou policiais, bigodes, couro e, sempre, bem dotados. Isso mesmo, sem meias palavras: paus duros e avantajados. O finlandês e sua arte são reconhecidos pela ajuda à libertação sexual de homens que gostam de homens. Mais ainda. Mostram fetiches que acompanham desde um jovem adolescente em sua fase de descoberta até sujeitos de meia-idade que já sabiam bem do que gostavam. Talvez para o gosto popular, Touko seja a referência finlandesa mais amplamente conhecida no meio artístico e, especialmente, LGBT. Não à toa o filme que se baseia em sua vida, intitulado simplesmente Tom of Finland, seja o representante de 2017 do país no Oscar de Filme Estrangeiro. Agora, será que é para tanto, assim?
O diretor Dome Karukoski acompanha boa parte da vida do artista por várias décadas, partindo de sua juventude durante a Segunda Guerra Mundial. É em meio às batalhas que o novato Touko (Pekka Strang) estabelece amizade com um de seus chefes, gay enrustido que faz pegação (assim como vários outros soldados e oficiais) no matagal. A fotografia acinzentada e obscura ajuda a refletir o difícil momento da Finlândia na época que, mesmo após a independência no início do século XX, passou por vários perrengues como aliada dos alemães e, logo após, como zona pseudo neutra da Guerra Fria, com a União Soviética ajudando na censura e na repressão do país. E é nesse contexto que Touko, ao mesmo tempo em que precisa lidar com os traumas da guerra (com a imagem de um russo a quem matou circulando sua mente), também acaba internalizando sua homossexualidade sem poder assumi-la, já que era proibido ser gay naquela época.
Com um talento nato para o desenho (algo compartilhado com sua irmã, Kaija, vivida por Jessica Grabowsky), logo o protagonista se estabelece numa agência publicitária. Nas horas vagas, dá vazão aos seus desejos, seja em encontros entre árvores ou ilustrando seus homens ideais, especialmente Kake, seu personagem mais famoso. Só que o medo da repressão permanece. Como distribuir essas imagens e deixar o mundo conhecer a sua arte? O papel de grande incentivador cabe a Veli (Lauri Tilkanen), inquilino e interesse amoroso de sua irmã, que logo inicia um relacionamento com Touko. Um casamento que dura 28 anos, até a morte de Veli por consequência da profusão da AIDS nos anos 80.
Apesar do longa parecer extenso por conter tantos detalhes de boa parte da vida do retratado, a montagem ajuda a conter os pontos mais importantes. As elipses temporais são marcadas pela direção de arte, maquiagem e, claro, pelos figurinos de cada personagens, ressaltando bem a época em que as sequências se passam. Uma forma de não deixar o espectador se perder na contagem dos anos. Se, por um lado, esse aspecto é um dos grandes pontos positivos da narrativa, por outro, falta ousadia ao relacionar autor e obra. Além das ilustrações não serem mostradas de forma tão explícita, apenas em raros momentos seus personagens ganham vida como uma espécie de alucinação ou simples devaneios de Touko. As próprias cenas de sexo são carregadas de sombras, numa fotografia que esconde qualquer parte íntima, evitando tocar o dedo na ferida que é assistir ao sexo gay. Não que isso atrapalhe o desenvolvimento ou o prazer de acompanhar o filme, mas parece que o diretor resolveu seguir um caminho mais fácil e comum, apresentando uma cinebiografia linear como tantas outras para tornar o produto mais palatável para o espectador.
Ainda que se reclame um pouco dessa falta de originalidade, o ganho é que, realmente, Tom of Finland acaba se tornando um belo registro histórico sobre uma das figuras mais interessantes e importantes para o desenvolvimento da luta LGBT no século XX. É a partir dos anos 60, quando sua obra é enviada aos Estados Unidos e publicada em revistas gays, que Tom of Finland se torna não apenas um artista, mas uma grande marca a ser reconhecida, fato que não fica fora do longa-metragem. Para alguém que circulava de forma clandestina entre “caças a faisões” e “jogos de pôquer” (meras metáforas para encontros escondidos de gays), o sucesso era inesperado. E é aí que o filme ganha mais cor, ainda que a sombra da AIDS comece a pairar sobre seus conhecidos, especialmente o parceiro. Há até uma espécie de mea culpa que Tom teve na vida fora das telas, quando assumiu ter parcela de responsabilidade na disseminação do HIV, já que seus personagens apareciam transando sem camisinha. Algo que foi corrigido de forma simples com avisos sobre proteção nas publicações que viriam a seguir.
Das roupas de couro e quepes a bigodes cheios de estilo e corpos excitados, a obra de Tom refletiu o desenvolvimento e, porque não dizer, o surgimento de uma comunidade homossexual das sombras para a luz. Ou, melhor dizendo, para fora do armário. Se hoje existem personagens homossexuais que usam “cuecão de couro”, numa óbvia referência ao BDSM, à cultura do fetiche homossexual, grande parte disso se deve à expansão das imagens criadas por Tom e que tomaram conta do mundo ocidental por décadas e mesmo agora, mais de vinte anos após sua morte. Se o seu filme falha em ser mais ousado ou picante, não se pode dizer que ficou sem alma. Graças, especialmente, às atuações (mais ainda de Pekka Strang como o protagonista), o que se vê na tela é a luta de um artista pelo direito de ser livre e mostrar sua arte para quem quiser ver. Algo que projetos de neofacistas espalhados pelo mundo (inclusive no Brasil atual) ainda precisam entender e aceitar. Quem sabe uma sessão de Tom of Finland ajude no processo. Se não, o que fica é um profundo respeito por uma personalidade tão encantadora e cheia de vida como foi este grande homem.
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