Crítica
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Sinopse
Transformers: O Início se passa em Cyberton, planeta natal dos Autobots e dos Decepticons. Nele conhecemos os personagens que viriam a ser Optimus Prime e Megatron, mas bem antes de eles serem os líderes dos Autobots e dos Decepticons.
Crítica
Trinta e oito anos depois de Transformers: O Filme (1986), chega aos cinemas um novo longa-metragem animado de Transformers – saga derivada dos brinquedos populares da Hasbro. Para Transformers: O Início, a Paramount Pictures começou recrutando um nome relevante à direção: Josh Cooley, cria da Pixar, o mesmo de Toy Story 4 (2019). E essa escolha diz muito sobre o que o grande estúdio espera dessa animação que conta a origem do vínculo entre Optimus Prime, o líder dos heroicos Autobots, e Megatron, o mandachuva dos malvadões Decepticons. A trama se passa no planeta Cyberton, cuja concepção de sociedade permite leituras interessantes. Antes de se tornar a principal esperança de sobrevivência de seu povo, Optimus era apenas Orion Pax, minerador da numerosa classe baixa incumbida de extrair das profundezas o minério poderoso que energiza o planeta e os habitantes. Seu melhor amigo e companheiro de labuta é D-16, trabalhador obediente e menos impetuoso, ou seja, inicialmente distante da personalidade destrutiva do terrível Megatron no qual irá se transformar. Para começo de conversa, há toda uma exploração desse mundo dividido em castas, no qual níveis inferiores abrigam operários braçais fadados a um destino pouco excitante, a se arriscar pela sobrevivência geral. Todos estão em busca do artefato valioso para dispensar a mineração e retomar o fluxo orgânico de Energon.
Orion é o típico jovem inquieto disposto a quebrar os protocolos se a transgressão garantir que é possível ultrapassar as barreiras de classe e fazer algo notável. Ele é o elo emocional, enquanto D-16 personifica a razão vocacionada à obediência. Nessa aventura infantojuvenil, é instigante o discurso em torno das mentiras contadas para colocar a coletividade sob dominação. Sentinel Prime, o grande herói que sobreviveu a uma guerra capaz de exterminar os outros Primes de Cyberton, é uma figura espalhafatosa que distribui sorrisos e satisfações sobre as expedições fracassadas à superfície em busca do objetivo que salvará o mundo. Enquanto esse líder segue uma agenda própria com cara de “eventos para manter a população anestesiada”, Orion e D-16 percorrem um caminho que os leva ao território proibido onde recebem como presente a sabedoria. Ao saírem da ignorância, os protagonistas de Transformers: O Início não podem mais recuar, fingir que suas vidas continuam tendo propósito e simplesmente seguir o trabalho. Num tempo como o nosso, em que a verdade é um conceito cada vez mais líquido, a conscientização não deixa de ser um bom gatilho de amadurecimento. E quem disse que de um filme como esse não podemos tirar algumas metáforas sobre as coisas que nos acontecem cotidianamente? Josh Cooley nutre a camada simbólica do longa-metragem sem comprometer a aventura empolgante.
Além dessa centelha revolucionária alimentada pela juventude oprimida nas minas de Erergon, Transformers: O Início fala simultaneamente das gêneses do herói e do vilão. Orion Pax e D-16 percorrem juntos um caminho transformador, mas têm reações completamente opostas à guerra de determinado ponto em diante. Enquanto Orion absorve as novidades e a transforma em força mobilizadora para lutar contra o mal enraizado, D-16 é corrompido pela frustração, sensação que suscita as suas piores intenções. Na medida em que é empoderado por um objeto e, em semelhante medida, pela verdade disponível apenas aos líderes, D-16 começa a pensar em destruir completamente o inimigo e instaurar uma nova ordem. Em nenhum instante de sua ascensão semelhante Orion sugere a reivindicação da governança, ao contrário de D-16 que caminha a passos largos para se tornar o ditador substituindo o tirano destronado. É como acontece com Charles Xavier e Magneto na saga X-Men isso de os amigos reagindo de maneiras opostas à opressão e ao sofrimento: um de modo reformista, o outro de um jeito vingativo. E o mais interessante desse longa animado é justamente a construção gradativa de Optimus e Megatron, o heroísmo altruísta de um e a sanha agressiva e mesquinha do outro. D-16 talvez se converta de maneira um pouco abrupta demais no vilão, mas essa é a resposta ao desencanto.
Transformers: O Início não tem o nível de violência observado em Transformers: O Filme, por exemplo. Josh Cooley elabora os episódios dramáticos para eles não serem necessariamente traumáticos, quem sabe visando ampliar o recorte de seu público-alvo. Nem todas as soluções para os dilemas do roteiro são boas e, às vezes, há um abuso das conveniências e dos momentos providenciais. No entanto, o saldo ainda é bastante positivo, pois o diretor consegue equilibrar bem discurso político e ação, atrelando os dois em prol da aventura ao mesmo tempo divertida propensa à reflexão – inclusive num espelhamento com as nossas realidades sociais. Elita-1 e B-127, personagens clássicos da saga Transformers, tem atuações importantes nesse jogo em que o apocalipse parece cada vez mais próximo. Aliás, a existência de uma raça imperialista e hostil fornece ótimas possibilidades para uma eventual sequência, assim como a instauração da rivalidade entre os antes melhores amigos que pensam de formas opostas sobre os rumos ideais para governar Cyberton. No filme, sair da adolescência e entrar na vida adulta é assumir responsabilidades, às vezes indo ao encontro do destino, noutras lutando bravamente contra as engrenagens que fazem os operários acreditarem na opressão como condição inevitável. Com muita ação, explosões e se equilibrando entre as várias previsibilidades do enredo, Josh Cooley consegue um resultado bem interessante que, provavelmente, vai gerar algumas continuações.
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